Muito se tem falado sobre crescimento sustentável, e a sustentabilidade se tornou algo como a cidadania ou a inclusão social: todos somos a favor, sem necessariamente saber o que é e nem tampouco como medi-la. Na economia de mercado a melhor maneira de encontrar respostas objetivas para essas questões é buscá-las junto a quem tem dinheiro a ganhar (ou perder) no assunto. Nesse caso, entre os investidores que dizem seguir estratégias sustentáveis.
A indústria de fundos de investimento movimenta trilhões de dólares nos Estados Unidos, e o número de fundos é muito grande. Seus gestores procuram se diferenciar no mercado não só através de desempenho, mas também buscando nichos, como o do investimento sustentável. Por isto a industria tem tentado desenvolver sistemáticas para avaliar a sustentabilidade das empresas em que investe. Mas como ambientalistas de bom senso não rasgam dinheiro, mesmo os fundos sustentáveis devem oferecer retornos atraentes para os investidores e, para avaliar o seu sucesso, é preciso ter um índice que sirva como termo de comparação.
Ao mesmo tempo, cresceu muito nos últimos anos a complexidade dos parâmetros de avaliação ética, social e ambiental dos investimentos. O conceito de sustentabilidade pode englobar fatores diversos como códigos de conduta (a empresa usa propinas para conseguir contratos?), governança corporativa (a empresa tem representantes de minorias no seu conselho de administração?), política ambiental, ecoeficiência, e ética nas relações trabalhistas e no desenvolvimento de capital humano. A crescente complexidade dessa agenda torna muito mais difícil o trabalho dos gestores de investimento. É preciso estabelecer dimensões de sustentabilidade, critérios de avaliação, e criar mecanismos de fiscalização permanente para, a partir daí, selecionar as empresas que merecem a qualificação de sustentável.
A agência Dow Jones lançou em 1999 um grupo de índices chamado Dow Jones Sustainability Indexes, dos quais o principal é o World Sustainability Index. Como diz o nome, é um índice global, que inclui mais de 300 empresas em 60 indústrias. Elas são selecionadas como as empresas líderes em sustentabilidade em seus respectivos setores, mas nenhum setor é excluído do índice (há sub-índices que excluem setores eticamente questionáveis tais como fumo, bebidas alcóolicas e armamentos).
Os critérios de seleção são bastante detalhados e, na medida do possível, objetivos. Com base em dados públicos e no contato direto, e com ponderações iguais para os itens econômicos, sociais e ambientais, os analistas da agência procuram avaliar até que ponto as práticas de cada empresa correspondem à expectativa de sustentabilidade, de acordo com a definição do momento. O conceito encontra-se ainda em evolução, e a cada revisão anual do índice introduzem-se novas questões. Na parte ambiental, a ênfase recente esteve na ecoeficiência, isto é, na otimização do uso de recursos não renováveis e na minimização de emissões (de poluentes e de gases do efeito estufa). Entre os critérios específicos para os diversos setores de atividade, constam, por exemplo, a busca de produtos saudáveis para as empresas de alimentos ou a redução de ruídos para as empresas aéreas.
O ponto de partida é a definição de sustentabilidade corporativa como uma abordagem que busca gerar valor para o acionista no longo prazo buscando as oportunidades e evitando os riscos derivados de tendências e eventos econômicos, sociais e ambientais. A metodologia procura identificar, dentro de um universo de empresas que fazem parte dos índices globais da Dow Jones, as líderes em sustentabilidade para cada setor econômico. Aplica-se uma combinação de critérios globais e critérios específicos para cada setor, através de formulários preenchidos pelas empresas, documentação fornecida por elas, informação pública e contato com as empresas.
O resultado é um índice de sustentabilidade de cada empresa analisada, dividido em três partes – econômico, social e ambiental. Tomando como exemplo a parte ambiental, veremos que os avaliadores dão pontos não apenas para a política ambiental da empresa, mas também para a transparência dessa política. Há pontuação também para ecoeficiência (emissão de gases do efeito estufa, uso de água, uso de energia, produção de lixo) e para a política de informação ambiental da empresa. Finalmente, há os indicadores específicos de cada setor.
Esse índice não pode ter a pretensão de esgotar o tema do investimento sustentável. Em primeiro lugar, o universo de empresas investigadas é pequeno, resumindo-se às maiores do mundo em cada setor. Além disso, esse viés de seleção induz ao erro de imaginar que só empresas grandes são sustentáveis. A constante evolução dos critérios, por outro lado, cria um certo desconforto por parte do usuário dos índices, pois fica a sensação de que a avaliação reage aos eventos e à opinião pública, ao invés de antecipar tendências. Finalmente, o índice inclui empresas em setores que pela sua própria natureza têm grande impacto ambiental, tais como energia e recursos naturais.
Ainda assim, fazer parte do índice é uma distinção importante. Hoje fazem parte dele três empresas brasileiras: uma instituição financeira (Itaú), uma holding (Itaúsa) e uma empresa de energia elétrica (Cemig). Já a Embraer fez parte deste índice até a última revisão. Entramos em contato com a empresa para tentar entender o motivo de sua exclusão mas até o fechamento desse artigo ainda não obtivemos resposta.
É difícil medir o impacto agregado do índice, mas ele serve para mostrar que é possível desenvolver abordagens razoavelmente objetivas e disciplinadas para avaliar sustentabilidade. De acordo com a Dow Jones, 52 empresas de gestão de recursos usam o índice, vinculando a ele um total de 2,8 bilhões de euros. É um volume relativamente pequeno de recursos, nos levando a crer que o impacto maior do índice ainda é sobre a reputação das empresas. É bom ser membro do clube.
P.S. Um formulário de avaliação e outros documentos do índice (em inglês) podem ser encontrados no website http://www.sustainability-indexes.com
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