Na Cordilheira Real, nos andes equatorianos, está uma superfície de 42 mil hectares que conecta o Parque Nacional Llanganates ao Parque Nacional Sangay, ambos considerados hotspots de biodiversidade. A alta concentração de espécies na região e a importância de manter a conexão entre os dois parques, em 2001, levou a criação do corredor ecológico chamado Llanganates-Sangay, o primeiro com reconhecimento do governo.
O Corredor Ecológico Llanganates-Sangay começa nos frios páramos (ecossistema andino, entre 2.800 e 4.000 metros de altitude,composto de arbusto e gramíneas), a 3.852 metros de altitude, se estende por vastas montanhas coloridas em cor de café e amarelo, e continua descendo por uma paisagem misturada de lagoas, páramos e rios, até os 958 metros. Desde o começo tudo é água. Estreitos caminhos de pedra e terra permitem adentrar essa região de montanhas, pântanos andinos e belas paisagens.
A 1.200 metros de altitude surge a beleza de lagoas escondidas na neblina e a paisagem verdeja. Seguindo as águas do rio Ana Tenório, no Parque Llanganates, os páramos se convertem em florestas com árvores de até 8 metros.
Os Parque Llanganates (219 mil hectares) e o Parque Sangay (502 mil há) não são contíguos, mas conectados por remanescentes de bosques.
A degradação da vegetação nativa e, portanto, a perda de fauna em regiões como esta, costuma ser causada pela intervenção do homem. Em áreas próximas a lugares com alta biodiversidade é comum encontrar fragmentos de floresta primária entre pastagens, áreas cultivadas, assentamentos humanos e infraestrutura como estradas e hidrelétricas.
Dificuldades legais
A Lei para a Conservação e Uso Sustentável da Biodiversidade reconhece os corredores biológicos como áreas de manejo especial. Porém, a lei florestal vigente no Equador não reconhece a figura de corredor e, por isso, não pode haver restrições ao uso da área.
“A gestão dos corredores está relacionada com acordos sociais e é essencial que o planejamento desta conectividade seja levado aos planos de ordenamento territorial, diz Veronica Quitigüiña, técnica do Ministério do Ambiente. “Só então, poderemos dizer que o corredor é sustentável ao longo do tempo”. Isso implica, continua Quitigüiña, na manutenção de áreas protegidas, a recuperação de áreas degradadas e a redução da pressão humana através de iniciativas produtivas que sejam sustentáveis.
O Corredor Ecológico Llanganates-Sangay é área protegida municipal e, por isso, o compromisso das partes locais é indispensável, já que elas são responsáveis pelo manejo. No caso, a gestão é responsabilidade dos municípios de Banhos, Mera e Palora, em coordenação com o Ministério do Ambiente.
Este corredor protege a biodiversidade e as fontes de água que lá existem. A fauna local pode trafegar entre os dois parques nacionais, um fator que ajuda na saúde e sobrevivência dessas populações. Além disso, abriga uma paisagem natural única que fomenta o turismo e gera renda aos habitantes da região.
Dentro dos 42.052 hectares do corredor existe uma variedade de ecossistemas, que vão desde o sopé de montanha até o páramo, passando por florestas nubladas e tropicais. “Essas manchas de floresta permitem a recuperação de áreas degradadas que também são parte do corredor, e a regeneração desta cobertura vegetal contribui para melhorar a conectividade”, diz Jorge Rivas, da World Wildlife Fund (WWF). Desde maio de 2013, a WWF trabalha com o Ministério de Ambiente do Equador (MAE), no programa Sócio Bosque, que dá incentivos econômicos a camponeses e comunidades indígenas que se comprometam a conservar e proteger suas florestas nativas e os páramos.
Restauração de áreas degradadas
O projeto da WWF e do Ministério do Ambiente busca incentivar a recuperação de zonas degradadas dentro do Corredor Ecológico Llanganates-Sangay através de atividades de restauração executadas pelos proprietários de terra, famílias indígenas das etnias kichwa e shuar, e pelos Governos Autônomos Descentralizados (equivalentes a municípios) que têm autonomia política, administrativa e financeira.
A intervenção no corredor propõe dois tipos de restauração florestal. O primeiro tipo é passivo, através da demarcação de zonas para a restauração natural. O segundo é ativo e está ligado ao reflorestamento, quando em viveiros são produzidas espécies nativas e logo plantadas “ao redor de fontes de água se o objetivo é recuperar bacias; em pastagens para formar sistemas silvipastoris (grama sob plantações de árvores, o que gera melhor qualidade de leite e torna a pecuária menos extensiva), ou no meio de plantações para formar sistemas agroflorestais (cultivos que combinam elementos agrícolas e florestais, dando um uso mais eficiente a terra). Tudo depende das necessidades e condições do lugar”, explica Rafael Yunda, coordenador do projeto.
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Este tipo de ações gerará adaptações dos sistemas naturais e humanos na área de maneira a prestar serviços ambientais e a gerar renda para os agricultores, afirma Yunda.
O objetivo ao final do projeto, dentro de 18 meses, é trabalhar pelo menos com 60 agricultores e cultivar 22 mil plantas nativas como o freijó, cedro-cheiroso, ipê-amarelo e bambu. Atualmente, de acordo com Yunda, a WWF assessora as partes interessadas para que definam as áreas de conservação e restauração dentro de suas propriedades e apresentem um plano de ação ao Programa Sócio Bosque.
Em 2012 foi acrescentado o componente de restauração, gerido pela Direção Nacional Florestal, que doa recursos a indivíduos ou grupos interessados em implementar uma restauração ativa dentro do Corredor Ecológico Llanganates-Sangay.
“É boa a ideia de restaurar a região, mas é importante pensar em médio e longo prazo”, diz Xavier Viteri, coordenador do projeto do Corredor Ecológico até 2006. Ele defende que é preciso uma restauração que conviva com o turismo racional e as produções locais, para que o processo gera renda para a população. Uma das propostas é difundir práticas agroecológicas, condizentes com a conservação e proteção dos recursos naturais.
Um corredor de biodiversidade
A criação do Corredor Ecológico Llanganates-Sangay começou no ano 2000 quando o projeto Ecorregiões dos Andes do Norte, da WWF, identificou espaços de alta biodiversidade. Ao analisar-se o mapa de cobertura vegetal do Equador, diz Xavier Viteri, detectou-se um espaço de vegetação entre os parques Llanganates e Sangay que os mantinha unidos, apesar da área ser dividida pela estrada que une as cidades de Banhos e Puyo.
Desde 2001, a Fundação Natura realizou estudos científicos para determinar se esta conexão natural facilitava a mobilidade de espécies ameaçadas, e para definir a localização geográfica, o desenho e o tamanho do corredor. Além disso, foram feitas coletas de campo para investigar a fauna local e entender a riqueza biológica da região, e para identificar quais áreas do corredor tinham semelhanças com os Andes e quais com as terras baixas.
De acordo como os dados de Lou Jost, botânico dedicado a estudar a área por mais de 15 anos, o corredor é habitado por 101 espécies de mamíferos e 242 espécies de aves (cinco delas são de categoria restrita compartilhadas com a Colômbia e Peru, e outras cinco são endêmicas para os Andes Orientais do Equador e do Peru). Também são encontradas 195 espécies de plantas, endêmicas nas margens do rio Pastaza, e 91 orquídeas que não existem em nenhuma outra parte do país, o que revela a riqueza biológica desta área, única por sua localização, geografia e relevo.
Há 13 mil pessoas que habitam a região do corredor Llanganates-Sangay, e o seu desenvolvimento tem ocorrido em harmonia com essa população. A receptividade da comunidade, acredita Viteri, começou com o prêmio “Presente para a Terra” que a WWF concedeu ao Corredor Ecológico Llanganates-Sangay em 2002. O prêmio reconhece o sucesso na conservação de áreas naturais de alta biodiversidade. “Depois do reconhecimento, as pessoas se preocuparam mais por manter esses espaços naturais”, diz Viteri.
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