As imensas polêmicas que vêm grassando na sociedade brasileira sobre desenvolvimento e proteção ao meio ambiente estão cada vez mais acirradas e, de certa forma, refletem um diálogo de surdos e a pouca disposição para que as partes possam, reciprocamente, ouvir os argumentos umas das outras.
Como se sabe, o desenvolvimento econômico no Brasil sempre se fez às custas do meio ambiente, pois calcado na exportação de produtos primários, extraídos sem qualquer preocupação com a sua sustentabilidade. Mesmo após o início da industrialização tal tendência se manteve. Atualmente, começa a se formar uma nova orientação que considera o fator ambiental como relevante. Esta mudança de concepção, contudo, não é linear e se materializa em contradições e dificuldades na implementação de políticas industriais que levem em conta o ambiente. A questão chave a ser enfrentada é saber em que medida é possível a conciliação entre o desenvolvimento econômico e a proteção do meio ambiente, e mais: até que ponto prevalece o interesse da proteção ambiental ou o interesse do desenvolvimento econômico? Evidentemente, também se faz necessária a conjugação de tais elementos com o chamado social, visto que as populações mais pobres são aquelas que sofrem mais com as mazelas ambientais, como nos caso de Bhopal, Cubatão e outros.
A Lei n° 6.938, de 31 de agosto de 1981 (Política Nacional do Meio Ambiente), em seu artigo 2°, determina: “A Política Nacional do Meio Ambiente tem por objetivo a preservação, melhoria e recuperação da qualidade ambiental propícia à vida, visando assegurar, no País, condições de desenvolvimento socioeconômico, aos interesses da segurança nacional e à proteção da dignidade da vida humana…”
O fato é que a proteção ao meio ambiente brasileiro estará fadada ao insucesso se não houver um acréscimo nos níveis de renda da população brasileira e uma melhoria substancial na sua distribuição. Qualquer análise que se faça do estado do meio ambiente no Brasil – e nisto nada temos de diferente dos demais países do mundo – demonstrará que os principais problemas ambientais se encontram nas áreas mais pobres e que as maiores vítimas do descontrole ambiental são os chamados setores vulneráveis da sociedade. De fato, há uma relação perversa entre condições ambientais e pobreza. Assim, parece óbvio que as condições ambientais somente poderão ser melhoradas com uma mais adequada distribuição de renda entre membros de nossa sociedade. A propósito, o Brasil é signatário da Declaração sobre o Direito ao Desenvolvimento que, no § 1º do artigo 1º, dispõe: “O direito ao desenvolvimento é um direito humano inalienável, em virtude do qual toda pessoa e todos os povos estão habilitados a participar do desenvolvimento econômico, social, cultural e político, a ele contribuir e dele desfrutar, no qual todos os direitos humanos e liberdades fundamentais possam ser plenamente realizados”.
Tal disposição deve ser interpretada conjuntamente com o § 1º do artigo 2º, que define: “A pessoa humana é o sujeito central do desenvolvimento e deveria ser participante ativo e beneficiário do direito ao desenvolvimento”. Há ainda que considerar que o conceito de desenvolvimento tem alguns elementos-chaves, como por exemplo: “Os Estados devem tomar, em nível nacional, todas as medidas necessárias para a realização do direito ao desenvolvimento e devem assegurar, inter alia, igualdade de oportunidade para todos, no acesso aos recursos básicos, educação, serviços de saúde, alimentação, habitação, emprego e distribuição eqüitativa da renda. Medidas efetivas devem ser tomadas para assegurar que as mulheres tenham um papel ativo no processo de desenvolvimento. Reformas econômicas e sociais apropriadas”.
A Declaração prossegue afirmando em seu artigo 9º que: “Todos os aspectos dos direito ao desenvolvimento estabelecidos na presente Declaração são indivisíveis e interdependentes, e cada um deles deve ser considerado no contexto do todo”.
É indiscutível, portanto, que o direito ao desenvolvimento é um dos mais importantes dos direitos humanos e que ele não é contraditório com o direito ao meio ambiente saudável. Muito ao contrário, são direitos complementares e indissociáveis. Logo, as atuais querelas são despropositas e revelam um desconhecimento profundo dos compromissos internacionais assumidos pelo Brasil na arena internacional.
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