Duas versões pressagiam o destino da Floresta Nacional de Jamanxim, no Pará. Neste sábado, numa entrevista coletiva ao lado de um dos líderes da bancada ruralista, o ministro do Meio Ambiente, Sarney Filho, anunciou que o Projeto de Lei que o governo enviaria para reduzir a área protegida só irá para o Congresso se tiver o aval do órgão responsável por criar e administrar as Unidades de Conservação federais, o Instituto Chico Mendes (ICMBio). O órgão ambiental, por sua vez, já havia comunicado que acataria os termos do acordo político que resultou nos vetos às Medidas Provisórias que recortariam áreas protegidas no Pará e em Santa Catarina. Traduzindo, o ICMBio afirmou que seguiria o que Sarney Filho disse, quando anunciou em vídeo que o presidente vetaria as MPs.
Segundo Paulo Carneiro, diretor de Criação e Manejo de Unidades de Conservação do ICMBio, o parecer técnico já estava praticamente pronto e seria enviado ao Ministério do Meio Ambiente até a última sexta-feira (23), com 486 mil hectares da Floresta Nacional (Flona) transformados na Área de Proteção Ambiental (APA) de Jamanxim, categoria mais branda de Unidade de Conservação, que permite propriedades privadas e exploração produtiva dentro de seus domínios. No caso de Jamanxim, isso significa a legalização de terras públicas invadidas, pois dois terços das ocupações da Flona ocorreram depois da criação da área protegida, segundo estudo feito pelo próprio ICMBio.
“Nós estamos no cumprimento das tratativas do acordo que levaram ao veto da Medida Provisória, apresentando o desenho que foi apresentado na Câmara. Nós defendemos a área que nós tínhamos apresentado anteriormente, mas essa conversa vai começar de novo no Congresso”, afirmou Carneiro, no final da tarde de quinta (22).
Dois dias depois, Sarney Filho convocou uma entrevista coletiva para falar sobre o Fundo Amazônia. Acompanhou toda a entrevista, sentado ao lado do ministro, o deputado Darcísio Perondi (PMDB-RS), um dos mais vocais membros da bancada ruralista.
Perguntado sobre o envio do projeto de lei, Sarney passou a bola para o ICMBio.
“Nós estamos agora num processo de discussão, sem pressa. E nada será remetido pelo Ministério do Meio Ambiente sem que não tenha o parecer técnico dos órgãos competentes para isso. Não sou eu que vou dizer, são os órgãos que vão dizer. Se amanhã o ICMBio dizer: ‘olha, pelas nossas avaliações técnicas, nós não devemos fazer nada’, nós não faremos nada. Mas se eles disserem: “precisamos de ajuste aqui, precisamos de ajuste ali”, nós vamos fazer”, disse.
Perguntado se o Projeto de Lei seria enviado com os 486 mil hectares, Sarney negou ter feito tal afirmação, que seria do senador Flexa Ribeiro (PSDB-PA). “Eu disse que ia mandar com parecer do ICMBio. Estou aguardando. Se o ICMBio disser que não é necessário eu não vou mandar. Se o ICMBio disser que é necessário eu mando nos termos que o ICMBio determinar.”
Em 2009, ICMBio descartou redução drástica de Jamanxim
“(…) as soluções de cunho imediatista atendem a interesses corporativistas ligados a alguns latifundiários, tendo como principal objetivo a redução dos limites atuais da Unidade”, afirma o relatório do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) em 2009. Na época, o instituto admitia, no máximo, a diminuição de 35 mil hectares de seus limites “para atender demandas justas de posse”. Hoje, o ICMBio prepara documento admitindo a redução de 486 mil.
O Estudo Técnico de Revisão dos Limites da Floresta Nacional do Jamanxim, concluído no final de setembro de 2009, é contundente ao afirmar que reduzir drasticamente a Unidade de Conservação não era a solução:
“Isto [a redução drástica] levaria a um recuo de estratégia governamental de conservação que traria consequências ambientais imprevisíveis não só para a própria área da Flona, mas também para várias outras unidades de conservação da Amazônia, invariavelmente sofrendo de pressão fundiária, invasões e interesses políticos”.
Em relação à questão das ocupações, o estudo do ICMBio de 2009 aponta que os benefícios sociais da redução seriam mínimos, já que são poucas as famílias que vivem na região: cerca de 30 a 40 famílias em toda a extensão da unidade.
“Em algumas das fazendas mantêm-se vaqueiros, mas muitas áreas não possuem ninguém, e nem pastagens, são vastas extensões de florestas públicas, que apesar desta condição tem posseiros que se dizem donos. Encontram-se também muitos pastos abandonados, em processo natural de regeneração”.
Na sua conclusão, o relatório defende a desafetação de três áreas da Floresta que totalizariam 35 mil hectares, mas alerta que a pressão para diminuir a unidade continuaria:
“Certamente as três áreas propostas para desafetação por este trabalho não satisfarão os anseios dos fazendeiros e políticos que propõe a desconstituição da unidade, porém são os únicos possíveis ajustes que não trarão os prejuízos sociais e ambientais expostos. Ressalta-se que a concessão florestal proposta para a Flona Jamanxim indubitavelmente trará maiores benefícios sociais e ambientais do que o atual modelo de grandes propriedades com pecuária extensiva”.
O que mudou de 2009 para cá não foi o perfil fundiário, dominado por posseiros e grileiros sem títulos de posse, mas a crença do próprio ICMBio de que mecanismos de comando e controle já não resolviam a situação da Unidade de Conservação mais desmatada do país, principalmente com o crescente aumento da violência na região: há um ano, o policial João Luiz de Maria Pereira foi morto durante operação do Ibama de combate ao desmatamento e garimpo dentro de Jamanxim.
“Nós acreditamos que é necessário uma alteração no modelo do jeito de encarar o problema de implementação da Flona de Jamanxim”, afirmou Carneiro.
Em dezembro de 2016, o ICMBio concordou com a redução em 304 mil hectares da Floresta Nacional, em troca de 438 mil hectares de acréscimo em proteção, que seriam anexados ao Parque Nacional do Rio Novo, e a criação de parte da APA de Jamanxim onde ainda não havia qualquer Unidade de Conservação.
O Congresso tratou de desmantelar esses ganhos e de ampliar outros retrocessos, como o aumento da APA de Jamanxim para dentro da Flona, no total de 486 mil hectares. Se o governo não trair o acordo com os ruralistas, haverá o envio desse mesmo tamanho de APA de volta ao Legislativo, sem os ganhos ambientais previsto originalmente. Tudo dependerá da resposta do ICMBio – que já está inclinado a aquiescer.
Uma fonte do governo envolvida na negociação disse que, caso se opte pelo recorte dos 486 mil hectares, o decreto de criação da APA de Jamanxim conterá restrições ao desmatamento no local, de maneira que ele não seja ampliado. “APA não é um laissez-faire“, afirmou.
Há exemplos de outras APAs, especialmente no litoral, onde restrições de uso vêm sendo aplicadas com sucesso. Na Amazônia, porém, dadas as dificuldades de fiscalização e a própria leniência do governo em fazer valer o Código Florestal, tais restrições tendem a não ter efeito contra o desmatamento. Na Amazônia, segundo o Ipam (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia), as taxas de desmatamento em APAs são idênticas às das áreas privadas.
Além disso, especialistas apontam que o principal efeito de uma unidade de conservação para brecar o desmatamento é retirar terras da possibilidade de grilagem. Quando o próprio governo reduz uma unidade de conservação para beneficiar a grilagem, ajuda a implodir esse efeito dissuasório, com possíveis impactos em outras áreas protegidas.
*Colaborou Claudio Angelo, do Observatório do Clima
Leia Também
Senado aprova Medidas Provisórias que recortam UCs na Amazônia
Redução de Jamanxim beneficia grileiros recentes, diz estudo
Leia também
Redução de Jamanxim beneficia grileiros recentes, diz estudo
Nova análise feita pela ONG Imazon reforça acusações de que a redução da Floresta Nacional do Jamanxim premia e incentiva seus invasores →
Senado aprova Medidas Provisórias que recortam UCs na Amazônia
As MPs 756 e 758, que alteram os limites de três áreas protegidas no Pará e uma em Santa Catarina, vão à sanção presidencial →
Governo vetará MP que recorta Jamanxim
Em vídeo, ministro Sarney Filho e senador Flexa Ribeiro anunciam o acordo que governo e congresso chegaram para pacificar a questão →
Kkkkkkkkk, jogo de cena, a batata quente tá pulando de colo em colo não é de hoje, ICMBio é uma tragi-comédia, MMA um engodo, e o Ministro, ah esse é um caso a parte… Kkkkkkk, e tem gente que acredita, fala sério !!!
Sobre o assunto, há uma "Carta aberta em repúdio à redução das Unidades de Conservação" produzida pela ASSEMMA (Associação dos Servidores do MMA). Tá no facebook: https://pt-br.facebook.com/Assemma/
Isso aí Maurício.
Depois de um Parecer como o de 2009, vão se contradizer.
E agora vamos ver quem são o presidente e Diretores do ICMBio!!!! A quem obedecem!
O problema não é o ICMBio, e sim que ocupa os maiores cargos lá. Tem muita gente boa querendo fazer funcionar, mas sem cargos…
E é aquele velho hábito do Brasil: "agora que já tá feito, deixa!!! Beneficiando infratores!!! Qual a novidade? Desse jeito, daqui a pouco UC nenhuma vai sobrar, só APA mesmo, que já sabemos, com raríssimas exceções, como é…
Pagamos pela língua solta de Lula, que provocou a corrida da grilagem quando anunciou a pavimentação da BR 163, e pela gestão de dona Marina, que inventou um Programa BR 163 Sustentável que deu nisso aí.
As MPs 756 e 758, mesmo com os vetos, já causaram um desastre, cujos resultados veremos no futuro (próximo?), resumido na afirmação mais importante do texto: "o principal efeito de uma unidade de conservação para brecar o desmatamento é retirar terras da possibilidade de grilagem. Quando o próprio governo reduz uma unidade de conservação para beneficiar a grilagem, ajuda a implodir esse efeito dissuasório, com possíveis impactos em outras áreas protegidas." Impactos certos, não possíveis. O ICMBio realmente acredita que "regularizando" terras griladas vai segurar o desmatamento naquela região? É inacreditável isso.
Marineiro, esqueceu que o icmbio é cria da Marina?
Simples assim. Estão de brincadeira.
Icmbio is but a puppet