A ministra da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), Tereza Cristina, se manifestou publicamente contra à moratória da soja. É a segunda vez em menos de uma semana que representantes do governo criticam o acordo firmado em 2006 em que produtores se comprometeram a não comercializar nem financiar soja produzida em áreas que foram desmatadas na Amazônia.
“Eu acho que a moratória da soja é um assunto privado, na qual eu acho um absurdo. Nós temos como mostrar onde a nossa soja é produzida e se pode ser cultivada naquele local. O Brasil tem hoje o código florestal que é uma das leis mais rigorosas do mundo, em que o empresário rural precisa manter de 20% a 80% da sua propriedade na vegetação original”, comentou Tereza Cristina na terça (12), durante o AgroBit Brasil 2019, realizado no Paraná.
A declaração da ministra ocorre no momento em que há uma pressão para a derrubada da moratória. Recentemente, a Associação Brasileira dos Produtores de Soja (Aprosoja) ameaçou entrar com uma reclamação no Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), acusando a Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais de promover reserva de mercado.
A moratória da soja tem 13 anos de existência e é uma das últimas políticas com resultados para o controle do desmatamento. Em 2006, duas entidades representativas dos produtores, a Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (ABIOVE) e a Associação Brasileira dos Exportadores de Cereais (ANEC) se comprometeram a não comercializar nem financiar nenhuma soja originária de áreas que sejam originadas de desmatamento, no bioma amazônico.
“Muito preocupante o ataque do MAPA e de parte do Agro aos acordos de mercado e ao zoneamento da cana. Processar a ABIOVE por querer comprar soja sem desmatamento é o mesmo que perseguir consumidores que preferem orgânicos. Em um mercado competitivo “o cliente tem sempre razão”, Aprosoja e a Unica [União da Indústria de Cana-de-Açúcar, que apoiou o fim do zoneamento da cana-de-açúcar] dobraram a aposta na irrelevância da demanda Europeia e na insensibilidade ambiental da China e outros países emergentes. Pode ser que de fato a China et al continuem aumentando as importações e que passem a sugar grande parte do etanol brasileiro também. E se isso não acontecer? E se a China, agora também presidente da FAO [Organização das Nações Unidas para Alimentação e a Agricultura], se alinhar com a União Europeia para pressionar e baratear as commodities deles?”,questiona o pesquisador Raoni Rajão, da Universidade Federal de Minas Gerais.
Procurado pelo ((o))eco, a ABIOVE disse que não vai comentar as declarações da ministra Tereza Cristina. A reportagem também entrou com contato com a Associação Brasileira dos Exportadores de Cereais (ANEC), mas até o encerramento da matéria não houve retorno.
Em 2016, no aniversário de seus 10 anos, a moratória foi renovada por tempo indeterminado. A renovação envolveu a Abiove e Anec (empresas associadas), a sociedade civil (Greenpeace, Imaflora, Ipam, TNC e WWF-Brasil) e o governo (Ministério do Meio Ambiente e Banco do Brasil) para um pacto de desmatamento zero.
No mesmo ano, o então ministro do Meio Ambiente, Sarney Filho, propôs que a moratória se estendesse para o Cerrado, onde o plantio da cultura é considerado um dos principais vetores do aumento do desmatamento na região, mas a proposta não foi para frente.
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A pergunta: Querem água ou querem soja. Depois não adianta choramigar.