Por que as pessoas bebem e dirigem?
O Outras Vias é um espaço para discussão sobre mobilidade urbana, sobre alternativas mais eficientes para o trânsito, sobre a configuração das cidades e sobre como as pessoas se deslocam. Buscar maneiras mais sustentáveis de transporte em massa é necessário para o avanço em direção à construção de centros urbanos mais seguros, saudáveis e, claro, menos poluídos - não por acaso, o blog está hospedado em ((o)) eco, portal referência em jornalismo ambiental. Pensar sobre a combinação rotineira de álcool e velocidade nas vias públicas das cidades brasileiras faz parte do processo para a concretização das mudanças propostas. Por um motivo simples: não é possível pensar em cidades para pessoas, com investimentos priorizando transporte público coletivo e alternativo (leia-se metrô, trens, ônibus e bicicletas), sem pensar em redução da velocidade máxima permitida e aumento da segurança para pedestres e ciclistas. Há um limite para se defender alternativas em um contexto em que os carros crescem, ficam mais rápidos e pesados, e os motoristas mais imprudentes. E não se trata somente da ingestão desmedida de álcool; quem dirige cada vez mais presta menos atenção no entorno. Películas escuras nos vidros que impedem contato visual, música alta, computadores de bordo, aparelhos de televisão capazes de reproduzir DVDs, celulares conectáveis ao painel, a indústria avança com toda uma sorte de alternativas de entretenimento para quem deve ficar cada vez mais tempo preso em congestionamentos. No contexto da liberdade individual radical e extrema, em que cada um se desloca como quer, todos ficam coletivamente parados nos mesmos engarrafamentos. O discurso do cidadão absolutamente livre fica preso entre asfalto, fumaça e buzinas. Liberdade implica em responsabilidade. E, quando essa liberdade fica mais no discurso do que na realidade, quando ela é artificial, baseada e dependente de punições e repressão, a sociedade tende a ficar infantilizada. Os motoristas aprendem a só reduzir a velocidade quando há radares; a Lei Seca só é respeitada quando há blitz. E criam-se mecanismos para burlar o sistema, aparelhos detectores de radares, redes sociais para alertar sobre as fiscalizações. Motoristas apelam para o direito de não produzir provas contra si mesmo. E o controle aumenta, mais direitos são suspensos, leis mais repressivas ganham força. Sem perceber, passamos a viver em uma sociedade com barreiras policiais formadas por agentes fortemente armados em cada esquina. Nos acostumamos com homens portando carabinas no caminho. Porque só assim as pessoas vão deixar de beber e dirigir. Só assim? Porte de armas Nesta quinta-feira, 3 de novembro de 2011, o ministro Ricardo Lewandowski do Supremo Tribunal Federal (STF) considerou que, mesmo sem provocar acidentes, quem assume a direção de um veículo motorizado após beber, está cometendo um crime. "É como o porte de armas. Não é preciso que alguém pratique efetivamente um ilícito com emprego da arma", escreveu (leia a íntegra da sua decisão). Em meio às notícias em série das últimas semanas sobre atropelamentos graves envolvendo motoristas bêbados irresponsáveis, a mídia repercutiu com entusiasmo a decisão. STF entende que dirigir bêbado é crime, mesmo que o motorista não provoque danos, no Globo Para STF, dirigir embriagado é crime mesmo se não causar acidentes, na Época Leia voto em que ministro diz que dirigir bêbado é crime, no Conjur Supremo Tribunal pode sumular que basta dirigir bêbado para caracterizar crime, no Sem Fronteiras Decisão importante que aumenta a possibilidade de comportamentos irresponsáveis serem punidos. Decisão necessária em uma situação de emergência em que mais de 40 mil pessoas morrem no trânsito por ano no Brasil. Decisão crítica em uma situação crítica. Mas, ao mesmo tempo em que se aumenta a rigidez do sistema, punindo com prisão quem ingerir álcool e dirigir, é preciso, para não corrermos o risco de acabar como uma sociedade tutelada e infantil, pensar. Por que as pessoas bebem e dirigem? Que tipo de propaganda influencia esse comportamento? Quem tem interesse? Quem lucra associando álcool e velocidade? Racha, um evento"esportivo" realizado no Autódromo de São Paulo →