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Publicado originalmente por Observatório do Clima
O ministro Ricardo Salles (Meio Ambiente) tem repetido que o Brasil está avançando a passos largos para cumprir seus compromissos internacionais em mudanças climáticas. Uma estimativa feita pelo OC com base nos dados do SEEG (Sistema de Estimativas de Emissões de Gases de Efeito Estufa) mostra que o cenário é outro: o país não deverá cumprir nem mesmo a generosa meta que se impôs para 2020 na Política Nacional sobre Mudança do Clima. E não tem nem mesmo os instrumentos de governança para cumprir com o que se comprometeu para 2025 no Acordo de Paris.
Segundo o cálculo apresentado numa nota explicativa do OC, na melhor das hipóteses o Brasil terminaria 2020 com emissões de carbono 2,3% maiores do que o compromisso menos ambicioso da política nacional, e 7% superiores ao compromisso mais ambicioso.
Esses números, porém, são conservadores: eles se baseiam em projeções feitas com base nas emissões de 2017. Estas desconsideram o aumento de 8,5% no desmatamento da Amazônia em 2018, que deve elevar as emissões, e a explosão ainda não computada da devastação em 2019, que afastará o país definitivamente do cumprimento da lei, salvo em caso de milagre. Em novembro, o OC lançará a edição 7 do SEEG com as estimativas atualizadas das emissões em 2018, que permitirão estimar com maior precisão enquanto a meta deverá ser perdida.
A Política Nacional sobre Mudança do Clima, de 2009, tornou lei um compromisso voluntário assumido pelo Brasil naquele mesmo ano, na conferência do clima de Copenhague, de chegar a 2020 com uma redução suas emissões em 36,1% a 38,9% em relação ao que emitiria se nada fosse feito.
Embora na época isso tenha sido um passo importante – era a primeira vez que um país emergente admitia compromissos de redução de emissões, o que tirava a desculpa dos Estados Unidos para não adotar nenhuma meta –, o cenário tendencial no qual a redução brasileira se baseava era completamente fictício. O governo brasileiro assumia que, entre 2009 e 2020, o PIB nacional cresceria 5% ao ano (pode rir, a piada é essa) e que toda a demanda adicional por energia seria suprida por combustíveis fósseis (uma virtual impossibilidade no país da cana e da energia hidrelétrica).
A projeção resultante dessas premissas era uma emissão de 3,236 bilhões de toneladas de CO2 equivalente em 2020. O esforço nacional, sacramentado em 2010 num decreto que regulamentou a política, seria de chegar a 2020 emitindo qualquer coisa entre 2,068 bilhões de toneladas (36,1% de redução) e 1,977 bilhão de toneladas (38,9% de redução). O decreto também criava metas setoriais – entre elas a de reduzir em 80% a taxa de desmatamento na Amazônia em relação à média de 1996 a 2025, o que significava chegar a 2020 com 3.925 km2 de perda de floresta.
Em 2017, segundo o SEEG, o Brasil emitia 2,071 bilhões de toneladas brutas de CO2 equivalente. Projetando para 2020 o comportamento das emissões naquele ano, chegaríamos ao final do ano que vem emitindo 47 milhões de toneladas a mais do que o limite inferior (36,1%) do intervalo e 138 milhões de toneladas a mais do que o limite superior.
A meta de desmatamento da Amazônia só deverá ser cumprida em circunstâncias muito extraordinárias – e inéditas: com 7.536 km2 desmatados em 2018, o país estava 92% acima da meta. Nunca desde o início das medições houve uma redução da taxa à metade de um ano para o outro. E, neste ano, a crer no indicado pelo sistema Deter, do Inpe, que produz alertas de desmatamento, a taxa oficial será muito maior do que a do ano passado: a área de alertas cresceu 50% em 2019.
Em pelo menos uma reunião que teve nos EUA na semana do dia 20, antes de embarcar para a Europa, Salles disse que o Brasil estava no caminho de cumprir suas metas no Acordo de Paris – citou, por exemplo, a produção de etanol e a matriz energética com alta proporção de renováveis. O governo também tem afirmado que o país já cumpriu grade parte da restauração florestal proposta no documento anexo da NDC (a meta brasileira) e dois terços da restauração de pastagens proposta no mesmo documento.
Como a nota do OC explica, o país nem sequer apresentou um plano para implementar a NDC a partir de 2020. Ao contrário, as instituições do governo federal que deveriam elaborar e implementar esse plano foram extintas por Jair Bolsonaro e ninguém está cuidando disso hoje. Também parado está o Plano Nacional de Adaptação à mudança do clima, que é parte integral da meta brasileira em Paris. Ao deixar de cumprir as metas da lei de clima para 2020, o Brasil deve entrar endividado no período de cumprimento do Acordo de Paris, o que tornará a NDC mais cara e difícil de cumprir.
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