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Desculpa ambiental

MST e Incra andam de mãos dadas quando o assunto são danos ao meio ambiente. Tanto vandalismo não condiz com o anunciado compromisso diante da natureza.

14 de março de 2006 · 19 anos atrás
  • Maria Tereza Jorge Pádua

    Engenheira agrônoma, membro do Conselho da Associação O Eco, membro do Conselho da Fundação Grupo Boticário de Proteção à Nat...

Não dava para acreditar no que eu via e ouvia na televisão. Continuando com as conversões notórias ao ambientalismo radical, essas que fizeram famoso o Greenpeace duas décadas atrás, o líder do MST superou o padre do rio São Francisco na defesa do meio ambiente. Acreditando ou não, assim foi como vimos o senhor Stédile justificar a ordem de enviar suas combatentes, ou o braço feminino do MST, para invadir e destruir uma área de produção de mudas de eucalipto e um laboratório de pesquisas. Conversão miraculosa em verdade, mas, muito, muito suspeita.

Tão suspeita é a conversão de Stédile para o ambientalismo (ou para o sócio-ambientalismo?). Sem entrar ainda no cerne do assunto, basta lembrar que se não fosse pelo eucalipto, milhares de camponeses pobres e seus filhos continuariam destruindo matas nativas e produzindo carvão em condições infra-humanas, quase como escravos. Muitos deles agora são empregados bem pagos e bem tratados nas grandes empresas de reflorestamento, que permitem substituir com eucalipto e com trato digno as necessidades de carvão vegetal para produzir ferro-gusa. Mas, esse pequeno detalhe fugiu da mente ágil do líder dessa e de outras invasões que, de outra parte, tira muito da sua munição de canhão precisamente desses miseráveis rurais.

Para concluir com o eucalipto, uma vítima predileta dos sócio-ambientalistas e dos ignorantes, deve-se lembrar que o seu cultivo abarca menos que 0,7% da superfície do país e apenas 1,6% da área rural privada, embora produza 70% da madeira industrial do país. De outra parte – como já foi explicado muitas vezes, inclusive neste mesmo meio de comunicação – essa árvore não é ambientalmente pior que qualquer outro cultivo. Certamente é muito menos prejudicial que a soja e a cana-de-açúcar.

MST e Incra no mesmo saco

Já se escutou o senhor Stédile falar contra os transgênicos, mas nada falou, até agora, dos impactos ambientais dos cultivos em grande escala e, menos ainda, se escutou alguma palavra dele sobre o desmatamento da Amazônia e da Mata Atlântica. Muito pelo contrário, as invasões e muitos dos assentamentos vêm produzindo enérgica destruição de matas nativas, mesmo nas reservas legais previstas por lei e nas áreas de preservação permanente, com a maior sem cerimônia.

Até mesmo no entorno de parques nacionais e na sua área de amortecimento, os assentados estão destruindo tudo. Um exemplo é o Parque Nacional da Serra da Capivara, no Piauí, fato esse tantas vezes denunciado pela grande batalhadora Niéde Guidon, da Fundação Homem Americano. Quem apoiou a invasão do Parque Nacional do Iguaçu, na antiga estrada de terra Capanema a Medianeira, provocando destruição de enormes árvores e demais vegetação daquela unidade de conservação que é um dos últimos redutos protegidos no estado do Paraná? Quem destruiu Mata Atlântica na estrada que une Ilhéus a Itacaré e também invadiu áreas do Parque Estadual da Serra do Conduru? Mais recentemente este mesmo meio de comunicação vem denunciando os fatos promovidos pelo MST no entorno do Parque Nacional da Serra da Bodoquena e em muitos outros. Os danos do MST para o meio ambiente são tão grandes como os de seu aliado íntimo, o Incra, como outro artigo recente de O Eco se encarregou de demonstrar, sem deixar resquício de dúvida.

Não! O MST não engana ninguém. A sua nova camisa verde é como a finíssima roupagem do rei da fábula. É tão transparente que ele nem sabe que, na verdade, está nu. O MST, na forma que vem sendo conduzido, é um inimigo mortal do meio ambiente no Brasil. Nada difere nisso de outros movimentos aparentemente camponeses da América Latina, como o MRTA da Colômbia, que destrói oleodutos e provoca contaminação impactando pobres rurais, ou como o Sendero Luminoso do Peru, cuja ação mais notória foi destruir a sede do programa vicunha e aniquilar esses animais em processo de extinção. Quiçá o MST decida proximamente atacar o Projeto Tamar, acusando-o de pró–imperialista?

Se o neo-ambientalista Stédile quer fazer um favor aos pobres do meio rural, tem muitas opções para isso. Poderia evitar que seus sequazes escolham sistematicamente as matas ciliares para se concentrar antes de lançar suas invasões. Poderia ordenar às suas hostes que respeitem as matas, em especial as que protegem bacias hidrográficas. Poderia deixar de chamar “terra improdutiva” a terra que está lá para proteger a natureza. Poderia pedir a seu cúmplice governamental que faça uma avaliação de impacto ambiental do Programa do Biodiesel que, obviamente, será de maior impacto negativo que o eucalipto. Poderia deixar de pretender invadir unidades de conservação ou suas zonas de amortecimento. Poderia fazer tantas coisas boas para o entorno natural e para sua gente, se realmente fosse honesto consigo mesmo! Mas, pelo menos, ele e sua turma deveriam simplesmente respeitar a lei, a mesma que os outros brasileiros têm de respeitar.

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