Rio – Os atributos naturais e o passado pujante fazem da cidade do Rio uma das que concentram mais áreas protegidas do país (30% do território). No entanto, uma profusão ineficiente de unidades de conservação, o loteamento político de gestores e a falta de expertise no comando dessas áreas continuam ressoando, da Marambaia ao Pão de Açúcar. Levantamento de ((o))eco, com base em portais da prefeitura do Rio e em publicações de Diários Oficiais mostra que, de 54 parques, APAs e monumentos naturais, 30 (o que representa 55%) não possuem sequer um profissional responsável.
Muitas unidades de conservação existem apenas no papel: foram criadas para satisfazer interesses de vereadores. Há ainda diversos casos de sobreposição de proteção entre áreas municipais e estaduais. Um exemplo é o da Área de Proteção Ambiental (APA) da Pedra Branca, segunda unidade mais extensa do município. Criada em 1988, abrange exatamente os mesmos limites do Parque Estadual da Pedra Branca, fundado 14 anos antes e gerido pelo governo do estado.
“Todas as unidades criadas após a implementação do Sistema Nacional de Unidades de Conservação (lei 9.985/2000) não obedeceram à legislação. Ou seja, não houve estudo técnico ou consulta pública”, diz uma fonte da prefeitura a((o))eco. “A gestão dos parques no Rio é, muitas vezes, letra morta”.
Quase todos os gestores são estranhos aos quadros da Prefeitura, nomeados por indicações políticas diversas. Formação na área ambiental é artigo raro. Entre os 21 gestores (alguns acumulam cargos), há ainda enormes discrepâncias salariais – de R$ 3.602,82 a R$ 16.900,38, considerando os vencimentos líquidos. Numa análise das dez maiores unidades de conservação cariocas, apenas cinco têm um gestor responsável nomeado. Experiente, o engenheiro florestal Luiz Octávio de Lima Pedreira, responsável pela APA da Serra dos Pretos Forros, na Zona Oeste do Rio, é um dos dois gestores com esse tipo de expertise. A outra é Ana Gabriela do Carmo, da APA da Orla Marítima.
Apenas 10 UCs têm plano de manejo
Em 2012, a Secretaria de Meio Ambiente chegou a promover um curso de capacitação para gestores. Até uma prova chegou a ser aplicada, mas a medida acabou não indo adiante. O diplomata Pedro da Cunha Menezes, idealizador da Trilha Transcarioca, afirma não haver propósito em fragmentar as gestões de tantas unidades. Somadas, todas as unidades da capital somam 33 mil hectares, o que equivale a dez Florestas da Tijuca. Para ele, ao menos aquelas de proteção integral (parques), deveriam ter um comando único: “Um exemplo é o Parque da Catacumba (na Lagoa). Até pela continuidade, ele deveria formar uma unidade de conservação com o Paisagem Carioca (204 hectares) e com o Monumento Natural do Pão de Açúcar. A medida traria mais eficiência”.
Como bom exemplo de gestão, Menezes cita o caso do Monumento Natural dos Morros do Pão de Açúcar e da Urca (MoNa Pão de Açúcar), a cargo do biólogo Marcelo Barros de Andrade. Ações de recuperação ambiental, com o plantio de mudas, e engajamento social marcam a gestão da unidade, uma das dez que possuem planos de manejo, documentos oficiais que amparam todo o desenvolvimento e as políticas das UCs.
O que diz a prefeitura
((o))eco procurou a Secretaria de Meio Ambiente do Rio para comentar o assunto. Questionada se há algum plano de capacitação de gestores em curso, a assessoria da SMAC informou estar elaborando um novo projeto nesse sentido. Sobre a enorme quantidade de UCs municipais, que acaba por fragmentar a gestão e dificultar avanços, a pasta informou que “existem algumas propostas em andamento, como o Mosaico da Lagoa, que reuniria seis unidades de conservação em apenas duas, inclusive com uma ampliação”. Acrescentou ainda que um exemplo de sucesso foi a criação do Mosaico de Marapendi, que reúne Parque Marapendi, APA Marapendi e Parque Nelson Mandela.
Sobre a ausência de gestores em 30 UCs, a secretaria informou que “as unidades que não têm um gestor específico designado para elas são geridas diretamente pela gerência de unidades de conservação ambiental da Secretaria Municipal de Meio Ambiente da cidade”. A pasta considera ainda que as diferenças salarias dos gestores são “naturais, decorrentes dos cargos efetivos dos servidores e de seus históricos funcionais”.
Quanto a possibilidades de recategorização, a pasta reconheceu que, no caso específico da APA da Pedra Branca, como a unidade está totalmente inserida no Parque de mesmo nome, ela poderia ser extinta.
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