A Lei do Sistema Nacional de Unidades de Conservação ou SNUC, como é conhecida, Lei número 9.985 de 18 de julho de 2000, embora complete agora seus quinze anos – e há que se fazer a festa de comemoração – foi concebida muito antes de 2000, por dois documentos públicos principais. A primeira proposta do “ Plano do Sistema de Unidades de Conservação do Brasil” foi publicada em 1979 e aprovada pelo Executivo. Apresentava, junto com a segunda proposta de 1982, várias categorias de manejo de unidades de conservação, com seus objetivos e justificativas. Além do mais, dentro destes planejamentos foram indicadas várias unidades de conservação, em especial na Amazônia, que realmente foram estabelecidas de 1979 a 1982, ou algumas depois. No total, criou-se mais de 9 milhões de hectares de Parques Nacionais e Reservas Biológicas e começou-se o estabelecimento de unidades de conservação marinhas, além de algumas na Caatinga. Foi um salto propiciado pelo então Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal e também pela então Secretária Especial de Meio Ambiente (SEMA).
Mas nosso assunto hoje é sobre a Lei do SNUC que era e é fundamental ao estabelecimento e bom manejo e uso de áreas protegidas para o país, pois as especifica, define e, especialmente, fornece com clareza a definição e os objetivos de manejo de cada categoria, e até mecanismos legais de obtenção de recursos para algumas categorias, através de seu artigo 36.
Não falarei nesta coluna de erros que, a meu ver, existem nesta lei, pois, não obstante, é indubitavelmente tão necessária como importante.
O que quero enfatizar é que aconteceu e acontece com a Lei do SNUC exatamente o que ocorre com a grande maioria das leis no Brasil. São ótimas, mas caem em descaso ou quase não se aplicam na prática. Não há a necessária disciplina política e social para cumpri-las e, assim, outros artigos de outras leis vão derrubando algumas das suas conquistas fundamentais.
Assim o Brasil, mesmo sob a égide da Lei 9.985, assistiu e assiste, com grande consternação, a progressiva derrocada de seu Sistema Nacional de Unidades de Conservação. As terras das unidades estabelecidas segundo a Lei não são regularizadas. Na prática, mais de 50% da terra delas estão em mãos de particulares. Assim, por exemplo, o Poder Público não pode criar e implantar projetos de infraestrutura em Parques Nacionais, cujas terras não estejam regularizadas. O que fazem então? Mudam as categorias e extinguem UCs, pois, segundo trabalhos publicados, já perdemos mais de 5 milhões de hectares de unidades de conservação nos últimos 15 anos. Não há funcionários suficientes, equipamentos ou materiais. Não há apoio político e deixa-se quase tudo a Deus dará.
O Sistema de Áreas Protegidas tem áreas lindas, magníficas como podem ser as garotas de quinze anos, mas seus pais as abandonaram e até a regra de receber como compensação ambiental 0,5% dos grandes empreendimentos, que poderia ajudar na implementação do Sistema, sofreu modificações por outras normas ou por interpretações legais esdrúxulas.
E, justamente, ás vésperas das comemorações do aniversário da Lei tão esperada, vemos o desabafo publicado na imprensa pela grande cientista e humanista Niède Guidon, responsável em grande parte pelo estabelecimento e progresso do Parque Nacional da Serra da Capivara e também pelo da Serra das Confusões no Piauí e, igualmente, pelo desenvolvimento econômico e social da região. Ela sai dizendo “ Cansei, vou-me embora”. O que ela fez por lá foi maravilhoso. Conseguiu sustentar seu projeto desde fins de 79. Agora, entrega os pontos. Outros já disseram o mesmo, ou seja, falhamos. Com ou sem Lei prevaleceu e prevalece o uso abusivo dos recursos naturais, a destruição dos ecossistemas naturais, da nossa biodiversidade. Prevalece o desinteresse e a falta de responsabilidade dos políticos que nos governam, pois eles raramente passam de fazer discursos.
O que podemos e devemos fazer é parar com isto. Gritar bem alto que queremos o nosso Sistema de Unidades de Conservação implantado, não obstante aquelas atividades que o querem engolir em uma só talagada, em especial a agricultura e a mineração. Isso é o último suspiro da natureza de nosso país.
Vamos dar os parabéns à Lei e redobrar os esforços para implementá-la com responsabilidade, gritando nas ruas, dançando, participando em movimentos voluntários.
Vamos nos fazer ouvir pelos ouvidos moucos, ou vamos entregar tudo de mão beijada, desde Aparados da Serra a Iguaçu? Vamos lutar ou vamos ceder desde Serra da Capivara até o Raso da Catarina? Desde Pacaás Novos até Brasília, ou até o Pantanal Matogrossense até Noronha?
Acordem amigos e colegas que queiram a manutenção de nossa biodiversidade, pois até a área de turismo está querendo carregá-la, graças a sua enorme beleza. Vamos pelo menos dizer que muitos se importam pela destruição que avança sobre o SNUC.
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