Eles são conhecidos como o povo das águas, mas poderiam facilmente ser batizados como guardiões dos lagos – ou melhor, dos pirarucus. O povo indígena Paumari, da região do Rio Tapauá, Estado do Amazonas, carrega na história a fama de serem exímios pescadores, principalmente dos gigantes das águas amazônicas.
Em pequenas canoas e com arpões de quatro metros de comprimento, ficavam horas estudando os hábitos do peixe, que tem o comportamento de boiar em intervalos definidos para suas respirações. Quando o peixe subia à superfície para respirar, o movimento do arpão era certeiro. Uma tradição passada por gerações.
Mas no contato cada vez maior com os brancos, os Paumari acabaram permitindo que pescadores profissionais entrassem nas dezenas de lagos que permeiam suas terras, causando um imenso impacto e declínio na população de pirarucus. Com o apoio da Organização Indigenista mais antigas do país, a Operação Amazônia Nativa (OPAN), os Paumari proibiram a pesca predatória em suas terras durante quase uma década e fizeram vigilância para que não houvesse novas invasões. Abandonaram a velha tradição do arpão e começaram a usar enormes redes de pesca. Com a recuperação gradativa das populações, se tornaram parte do que hoje é uma atividade consolidada no Estado do Amazonas – o manejo sustentável do pirarucu. Com isto, possibilitou que o estoque de peixes aumentasse consideravelmente para contabilizarem, atualmente, um aumento de mais de 600% em 16 lagos monitorados.

Juntamente com outras comunidades ribeirinhas e associações, estabeleceram um protocolo extremamente organizado de pesca, onde todas as etapas, do manejo à vigilância comunitária, a retirada do peixe do lago, o transporte e limpeza até o congelamento, são vistoriados e rigorosamente cronometrados.
As mulheres também começaram a participar ativamente de todas as etapas da produção, proporcionando que o peixe manejado, organizado através do Coletivo do Pirarucu, constituísse o chamado “Pirarucu Selvagem”, para que fosse aceito pelos grandes centros consumidores de outras regiões brasileiras, aliando ainda o apoio de alguns chefs da alta gastronomia. E, assim, criando uma consciência baseada no consumo consciente, no respeito e valorização das cadeias produtivas de produtos da floresta, as populações tradicionais se vêem cada vez mais valorizadas, fortalecidas e unidas para manter aquela que é a maior floresta tropical do mundo.
Meu primeiro trabalho de documentação dos Paumari foi em 2013, e ao longo dos anos acompanhei a evolução e profissionalismo do seu trabalho no manejo do pirarucu.
Gradativamente fui conhecendo novos lugares, dos lagos de Mamirauá ao Rio Juruá, sempre no propósito de documentar, da melhor forma possível, uma cultura centenária que está possibilitando aos povos da floresta se manterem nela.
É fascinante e inspirador ver tais comunidades tomarem suas próprias tradições nas mãos, perceberem o poder que carregam e o imenso valor destas cadeias produtivas. É fundamental, para que o mundo moderno continue existindo, que saibamos a origem dos produtos que consumimos. De onde vem, quem está na ponta inicial desta produção, qual é o benefício estrutural e econômico para todos os envolvidos. Pensar coletivamente é a única forma de continuarmos existindo neste ainda maravilhoso planeta.




















As opiniões e informações publicadas nas seções de colunas e análises são de responsabilidade de seus autores e não necessariamente representam a opinião do site ((o))eco. Buscamos nestes espaços garantir um debate diverso e frutífero sobre conservação ambiental.
Leia também
Onça-pintada, uma homenagem ao maior felino das Américas
O 29 de novembro agora é o dia oficial da Onça-Pintada, animal majestoso, nosso maior felino, nomeada a partir de agora símbolo da biodiversidade brasileira →
O árduo caminho para proteger o pato mergulhão
Projeto do Instituto Terra Brasilis, na região da Serra da Canastra, busca proteger esta que é uma das dez espécies de aves mais ameaçadas do mundo. →
Mamirauá avança no turismo de observação de onças
A visita de grupos de turismo para ver onças-pintadas na reserva gera renda para as comunidades locais e reduz a caça dos animais. →






Excelente conteúdo!!! Que bom que você está de volta aqui!