Análises
Lições dos transgênicos
De Camila V. de Andrade L. Prezado Prof. Paulo Bessa,Dirijo-me à V. Exa. como um discípulo o faz ao seu mestre, por muito estudar suas conceituadas lições acerca do Direito Ambiental. Sou estudante de Direito e pesquisadora (ainda que as pesquisas das Instituições particulares sejam um tanto quanto incipientes) da efetividade da Ação Civil Pública como garantia dos Direitos Ambientais. Momento em que tive a oportunidade de ter o primeiro contato com os escritos do ilustre professor.Fazendo uma visita ao site O eco - o qual aproveito para parabenizar os editores pela brilhante iniciativa - deparei-me com um artigo do ilustre professor que me incomodou. No artigo Lições Gaúchas, no qual expõe a luta dos produtores de soja transgênicas no Sul, concordo que lições temos a aprender com os sulistas, sobretudo quanto à forma pacífica e ordeira de conduzir a situação da soja. No entanto no referido artigo, o professor debate o princípio da precaução sob uma ótica que discordo.Também discordo de resistências ativistas não fundamentadas, mas não entendo a invocação do princípio mencionado como ausência de fundamentação. Entendo que nós seres humanos temos uma dificuldade sobrenatural de lidar com aquilo que não dominamos, e está aí um dos principais obstáculos do Direito Ambiental, pois "pagaremos para ver". E, se princípios emanassem de análises fáticas não seriam princípios e sim constatações, no qual peço data venia para reportar-me à uma citação do i. profº Miguel Reale, que diz: "A civilização tem isto de terrível: o poder indiscriminado do homem abafando os valores da natureza.Se antes recorríamos a esta para dar uma base estável ao Direito (e, no fundo, essa é a razão do Direito Natural), assistimos, hoje, a uma trágica inversão, sendo o homem obrigado a recorrer ao Direito para salvar a natureza que morre" e porque não recorrermos exatamente ao Direito Natural para nos orientar quanto à efetividade de normas dogmáticas para socorrermos o Direito à vida? E, em especial quanto ao princípio da precaução, jamais poderíamos imaginar que o corte de uma árvore, ou milhares (para soar menos radical) interfeririam na sincronia dos ciclos de criaturas interdependentes, refletindo indiretamente no nosso modo de vida. Passamos anos sem ter conhecimento de tal fato, e se hoje o temos não é porque o dano ambiental já nos incomoda diretamente, mas sim por que o pensamento preservacionista evoluiu e muito.Sabemos que não estamos falando de fatos previsíveis, e sim de não sabermos a dimensão do nevoeiro nem tão pouco a gravidade da doença, mas, muito mais relevante do que isso, estamos falando da extensão das consequências imprevisíveis para além, e muito além, da culpabilidade do causador.Até porque se possibilidade houvesse de sabermos que o nevoeiro permitiria um grau de visibilidade trafegável, permitindo-nos a cautela, estaríamos diante do princípio da Prevenção. Outro princípio informador do Direito Ambiental, que difere epistemologicamente do primeiro. Não acha?Talvez o princípio da Precaução deveria ser informado pela máxima Shakespeariana na qual há mais coisas entre o céu e a terra do que julga nossa vã filosofia.Entendo o princípio da precaução como um marco para o Direito Ambiental. Sem pretender entendê-lo como um freio para o desenvolvimento, sua interpretaçãodeve ir para além de regras hermenêuticas e adentrar princípios informadores do Direito Natural.Perdoe tamanha audácia.Reitero votos da mais elevada estima e distinta consideração, na ansiedadedeler novamente sua coluna.Um grande abraço