O uso político da guerra entre Rússia e Ucrânia feito pelo presidente Jair Bolsonaro para justificar a abertura de Terras Indígenas à exploração minerária, de forma a fazer frente a uma eventual queda na importação de fertilizantes, provocou revolta de entidades indigenistas e ambientalistas.
Em sua live semanal na noite de ontem (3), Bolsonaro disse que tem presenciado “um certo clamor” de parlamentares para que faça andar no Congresso o Projeto de Lei 191/2020, que pretende regularizar a mineração e a exploração de hidrocarbonetos no subsolo de Terras Indígenas.
Nesta sexta-feira (4), o líder do governo na Câmara, deputado Ricardo Barros (PP/PR), assinou um Requerimento de Urgência para a apreciação rápida e em plenário do PL em questão, sem que ele passe pelas comissões. A base governista no Congresso também se movimenta pedindo adesão dos deputados federais ao pedido de urgência.
Em nota, o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) disse que “o governo utiliza a situação vivida na Europa para ampliar sua guerra particular contra os povos originários no Brasil”.
A entidade lembra que, desde que que foi apresentado, em janeiro de 2020, o Governo Federal tenta emplacar a proposta, sob diferentes justificativas.
“Esta estratégia de acelerar a aprovação de iniciativas legislativas diretamente em plenário já foi utilizada pelos aliados do governo no Congresso em 2021 e mostra claramente a intenção de aprovar nesta legislatura, de qualquer forma, os projetos que atendem aos interesses dos setores de apoio ao governo Bolsonaro”, diz a nota.
Segundo o Cimi, um dos principais focos de pressão neste momento está no interesse do governo em liberar a exploração de potássio nos territórios do povo indígena Mura, que vive na região do Baixo Madeira, próximo da foz com o Amazonas.
Segundo Bolsonaro, isso resolveria a previsível queda na importação do mineral proveniente da Rússia. Apesar de o país ser o principal fornecedor de adubos que se utilizam do mineral para o Brasil, tal argumento vem sendo refutado por especialistas na área.
Para a ex-ministra do Meio Ambiente Marina Silva, a sociedade brasileira não deixará passar essa “esperteza” de Bolsonaro e seus aliados. “Haverá pressões sobre o Congresso e, nesse ano eleitoral, os parlamentares que não contem com o esquecimento desses absurdos até outubro. O PL 191/20 não pode passar!”, disse Marina Silva em seu twitter.
“Bolsonaro usa, mais uma vez, argumentos retóricos pra conquistar apoio pra suas perversidades mais desejadas: acabar com indígenas sempre esteve entre elas […] OPORTUNISMO PURO. A verdade é que não adianta aprovar o PL 191, que autoriza mineração em terras indígenas, como a grande resposta pra qualquer crise. Sem planejamento, estrutura logística, estudos, não há saída. Nem fora, nem dentro de terras indígenas”, disse a consultora jurídica do Instituto Sociombiental (ISA), Juliana Batista.
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