Ampliação da Área de Proteção Ambiental de Guapi-Mirim ou criação de uma Reserva Extrativista para contemplar os pescadores. Essas são apenas duas das 63 sugestões que os deputados integrantes da Comissão Especial da Baía de Guanabara da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj) propuseram no relatório tornado público na semana passada.
Durante um ano, os integrantes analisaram as ameaças que a bacia hidrográfica que deságua na baía sofre. Na sexta-feira, o deputado Flavio Serafini (PSOL), que presidiu a Comissão Especial, conversou com ((o))eco sobre o relatório.
Leia a entrevista na íntegra:
((o))eco – Como está o panorama da situação da Baía?
A gente sentiu a necessidade de atualizar a leitura sobre os processos de degradação e as possíveis políticas de recuperação da Baía de Guanabara. Por conta da realização dos Jogos Olímpicos, a Baía voltou a ter visibilidade, o que nos permite pensar não só nos fatores que influenciam sua degradação, como também em políticas públicas capazes de efetivamente iniciar um processo de recuperação mais profunda.
Com isso, repensamos o processo de coleta e tratamento de esgoto e de lixo, assim como vislumbramos os problemas ligados à fiscalização e à presença industrial na bacia hidrográfica, uma vez que a questão dos metais pesados continua grave. Também foi detectado um novo problema, que é o que a gente chama de saturação do espelho d’água da Baía, devido especialmente ao crescimento da cadeia do petróleo – o que tem levado a um maior número de navios ocupando a área para dar suporte ao setor petrolífero. Baseados neste panorama, tentamos estruturar nosso relatório dando respostas a esses três processos.
Por outro lado, também detectamos a consolidação de uma importante experiência de recuperação ambiental que é a Área de Preservação Ambiental [APA] de Guapi-Mirim e a Estação Ecológica [Esec] da Guanabara, que são exemplos que conseguem concomitar a recuperação de áreas de mangue e a manutenção da biodiversidade.
((o))eco – Quais foram as recomendações do relatório?
Uma das recomendações do relatório é a necessidade de reordenamento do espaço da Baía de Guanabara. Foi proposta uma moratória de novos empreendimentos na bacia enquanto não for feita uma avaliação ambiental integrada, um zoneamento econômico-ecológico.
No âmbito dessa discussão, foram apresentadas duas possibilidades: uma é a ampliação das APAs na Baía, com o apoio do conselho gestor da própria APA e do ICMBio. A outra é fazer uma área de proteção ambiental estadual contígua, que poderia ser uma reserva extrativista, a ser construída junto com os pescadores.
Então uma das recomendações que a gente trata no relatório é esta discussão, que a gente acha fundamental. Vimos, por exemplo, que nos planos de expansão das áreas de fundeio [local onde a embarcação lança a âncora, usado para carga e descarga] dentro da baía, havia novas áreas que se aproximam demais da zona de amortecimento [local de borda da unidade onde atividades potencialmente poluidoras são proibidas] da APA. Na nossa avaliação, isto é grave não só pelo impacto que pode ter na área mas, especialmente, porque aprofunda esse processo de saturação da baía de uma forma mais global.
A gente conversou muito com o pessoal do Maqua [Laboratório de Mamíferos Aquáticos e Bioindicadores, do Departamento de Oceanografia da UERJ], que monitora o golfinho (o boto-cinza, ameaçado de extinção), trabalhando a espécie como bioindicador. É muito evidente que a presença da indústria do petróleo tem sido um dos elementos que ameaçam a sobrevivência do golfinho, tanto pelo despejo de metais pesados na bacia hidrográfica quanto pela sensibilidade da própria espécie à presença dessa indústria.
Uma das recomendações do relatório é fazer uma reserva ou ampliar a APA. O estudo propõe nove propostas de projetos de lei. Uma delas é a criação de uma taxa de fiscalização ambiental sob essas áreas de fundeio. Outra proposta é que 60% do Fundo Nacional de Compensação Ambiental [Fecam] seja investido em saneamento básico nos próximos 20 anos.
((o))eco – A taxa seria pra quê?
Para as atividades de fundeio. São esses navios que ficam estacionados na Baía de Guanabara para dar suporte à indústria do petróleo. É uma taxa de fiscalização para permitir o aprimoramento das atividades de fiscalização.
((o))eco – Deputado, quanto tempo demorou para fazer esse relatório?
Um ano. Nós ouvimos diferentes gestores, inclusive os daqui da APA estiveram conosco, tanto no Rio em audiências públicas, quanto em visitas técnicas na Baía de Guanabara partindo daqui da APA.
((o))eco – É a primeira vez que o senhor trata de assunto ambiental?
Olha, esse é o meu primeiro mandato. Desde o início trabalho com foco na área ambiental: sou membro da Comissão de Meio Ambiente; assim como fui da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Crise Hídrica e, depois, presidi essa comissão. Antes, atuei como pesquisador da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e como professor. A Fiocruz é uma instituição que trabalha muito forte com o conceito de promoção da saúde ambiental. Eu sou de uma instituição que tem um olhar muito voltado para a área ambiental e para a promoção de saúde. Então, isso é algo muito importante que a gente tem das questões sociais.
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A solução para a Baía de Guanabara é ampliar as APAs? Justo essa categoria mais inócua e inoperante de UC?
Só debochando mesmo. Não dá para levar essa turma do governo do Rio a sério.
APAs tem conselho consultivo, não gestor. A zona de amortecimento não proíbe atividades potencialmente poluidoras coisa nenhuma, apenas traz um regramento especial de proteção.