Mais uma vez, Atibaia – e desta vez a pauta é ambiental. A abertura e ampliação irregular de estradas dentro do Parque Estadual do Itapetinga, localizado no município paulista, e em sua zona de amortecimento. A obra foi liderada pela própria prefeitura de Atibaia, com apoio de alguns moradores de um loteamento vizinho ao parque, San Fernando Valley, e nem mesmo consultou o órgão ambiental responsável pela gestão da área protegida. Sem consulta nem licença, os tratores avançaram parque adentro, derrubando árvores para ampliar vias antigas que estavam em desuso exatamente para regeneração da vegetação nativa. Cerca de 0.5 hectare foi impactado. Para deter o avanço do maquinário, na última terça-feira (23), organizações ambientais de Atibaia se mobilizaram e bloquearam o acesso ao interior do parque.
A mobilização foi liderada pela ONG Simbiose e pelo Coletivo Socioambiental de Atibaia, que receberam a denúncia de que máquinas estava entrando dentro do parque. Ao chegarem no local e constatarem o estrago feito pelo trabalho dos tratores, os moradores fizeram uma barreira, com um carro atravessado na via, e acionaram a Fundação Florestal de São Paulo, responsável pela gestão do parque. Ao, finalmente, ser informada sobre a obra, um representante da Fundação Florestal foi ao local e, acompanhado da Polícia Militar Ambiental de São Paulo, autuou a prefeitura em R$ 5.060,00.
Com a obra embargada, os moradores aproveitaram para fazer um ato simbólico de “reconquista” do território do parque, na sexta-feira (26), com a instalação de mourões e uma cancela, que marcam o limite e entrada da unidade de conservação, e com o plantio de cerca de 20 mudas nativas nas áreas recém-deflorestadas. “É um ato simbólico. Agora se os tratores voltarem, vão ter que arrancar nossa cancela e nossas mudas”, comenta um dos integrantes do Coletivo Socioambiental de Atibaia, Paul Colas, que participou da ação. O plantio feito pelas organizações também foi uma oportunidade de promover a educação ambiental e convidar os moradores do entorno a se apropriarem da serra – e se engajarem a protegê-la!
“A especulação imobiliária aqui é muito forte, estamos muito colados na capital. É muito peixe grande que quer ter casa aqui. E existe um loteamento lá no pé da serra e um pedacinho dele virou parque em 2010”, conta o representante do coletivo, em referência ao loteamento conhecido como San Fernando Valley, idealizado em 1966 e aprovado na década de 90, que não foi totalmente implementado.
“A prefeitura sabe que aquele pedacinho é parque. O certo seria que aqueles lotes que foram afetados pelo parque fossem indenizados, mas esse é um processo muito moroso. E a prefeitura estava dando uma arrumada nas ruas e resolveu entrar no parque para refazer uma rua que já estava fechada há uns 20 anos. Era um caminho em que as pessoas andavam de bicicleta, iam caminhar. Não passava mais carro lá, foi abandonada para vegetação se recuperar. E é dentro do limite do parque”, explica. “Existia um mapa antigo do loteamento e eles estavam seguindo à risca, abrindo estradas onde nunca existiu estrada”.
O trecho impactado, conhecido como Trilha da Mangueira, além de ser usado como local de recreação e esporte pelos moradores, é uma das seis trilhas principais que dão acesso à Pedra Grande, maior atrativo natural e turístico de Atibaia e símbolo da cidade. A Pedra é protegida pelo Monumento Natural Estadual da Pedra Grande, localizada no interior do Parque Estadual. As obras de pavimentação afetaram também a Zona de Amortecimento do Monumento Natural.
Em uma live realizada pelo prefeito de Atibaia, Saulo Pedroso de Souza (PSD-SP), na noite do dia 23, ele tenta esclarecer o ocorrido e menciona as regras estabelecidas à época da criação do loteamento, sem em nenhum momento citar as duas unidades de conservação afetadas pela obra. “A gente está tratando de uma situação consolidada e de um direito adquirido, então é uma situação muito difícil. Porque nós temos ali diversos proprietários que precisam ter acesso a sua propriedade até porque eles pagam impostos como todos os outros proprietários da cidade, O direito de propriedade precisa ser garantido”, fala o prefeito na live. Saulo menciona que a Associação de Moradores do bairro assinou um Termo de Compromisso com a prefeitura para fazer obra de infraestrutura e pavimentação, “e essa obra contempla todas as ruas que estão dentro da aprovação que aconteceu lá atrás”.
“Não existe direito adquirido em cima de unidade de conservação, é um bem público. E em nenhum momento da live se retrataram”, lamenta Paul.
Um dos membros da ONG Simbiose, Vinícius de Zorzi, que participou da ação em defesa do parque, conta que a equipe da organização começou a receber os avisos e pedidos de ajuda da população do próprio bairro San Fernando Valley no dia 20 de junho. “Historicamente, ocorrem ali tentativas de ocupação irregular da montanha. Com a criação das unidades de conservação, acreditávamos que seria muito mais difícil a ocorrência de tal tipo de intervenção sem a atenção às legislações pertinentes”, ressalta Vinícius.
De acordo com informações da Secretaria de Infraestrutura e Meio Ambiente “a Prefeitura Municipal de Atibaia foi autuada por destruição de vegetação nativa secundária em estágio inicial de regeneração em 0.46 hectares na Unidade de Conservação Parque Estadual do Itapetinga; bem como intervenção em 0.6 hectares. em Área de Proteção Permanente (APP)”.
A equipe da ONG Simbiose, que atua há 16 anos no município paulista, analisou não apenas os impactos diretos, mas também indiretos da intervenção feita nas vias. “Pelo que pudemos averiguar, houve supressão de vegetação nativa em regeneração, intervenção em Área de Preservação Permanente hídrica [nascentes e margens de rios] e movimentação de solo. Após a intervenção, notamos o aumento do número de pessoas em carros adentrando a unidade, aumento de lixo e uso do espaço para eventos noturnos com uso de fogueiras”, detalha o membro da ONG. Vinícius alerta ainda que, devido à pandemia do novo coronavírus, todos os parques paulistas estão – pelo menos na teoria – fechados para visitação.
A ONG, que ocupa uma das cadeiras do Conselho Consultivo do Parque Estadual do Itapetinga, está investigando a existência de possíveis intenções “que visem, mesmo que dentro de preceitos legais, a desafetação dos limites do Parque e ou a perenização de estradas internas”.
De acordo com o membro do Coletivo Socioambiental, mais de dois terços do Produto Interno Bruto (PIB) de Atibaia vem do pagamento de IPTU, principalmente por causa desses grandes loteamentos. “É um valor muito grande e a prefeitura tem um certo interesse de que esse recurso continue vindo. Tem muita pressão imobiliária e a prefeitura cede”, conta o voluntário do Coletivo Socioambiental de Atibaia. “Se não fosse o parque, com certeza nós estaríamos com a cidade para cima da serra”, completa.
“O bairro [San Fernando Valley] fechou uma Parceria Pública-Privada super estranha. A prefeitura entrar com o maquinário e os proprietários entrarem com o pagamento da empreiteira que faria o asfalto. Especula-se que uma única pessoa, que seria dona de uns 25 lotes que estão dentro do parque, só ela pagaria metade da obra sozinha. Para essa pessoa seria vantajoso porque depois de consolidado é mais fácil desafetar o parque do que indenizá-la. Foi uma decisão não conversada com o bairro, tinha muita gente que não sabia. A maior parte que mora no bairro não tem interesse no asfalto, mas tem algumas pessoas mais poderosas lá forçando a barra”, descreve uma fonte local ouvida por ((o))eco.
Em nota, a prefeitura de Atibaia explicou que foi firmado, em fevereiro deste ano, uma parceria entre a prefeitura e associações de moradores, para a pavimentação em mais quatro bairros da cidade, entre eles, o San Fernando Valley. Conforme os termos da parceria, a administração municipal fornecerá, com recursos próprios, o material a ser utilizado nas benfeitorias, enquanto os moradores ficarão responsáveis pela contratação da empresa que realizará o projeto, mão de obra e execução dos serviços.
“No caso do loteamento San Fernando, as máquinas estavam trabalhando para limpar e reabrir ruas para que seja cumprido o cronograma acordado com a Associação de Moradores local para o asfaltamento de todo o loteamento. Após o comparecimento da Polícia Militar Ambiental no local e aplicação de multa pela mesma, as obras foram paralisadas até que haja entendimento quanto a situação legal da reabertura de ruas. Para isso, a Prefeitura apresentará recurso dentro dos trâmites exigidos pela lei”, esclarece a nota.
Leia também
Linhas de transmissão irão recortar remanescentes de araucárias e campos nativos
Estrada no Iguaçu pode beneficiar negócios de parlamentar que propõe a obra
Leia também
Guarda é morto no Parque Estadual Intervales, em São Paulo
Damião Cristino de Carvalho Junior era guarda patrimonial e levou um tiro na cabeça. Um guarda-parque foi baleado na perna, mas não corre risco →
Estrada no Iguaçu pode beneficiar negócios de parlamentar que propõe a obra
Deputado Vermelho e filhos possuem construtoras. Um deles concorreu em edital para recuperar rodovia de acesso ao parque nacional, e sua empresa está em área protegida por lei, às margens do Rio Iguaçu →
Linhas de transmissão irão recortar remanescentes de araucárias e campos nativos
Licenciamento ambiental do empreendimento é denunciado por falta de transparência e por estudos de impacto ambiental incompletos, e irá cruzar áreas de vegetação nativa na Escarpa Devoniana →
Salve salve Atibaia querida
Engraçado…. A turma do ativismo defende o parque etc…mas nem querem saber se os proprietários foram ressarcidos pela desapropriação.
A Fundação Florestal bem como o governo do estado não indenizaram ninguém até agora, e os ativistas querendo aparecer como salvadores das terras conservadas pelos antigos proprietários a décadas…. só nesse país mesmo.
Prefeitura desmata, destroi a natureza , derruba arvores nativas de maneira covarde e criminosa e é
multada em pouco mais de 5 mil reais, *5 mil reais* piada né….
Verdade Sandra! A ganância do setor imobiliário de Atibaia está fora de controle. !!!
O que será de Atibaia sem áreas verdes.?. Vergonha desses nossos políticos e desses capitalistas imobiliários. O clima aqui que era tão bom, já não é em virtude desse desmatamento. Ódio desses gananciosos!
Moro no Jd Paulista minha rua ainda não asfaltaram ao invés de ficar abrindo estrada em área florestal manda uma máquina passar na minha rua porque daqui a pouco nem trator vai passar de tanta cratera que tem a última vez que mandaram uma máquina foi no ano passado. Rua Tietê e são Sebastião Jd Paulista. Homem por dinheiro está invadindo a natureza, engraçado que onde construíram condomínio de luxo na área rural "bairro cachoeira" está tudo asfaltado, tudo por dinheiro.
Peço aos defensores do parque, derrubarem os pinus, vistos nas fotos.
Interesses imobiliários, é a única resposta.
Não vamos entregar nossa Pedra Grande, obrigada aos ativistas que estão nesse trabalho.
Caro Jona
Seu interesse e totalmente cons fins imobiliários. Os ativistas estao corretos e sem eles a serra ja nao existiria mais. O desenvolvimento da cidade é importante, mas é mais importante estabelecer criterios para a ocupação. O que vemos hoje em Atibaia e um pensando unico e exclusivo na exploracao imobiliaria…como o seu…infelizmente.
Que tal ouvir os proprietários de terrenos que pagam seus impostos em dia e tem direito a propriedade de acordo com a Constituição Federal e que não estão exercendo seu direito constitucional. Vocês sabiam que o Loteamento San Fernando Valley está a poucos km do centro da cidade, em área "urbana", e que todos seus proprietários pagam IPTU. Mas, pelo visto, vocês não sabem que o Parque Florestal é, por lei, formado exclusivamente em área "rural", logo não podem avançar sobre área urbana. Que tal, verificarem também a pretensão política das lideranças desses ativistas? E porquê, também não explicaram que toda a Serra do Itapetinga é devastada por incêndios e que o que predomina naquela área são pinheiros e braquearas e que, essas ONGS que aparecem agora para justificar a manutenção dos recursos públicos que recebem, não intervêm com a mesma força para combater os incêndios.
O jornalismo hoje só ouve o lado que vai corroborar com a matéria.