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O futuro sempre pode ser diferente

Fast Company, uma revista sobre negócios, traz a lista das 50 empresas que melhor apostam no futuro. A maioria bajula o meio ambiente. Nenhuma cita o álcool brasileiro.

14 de março de 2007 · 17 anos atrás
  • Marcos Sá Corrêa

    Jornalista e fotógrafo. Formou-se em História e escreve na revista Piauí e no jornal O Estado de S. Paulo. Foi editor de Veja...

Logo agora que o Brasil do presidente Lula está pronto para transformar o mundo com sua revolução verde movida a álcool – e patati-patatá, – aparece uma empresa americana, chamada GreenFuel, dizendo que tem um modo ainda mais prático e barato de fazer etanol.

A marca nasceu há seis anos. Está, portanto, aprendendo a engatinhar nesta nova era da cana, cujos engenhos já balançavam a economia internacional há cinco séculos, com o bafo dos canaviais ondulados pelas brisas dos trópicos, que tiraram o açúcar dos potes de farmácia para levá-lo à mesa. Mas parece que ela vem com tudo para cima do mercado.

Algas no ar

A GreenFuel é filha de um engenheiro do MIT que, na virada da década, procurava um modo de cultivar algas no ar, simplesmente porque elas digerem dióxido de carbono e expelem oxigênio. Ou seja, despoluem. Foram as algas, por sinal, que há uns 3,5 bilhões de anos geraram o que hoje chamamos de atmosfera terrestre. E, de quebra, o céu azul.

Com elas, fabrica-se um reator capaz de reduzir à metade as emissões de uma termelétrica convencional, a carvão. Mas o melhor é que as algas, ao consumir o dióxido de carbono, deixam de saldo uma sopa de matéria orgânica, no ponto para destilar etanol ou biodiesel. Das sobras de uma usina de mil megawatts, retiram-se por ano quase 400 milhões de litros de combustível, “fazendo o que a Mãe Natureza faz, só que bem mais rápido”, promete Cary Bullock, presidente da GreenFuel.

Ela consta de uma lista de 50 empresas e produtos que têm tudo para chegar mais cedo ao futuro, segundo a Fast Company, uma publicação americana dirigido ao tipo de empresário voraz que trabalha sem parar e descansa, nos fins-de-semana, disputando maratona. Neste momento, a revista sugere, como programa de lazer, “viagens filantrópicas”, inclusive um safari de luxo que, por diárias de mil e quinhentos dólares, organiza viagens ao Quênia com direito, nos horários de folga, a ensinar o bê-a-bá a crianças de aldeias africanas.

Vamos com calma. O jornalistas nem sempre acertam quando falam do passado recente. Mas sua especialidade é errar em notícias sobre o futuro. O computador pessoal, por exemplo, custou a chegar aos jornais. E, quando veio, foi recebido por uma reportagem do New York Times, explicando por que aquilo não iria pegar. Mas a seleção da Fast Company é, no mínimo, uma boa amostra do que o presente anda pensando desde já sobre o futuro. E isso quer dizer alguma coisa sobre o que vem pela frente.

A capa, para começo de conversa, é um close do governador Arnold Schwarzenegger, de olhar metálico e boca fechada, parecendo, mais do que nunca, o Exterminador do CO­2. Schwazenegger entrou ali por baixar a lei estadual das Soluções para o Aquecimento Global, que mandar derrubar a um quarto dos níveis de 1990 o fumacê dos automóveis na Califórnia.

Entre os apóstolos dos futuros negócios escolhidos pela revista, não poderiam faltar telefones celulares que pagam contas à distância, bancos populares que só existem na internet e até mosquitos geneticamente esterilizados pela inglesa Oxitec, para enganar as fêmeas com seu apetite sexual estritamente recreativo. Mas, nessas 50 chocadeiras de novidades tecnológicas para o consumo, o cacife das apostas no meio ambiente é para lá de majoritário.

A era da reciclagem

Nesse quesito, o freguês agora pode escolher como quer salvar o planeta. Vem aí um novo modelo de tênis Nike, o Soaker, preparado para a reciclagem e com 95% de toxinas a menos na borracha. Há uma cadeira giratória, a Think, sem PVC, CFC, VOC e outras siglas poluentes, cujo projeto se baseia em algorítimos para traduzir as idiossincrasias do cliente num móvel feito sob medida para sua consciência ecológica. A Shaw oferece um carpete de luxo inteiramente tecido com restos de carpetes velhos, o que se pode reproduzir ao infinito. A Invisible Heating usa uma rede de serpentinas debaixo de estradas num sistema de calefação cuja fonte é o sol no asfalto quente. A Döll/Envin emplacou uma grife internacional de “boates sustentáveis”, seja lá isso o que for.

E tem mais. A Ikea sueca anuncia a Boklok, uma casa toda pré-fabricada com madeiras de florestas libertadas do desmatamento. A Gerding Edlen Development especializou-se em “edifícios sustentáveis”, que funcionam com o mín imo de impacto ambiental. Ou melhor, produzem mais energia do que consomem e consomem mais resíduos do que produzem. A Native Energy implanta placas solares e digestores de metano em reservas indígenas. A Italcementi italiana pegou sua vaga no panteão do futuro com o TXActive, um concreto que, absorvendo ácidos nitríticos e outros gases poluentes, limpa os céus das cidades. E a General Electric apresenta a Zenon, membrana sintética que filtra água a ponto de tornar potável o esgoto de uma megalópole.

Chamaram a atenção da revista também iniciativas modestas, como a do grupo de Bangladesh que faz adubo com lixo e a de um fazendeiro que representa a última palavra americana em criação de galinhas caipiras. Estranhamente, o álcool brasileiro perdeu o bonde desta edição de Fast Company. Senão, pelo que se ouve ultimamente por aqui, na capa estaria Lula, em vez de Schwarzenegger.

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