“Cadê o rio que estava aqui?” Se ainda estivesse vivo, talvez o poeta mineiro Carlos Drummond de Andrade (1902-1987) incluiria, entristecido, essa frase em um de seus poemas. O motivo está estampado em capas de jornais de todo o país: a tragédia que há três meses assolou a Mata Atlântica mineira, cuja beleza ele tanto homenageou em suas poesias e que sofre a perda de um de seus principais rios na maior tragédia ambiental do país.
De repente, não mais que de repente, a história do Rio Doce tornou-se um pouco amarga para todos aqueles que dele dependem, assim como para todos nós brasileiros, que admiramos sua beleza. No cenário, o que antes pareceria impossível, tornou-se uma dura realidade: peixes mortos pelo caminho, mau cheiro, matas ciliares devastadas e a fauna, que era composta por diversas espécies, deram lugar para rejeitos minerais tóxicos.
Você já imaginou o que aconteceria se as águas de um importante rio de sua cidade simplesmente não pudessem mais ser utilizadas? E como reagiria se a sua cidade tivesse a paisagem drasticamente transformada?
Milhares de brasileiros por onde passa o Rio doce ainda estão procurando essas respostas: de onde tiraremos água para beber? E quem vive da pesca, fará o que a partir de agora? Será possível voltar a tirar da terra o sustento que a lama levou? As espécies atingidas pela lama desapareceram para sempre? O meio ambiente vai se recuperar?
“A natureza não sabe fazer perguntas como nós, mas tem respostas claras e diretas para o que fazemos com ela”
São questionamentos difíceis que surgem para se somar a tantos outros agora presentes na vida dos moradores das comunidades atingidas. Além das memórias apagadas, do nada, não será mais possível viver nos locais atingidos. Não é uma tarefa fácil se questionar como se reconstruirá uma cidade, com tudo que há de vivo nela. A rotina de seus ex-moradores não será mais a mesma, nem seus lares, nem seus trabalhos, nem suas vidas. E agora?
A natureza não sabe fazer perguntas como nós, mas tem respostas claras e diretas para o que fazemos com ela. Ainda não é possível saber ao certo o que acontecerá ao longo dos mais de 500 km de rio atingidos pela lama de rejeitos químicos provenientes de mineração. Também não sabemos como iremos devolver às pessoas seus estilos de vida na região. Porém, o aviso automático do meio ambiente até agora foi triste, mas claro: o Rio Doce, hoje, está morto. As áreas próximas atingidas também.
Sabe aquela sensação de oportunidade perdida que vez ou outra temos na vida? Talvez seja esse o sentimento mais adequado a todos nós brasileiros agora. Não soubemos aproveitar o rio e também não fomos capazes de cuidar dele.
O Rio Doce, agora, só sobrevive na memória de quem o conheceu e nos poemas e canções que ele inspirou. No ano que vem, as águas de março vão fechar o verão um pouquinho mais tristes no Brasil, que viu uma enxurrada levar uma de suas inúmeras comunidades.
Como dizia o pacifista Mahatma Gandhi, “se queremos progredir, não devemos repetir a história, mas fazer uma história nova”. Então, fica um convite a você: a água já fez muito pela humanidade, que tal descobrir o que cada um de nós pode fazer por ela?
*Malu Nunes é Diretora-executiva da Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza
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Interessante é que uma das maiores cidade à beira do rio Doce já está tratando a água dele há um bom tempo. Outra coisa, porque nunca teve essa comoção com a poluição do rio por esgoto, desmatamento das margens, pesca desenfreada, etc? Deve ser indignação seletiva, muito comum esses dias…
Nunca houve? Acho que você não acompanha o site, não é possível. Sobre o tratamento, trabalhei por muito tempo com análise e tratamento de afluentes e efluentes, tanto industriais quanto domésticos. O processo é custoso e de difícil processamento, tendo em vista a tabela periódica que foi lançada nas águas do Rio (até Arsênico já foi relatado nas análises mais recentes). Os metais pesados, bioacumuladores tacanhos, não chegarão diretamente apenas a nós: os veios subterrâneos que se conectam ao Rio propriamente também serão contaminados, o solo (já soterrado) também. Toda essa toxicidade passará pelos níveis tróficos, amigo. Portanto, não vamos minimizar um desastre que ainda é imensurável.
PS: Isso porque não falei nada sobre a chegada da lama ao mar, o conector mundial… ou seja, só comentei da ponta do iceberg (de lama).
Não estou minimizando. Só constatando uma informação que foi dita no texto que não bate com a realidade. Mas se vc falou, tá falado! E como vc usou o "argumento autoridade" tenho que confiar na sua informação. Obrigado, ambientalista!
Uma tréplica recheada de espantalhos e ironia. E sim, seu primeiro comentário foi minimizador, e não compactua com a verdade, pois o portal sempre denunciou qualquer que fosse a agressão ao meio ambiente, basta acompanhá-lo. Mas então… você nega (ou questiona, no mínimo) a dificuldade de abastecimento das comunidades ribeirinhas. E duvida da dificuldade do tratamento de águas residuais tão carregadas. Ok, não vou me alongar aqui… mas sugiro que dê uma rápida pesquisa nos dois assuntos, já que não confia na minha informação não fundamentada.
E só um adendo: ambientalista, ao contrário do que sua conotação irônica indica, não é uma alcunha dada a técnicos apenas. Qualquer um que se preocupe com nosso verde, seja ele dotado de conhecimento técnico na área ou não, e reconheça a importância de sua preservação para o bem estar geral, pode se denominar um "ambientalista". Então, de nada!
Vamos lá, então… Não disse que o Eco não fala sobre esses problemas, disse que a proporção de notícias quando é um desastre (em qualquer site) é muito maior do que as "pequenas tragédias" como poluição e desmatamento. Inclusive, como são fatos diluídos no tempo e nos locais, todo mundo acha que são coisas menores. E se quem polui não for empresas, tá liberado, né! Dessa forma, vão deixando pra lá.
Sobre o abastecimento de água, ele está sendo feito, e se estiver sendo mais caro, que a empresa arque com os custos então. Não dá é pra ficar um tom de lamento no texto como se as pessoas estivessem sem água ainda.
E ambientalista no Brasil é bem isso mesmo que vc falou. Qualquer um que se preocupe com a "causa". Só que vários desses que se preocupam, também pautam as coisas e escrevem o que dá na cabeça. Várias coisas que são ditas são achismos, mas como são ambientalistas, tá liberado.
Se as coisas fossem levadas mais a sério no Brasil, seria mais fácil debater com quem realmente importa. Mas vamos continuar assim, fazendo coisas irrelevantes e postando nas redes sociais, simplesmente para desencargo de consciência… "tô fazendo minha parte pelo meio ambiente".
Então, vamos lá, como queira.
(i) Uma citação ao seu primeiro comentário, como bem documentado aqui mesmo na página:
"Interessante é que uma das maiores cidade à beira do rio Doce já está tratando a água dele há um bom tempo."
Seu questionamento é evidente. A contemporização da tragédia (de magnitudes ainda desconhecidas e que tendem a uma grandeza sem precedentes) é demonstrada pelas suas próprias palavras. Mais uma vez, você continua insistindo numa afirmação que não faz sentido, pois Oeco é um portal de grande credibilidade e que sempre foi comprometido com denúncias a males ambientais, independentemente de sua origem e de seus causadores. Inclusive, este trecho "(…)E se quem polui não for empresas, tá liberado, né! Dessa forma, vão deixando pra lá." é extremamente incongruente para com a política do canal. Como disse anteriormente, mas você parece não querer fazer, basta uma navegação um pouco (bem pouco) mais demorada e aprofundada dentro do portal que você verá como o que digo tem sustentação.
(ii) "Sobre o abastecimento de água, ele está sendo feito, e se estiver sendo mais caro, que a empresa arque com os custos então. Não dá é pra ficar um tom de lamento no texto como se as pessoas estivessem sem água ainda."
Veja bem, inverossímil sua informação. Notícia que saiu hoje no último dia 15 (http://www.hojeemdia.com.br/horizontes/promotores-querem-que-processos-contra-a-samarco-voltem-a-tramitar-em-valadares-1.379245) possui o seguinte trecho: "O coordenador Regional das Promotorias de Justiça do Meio Ambiente da Bacia do Rio Doce, Leonardo Castro Maia, concorda. Ele lembra que existe muita lama retida ao longo do rio Doce, assim como incertezas com relação a qualidade da água e eventos que poderão ocorrer e piorar ainda mais o quadro. “Daí a necessidade de diminuir a vulnerabilidade das cidades dependentes de captação no rio Doce buscando novos mananciais”.".
Observe que o Rio Doce não é mais um manancial seguro. E outra, passo-lhe alguma bibliografia, caso queiras, sobre a dificuldade de se retirar, por exemplo, Chumbo de um manancial (ainda mais quando este teve uma ocorrência em concentração altíssima). A dificultação no abastecimento já é fato a se lamentar, e essas dificuldades permanecem até hoje, como fala sobre esta notícia: http://www.jb.com.br/pais/noticias/2016/02/18/pim…. Logo, não seja desonesto e negue a existência de um problema por conta de uma cidade que consegue fazer o tratamento (dificultado e muito menos otimizado do que o normal, não apenas mais caro, em seu processo), pois mesmo ela tem dificuldades nesse sentido.
(iii) Achismos… ok. Veja um achismo embasado: http://outraspalavras.net/alceucastilho/2015/11/1….
E a definição, amigo, não é tupiniquim. É a definição mundial para o sentido do que é ser um "ambientalista". Sobre a irrelevância de ações, bom, posso te dizer que minha única atividade relacionada ao Meio Ambiente não é comentar em um portal de biodiversidade. Não, não… leio as reportagens daqui porque acho um trabalho sério, e gosto de pontuar alguns comentários, vira e mexe. Mas enfim, sim, to fazendo minha parte pelo meio ambiente! Espero que todos estejamos.
Um abraço!
Então, se eu me "preocupo" em saber se meu troco na padaria veio certo….isso me torna um "economista"?