Em 1978, a diretoria da petroleira EXXON tomou uma decisão que afetaria a minha, a sua e a vida de gerações depois das nossas. Um estudo encomendado por cientistas da própria petroleira atestou que “apesar de prematuro, o uso de combustíveis fósseis não deveria ser incentivado” e que a humanidade teria de 5 a 10 anos para tomar a decisão do qual rumo traçar.
O prazo final, de acordo com o estudo, foi no ano de 1988 e a decisão tomada pela empresa – e copiada por diversas petroleiras ao redor do planeta – foi a de seguir retirando petróleo do fundo da Terra. Vivemos hoje as consequências dessa escolha.
Mais alguns anos depois, a pressão por ações concretas se tornou inevitável: a Rio 92 inaugurou um novo ciclo de pressão pela tomada de ações para conter o aquecimento do planeta, entre elas a redução do uso de combustíveis fósseis. Diante disso, para impedir tais ações e garantir seus lucros, a indústria fóssil mobilizou o marketing e a publicidade a seu favor.
O ano era 1992. E. Bruce Harrison – reconhecido como o pioneiro das relações públicas ambientais – fez uma apresentação única diante de uma sala cheia de líderes da indústria americana. Os detalhes dessa história foram contados por Jane McMullen, da BBC News, em 2022.
O cliente era a Coalizão Global do Clima que, apesar do nome, representava setores como petróleo, carvão, automóveis, serviços, aço e ferrovias. O objetivo da Coalizão era encontrar alguém capaz de transformar a narrativa sobre as mudanças climáticas.
A estratégia, coordenada por Harrison, era convencer as pessoas de que os fatos científicos não eram conclusivos e que, além do meio ambiente, os legisladores precisavam levar em conta que as ações de combate às mudanças climáticas prejudicariam os empregos, o comércio e os preços nos Estados Unidos.
Mas como fazer isso? A equipe de Harrison desenvolveu uma extensa campanha na imprensa, que incluía desde emplacar declarações e pautar artigos de opinião, a fazer contato direto com jornalistas. O foco da campanha era confundir e com isso postergar ações para frear o uso dos fósseis.
Sim. Como sabemos hoje, dinheiro e estratégia foram capazes de mudar os rumos da política nos Estados Unidos e no mundo e, em agosto de 1993, Harrison fez um resumo dos seus avanços em outra reunião com a GCC.
“O aumento da consciência sobre as incertezas científicas fez com que alguns congressistas suspendessem a defesa de novas iniciativas”, dizia um relatório estratégico interno atualizado, fornecido à BBC por um ex-funcionário de Harrison. “Os ativistas que soavam o alarme sobre o ‘aquecimento global’ reconheceram publicamente que perderam terreno na arena de comunicação no último ano.”
E diante disso, Harrison aconselhou que eles precisavam ampliar as vozes externas que defendiam sua posição: “Cientistas, economistas, acadêmicos e outros especialistas importantes dão mais credibilidade junto à imprensa e ao público em geral que os representantes da indústria.”
Com muito dinheiro na mesa, as petroleiras desembolsaram cerca de cerca de US$ 1,5 mil (R$ 8 mil atualmente) por texto, para que céticos climáticos dessem palestras ou escrevessem artigos. A vitória de sua estratégia estava consolidada quando a antipatia do público tornou mais difíceis as ações de combate às mudanças climáticas, e os Estados Unidos nunca implementaram o acordo firmado em Kyoto. Foi o triunfo do marketing a serviço de uma agenda de morte.
Hoje, a desinformação e a crise climática são os dois maiores riscos da humanidade. Ao menos é o que diz o Global Risks Report (janeiro de 2024) do Fórum Econômico Mundial. E quando a gente junta os dois? Daí a desinformação sobre as mudanças climáticas representa um perigo para a vida de todos nós.
A crise climática impõe um novo normal em relação às chuvas e ao calor: enfrentaremos mais enchentes, alagamentos e deslizamentos, bem como ondas de calor altíssimas – como a que se aproxima neste mês de setembro. Ainda é possível sair dessa trilha e caminhar para um futuro diferente, mas isso demanda ação.
E é aqui que a desinformação atrapalha o jogo todo. Como vimos no marketing da morte, a disseminação de informações incompletas ou mentirosas confunde a sociedade e as pessoas tomadoras de decisão, reduzindo a nossa capacidade de sair do caminho da barbárie climática.
Dois aspectos foram importantes para o triunfo da narrativa negacionista: o princípio da pesquisa climática e a falta de uma comunicação popular da ciência. Como todo campo incipiente na ciência, o debate climático teve, em seu princípio, mais lacunas do que certezas, e as dúvidas foram utilizadas para questionar a veracidade das conclusões.
Outro aspecto é próprio da linguagem científica: a dificuldade de ser acessada e compreendida pelo conjunto da sociedade. Com termos, siglas e conceitos complexos a ciência se dedica pouco a fazer uma transposição didática de seus acúmulos para as pessoas comuns, como eu ou você. Tal dificuldade pavimentou a calçada para passar o negacionismo, afinal nós só conseguimos defender aquilo que nos apropriamos e conhecemos.
É diante deste cenário, de emergência e necessidade de difusão da verdade e da ciência, que surgiu o Planeta A, o mais novo podcast socioambiental do país. Nele, podemos desvendar o que está por trás das mudanças climáticas e quais são as ações que precisamos tomar para contê-las.
O primeiro episódio já está no ar e contou com uma entrevista de Suely Araújo, ex-presidente do IBAMA, advogada, urbanista e Coordenadora de Políticas Públicas do Observatório do Clima. Suely trouxe luz para assuntos complexos e mostrou como a crise climática afeta as nossas vidas hoje para que sigamos tendo um amanhã. Afinal, não tem planeta B!
Você pode acompanhar o Planeta A pelo instagram (@planetapodcast) e conferir a primeira temporada aqui:
*Este artigo contém informações retiradas da seguinte reportagem da BBC News.
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