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Carta – Governo Lula pôe e tira

De Mauricio MercadanteDiretor de Áreas Protegidas da Secretaria de Biodiversidade e Florestas do Ministério do Meio Ambiente Quem te viu e quem te...

Redação ((o))eco ·
24 de julho de 2006 · 18 anos atrás

De Mauricio Mercadante
Diretor de Áreas Protegidas da Secretaria de Biodiversidade e Florestas do Ministério do Meio Ambiente

Quem te viu e quem te vê: Maria Tereza elogiando Marina Silva. Há dois anos atrás, neste mesmo site, Maria Tereza dizia que Marina Silva não tinha competência para ser ministra, estava “destruindo tudo o que de bom foi feito por ministros sem nenhuma experiência ambiental prévia, como Krause e Sarney Filho, além, claro, de José Carlos Carvalho, que tinha vasta experiência anterior“, e devia voltar para o Congresso onde era o seu lugar. Como se vê, uma mudança e tanto.

O que explica a mudança? É simples: não dá para falar hoje sobre unidade de conservação sem fazer menção, por ligeira que seja, ao desempenho do Governo Lula em matéria de criação de unidades de conservação. Está todo mundo vendo, está na cara, é óbvio. Os leitores de O Eco estão acompanhando pari passu os avanços nessa área. Não dá para fingir que não está acontecendo, muito menos ficar metendo o pau o tempo todo. Pega mal. Os leitores de O Eco não são estúpidos.

Mas é claro que, para não perder o hábito, no mesmo passo em que elogia (e eu imagino a dificuldade que Maria Tereza deve ter sentido para escrever “Parabéns Marina!”, Maria Tereza prossegue fazendo críticas gratuitas e sem fundamento.

Maria Tereza diz que o Governo Lula criou 8 Parques Nacionais, totalizando 3.564.000 ha. Esqueceu de incluir o Parna da Serra do Pardo, com “apenas” 445.000 hectares. Vale lembrar que, depois da publicação do artigo de Maria Tereza, o Governo já criou o Parque Nacional dos Campos Amazônicos, com 873.000 ha. São agora, portanto, 10 Parques, que somam mais de 4.900.000 ha. O processo é tão dinâmico que um artigo sobre o tema escrito há apenas um mês já ficou velho.

Maria Tereza diz que as UCs de proteção integral (Parnas, Reservas Biológicas e Estações Ecológicas) criadas pelo Governo Lula somam 7.379.000 ha. (Na verdade, 7.824.000, considerando o “esquecido” Parna da Serra do Pardo). Desse número, seriam necessários, segundo a autora, excluir as áreas dos Parques submetidos a dupla afetação (Parque do Araguaia, com 377.000 ha (apenas a área sobreposta à Terra Indígena Inãwébohona foi submetida à dupla afetação) e Parna do Monte Roraima, com 117.000 ha). E ainda 100.000 ha da Reserva Ecológica de Apiacás e 117.000 ha do Parque Estadual Igarapés do Juruena, incluídos no Parna Juruena. Maria Tereza ainda se refere ao Parna Monte Pascoal, que não perdeu área nenhuma nesse Governo. Aceitando a discutível tese da dupla afetação, isso representaria 711.000 ha a menos nas contas do Governo.

Mas, como lembra Maria Tereza, “para sermos bem honestos, outros dois Parques Nacionais sofreram ampliação neste governo: O Parque Nacional Grande Sertão Veredas e o da Amazônia.” “Assim,” conclui generosamente “fica mais ou menos elas por elas.” Por que, Maria Tereza, “para sermos bem honestos”? Honestidade não é favor, é obrigação, e é o mínimo que se espera de uma pessoa com a sua biografia. Mas faz sentido. Com certeza é o reflexo de uma consciência pesada, porque se tem uma coisa que Maria Tereza não tem sido nas suas críticas ao Governo, em particular à Ministra Marina Silva, é honesta.

Marcos Sá Corrêa contou, aqui mesmo em O Eco, um pouco da história da criação do mencionado Parque Nacional Grande Sertão Veredas: “criá-lo foi uma luta histórica, como as de Riobaldo Tatarana. Entre valentias e negaças, levou pelo menos três anos até o primeiro decreto. Foi obra do governo, mas trabalho de ONG. A Funatura, ou Fundação Pró-Natureza, teve que providenciar seus argumentos, sua localização e até suas verbas, tiradas de um projeto então inédito de conversão da dívida externa em investimentos ambientais. Foi dela também a iniciativa de batizá-lo com um título de obra literária. Na ocasião, presidia a Funatura a engenheira agrônoma Maria Tereza Pádua.”

Justa homenagem a Maria Tereza. Ela, mais do que ninguém, sabe o esforço que foi necessário para criar a unidade. Vale lembrar que a Funatura faz hoje um excelente trabalho de apoio à gestão do Parque, em parceria com o Ibama.

O Parna Grande Sertão Veredas foi criado em 1989, com 84.000 ha. Quinze anos depois, enfrentando a ferrenha oposição do Governador da Bahia, Paulo Souto, Marina conseguiu anexar ao Parque nada menos do que 146.000 ha, quase triplicando sua área original. Não me lembro de ter lido uma única palavra de Maria Tereza sobre o assunto.

Mas o Marcos Sá Corrêa não deixou passar em branco. Observou que “o pouco que sobrou dos Gerais está mais ou menos guardado, como relíquia, num parque nacional que mal saiu do papel, nasceu com 84 mil hectares e em 2004 chegou aos 230 mil hectares atuais a duras penas.”

Estaria o Marcos reconhecendo o trabalho do Governo? Doce ilusão. Com a habilidade que o distingue, consegue usar uma notícia como essa para acusar o Governo de falta de compromisso com a causa ambiental e corrupção. Diz ele: “Sua expansão quase se perde para sempre dois anos atrás na Casa Civil do ministro José Dirceu, que andava ocupado demais administrando o mensalão para pensar nesse tipo de bobagens.” É de tirar o chapéu. Como se vê, a criação do Parque, com 84.000 ha, em 1989, foi obra do governo mas trabalho de ONG. Sua ampliação para 230.000 ha, em 2004, foi obra do Espírito Santo. E nesse passo, vamos em frente.

Voltemos aos números. Para sermos bem honestos, além de computarmos nas contas do Governo a ampliação do Parna Grande Sertão Veredas (147.000 ha) e do Parna da Amazônia (167.000 ha), devemos computar também a estratégica ampliação da Rebio do Jaru (60.000 ha), do Parna de Brasília (12.000 ha), da Esec Mico Leão Preto (1.171 ha) e do Parna da Tijuca (735 ha). Total: 388.000 ha. Fazendo as contas: 388.000 menos 711.000 igual a 323.000 a menos nas contas do Governo. 7.824.000 menos 323.000 igual a 7.501.000 ha de novas unidades de proteção integral.

Na seqüência, Maria Tereza apresenta os números referentes à criação das unidades de uso sustentável (Florestas Nacionais, Reservas Extrativistas, Áreas de Proteção Ambiental) e, à guisa de síntese, diz o seguinte: “Lula criou mais de 7 milhões de hectares [de UCs de proteção integral] e já subtraiu cerca de 1 milhão de hectares.” Como assim, 1 milhão de hectares? Maria Tereza não disse que, “para sermos bem honestos”, as ampliações compensavam as “reduções”? Na seqüência, diz que “das unidades de conservação de uso direto [uso sustentável] dos recursos naturais este governo criou 12 milhões de hectares.” Como assim, 12 milhões, se a tabela que ela mesma apresenta no artigo indica, para ser exato, 9.911.883 ha? Explica-se: muito provavelmente, Maria Tereza somou duas vezes a área da APA do Tapajós. Um pequeno erro de apenas 2 milhões de hectares. Coincidentemente, Maria Tereza só erra em favor do seu argumento. E que argumento é esse?

Com base nesses números, ela afirma que “Este governo tem privilegiado o estabelecimento de unidades de conservação de uso direto dos recursos naturais ou de “uso sustentável”, ou seja, aquelas que podem ser exploradas, como são os casos das Florestas Nacionais e das Reservas Extrativistas.” E vai insistindo nessa tese ao longo do texto: “se esmerou muito mais”, “favoritismo excessivo”.

Ora, o Governo Lula criou, até agora, em números atualizados, 8,74 milhões de hectares de unidades de proteção integral. O Governo FHC, em oito anos, criou 7,46 milhões de hectares. Sarney criou 3,23 milhões. Nos 14 anos em que Maria Tereza esteve à frente da diretoria de Parques do IBDF, foram criados 10 Parnas e 6 Rebios, somando 9 milhões de hectares. Um resultado fabuloso, sem dúvida. Mas se o Governo, no tempo de Maria Tereza, tivesse criado UCs no ritmo do Governo atual, nesse mesmo prazo ela teria testemunhado a criação de mais de 25 milhões de hectares de Parques e Reservas. Um Governo que, em 3 anos e meio, cria, de fato ou proporcionalmente, duas vezes mais do que os seus antecessores, pode ser acusado de não dar a atenção devida às unidades de proteção integral? Se aceitássemos o raciocínio da Maria Tereza, isso significaria dizer que, se o Governo só tivesse criado 8,74 milhões de UCs de proteção integral e nenhuma de uso sustentável, o País, sob o ponto de vista da conservação, estaria em uma situação muito melhor. Tese absurda, evidentemente, mas, quem sabe, não estaríamos sendo aplaudidos por Maria Tereza?

Vamos agora comparar os dados referentes às unidades de uso sustentável: o atual Governo criou, em números atualizados, 11,12 milhões de hectares de UCs de uso sustentável, ou 56% do total das UCs criadas no período. FHC criou 11,95 milhões de hectares de UCs de uso sustentável, ou 61% do total das UCs criadas no seu governo. Sarney criou 6,12 milhões de hectares de UCs de uso sustentável, ou 66% do total das UCs por ele criadas. Não é interessante? Por que será que FHC e Sarney também tinham preferência, um pouco maior, inclusive, pelas UCs de uso sustentável? Em resumo, para encurtar a conversa, a afirmação de que é política do Governo atual ou da Ministra Marina privilegiar as UCs de uso sustentável em detrimento das UCs de proteção integral é pura besteira.

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