Voltei de Nova York com mais esperança do que imaginava. A Semana do Clima (Climate Week) deste ano surpreendeu em dois aspectos: pela intensidade dos eventos, que mantiveram alta temperatura apesar do contexto geopolítico adverso, e pela consistência de uma narrativa que coloca o Brasil no centro das soluções globais para a crise climática – de forma benéfica para o mundo e para nós mesmos.
Para quem não sabe a Climate Week acontece em paralelo à Assembleia Geral das Nações Unidas. Este ano, ocorreu na semana de 22 a 26 de setembro. Em Nova York, coração financeiro global e polo de disseminação de conhecimento e iniciativas corporativas, a Climate Week é um termômetro da disposição das empresas e investidores para moverem as ações globais para mitigação e adaptação diante das mudanças climáticas. Também funciona como ponto de troca privilegiado entre organizações ambientais e instituições de pesquisa.
O motivo principal da minha viagem foi o seminário Climate Crossroads, organizado por nós, do Mundo Que Queremos, em parceria com a New York University (NYU) e a ECCON Soluções Ambientais. O evento contou com o apoio da Ação da Cidadania, Citrosuco, Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura, Instituto Arapyaú, Instituto Clima e Sociedade, Pragma Soluções Sustentáveis, S2F Partners e Vale. E sobretudo uma participação empolgante dos alunos de graduação e pós da NYU. Durante um dia inteiro, especialistas, representantes de empresas e governos debateram oportunidades concretas para enfrentar a crise climática, com foco em agricultura regenerativa, sistemas alimentares resilientes e regeneração florestal produtiva. Ideias que não apenas reduzem emissões, mas também geram emprego, renda e atraem investimentos para o Brasil. Além disso, pude acompanhar outros encontros realizados por organizações parceiras ao longo da semana.
Havia quem temesse um arrefecimento do engajamento climático global, diante do recuo de compromissos por parte de governos e empresas. Mas em Nova York ficou claro que a transição para uma economia de baixas emissões é inevitável. Pressões de investidores, consumidores e reguladores já consolidaram compromissos que não voltam atrás. Mais ainda: os impactos das mudanças climáticas já estão aqui, e isso trouxe à tona a pauta da adaptação – preparar cidades, infraestrutura e, sobretudo, a agricultura para novos regimes de chuvas, secas e eventos extremos.
E é justamente nesse ponto que entra a segunda constatação: o Brasil tem uma oportunidade única. Somos grandes produtores e exportadores de alimentos e energia, e podemos liderar a transição para práticas inovadoras de agricultura regenerativa. Isso significa envolver pequenos e grandes produtores em sistemas que restauram serviços ecossistêmicos: melhorar a qualidade da água, conservar nascentes, manter chuvas, aumentar a biodiversidade e recuperar vegetação nativa e florestal. Com ganhos de produtividade e valorização de mercado, essas práticas aumentam a resiliência dos agricultores diante das intempéries.
Outra oportunidade evidente é a regeneração florestal. Estimativas apontam até 80 milhões de hectares disponíveis para recuperação na Amazônia. Seja por regeneração passiva, protegendo áreas contra incêndios, seja por regeneração ativa, com plantio de mudas e engajamento de mão de obra local, o Brasil pode gerar empregos de qualidade em regiões de baixa alternativa econômica. Ao mesmo tempo, contribui para atender a urgência global de capturar carbono por meio da fotossíntese em florestas tropicais – um complemento indispensável à redução de emissões por energias limpas e transportes sustentáveis.
Essa visão foi recorrente em diversos painéis e encontros durante a Climate Week, inclusive entre investidores americanos. O Brasil tem diante de si não apenas um dever ambiental, mas uma chance estratégica de se afirmar como protagonista de uma nova economia climática. Como foi apresentado de forma bem direta pelo americano Bruno Laskowsky, partner and Managing Director da Yvy Capital, um fundo especializado na transição verde. “O Brasil tem oportunidade de usar carbono como um dos principais itens da balança comercial”, afirmou em um dos painéis do seminário Climate Crossroads. “Os caras aqui nos Estados Unidos entenderam que Brasil é um key actor para investimentos em crédito e florestas. Creio que os brasileiros saberão enxergar também essa oportunidade.”
Alguns empresários da Amazônia já perceberam. “Só é preciso estabelecer um preço para o carbono florestal e tornar esse mecanismo disponível para os empreendedores locais”, afirmou também no Climate Crossroads o amazonense Denis Minev, presidente da Bemol, maior rede varejista da região. “É a maior oportunidade econômica da minha geração”, resume.
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