Lima, Peru – A Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP20), em Lima, no Peru, começa a sua segunda e última semana na tentativa de preparar um rascunho para um possível acordo global de clima, que deverá ser formalizado na COP de Paris, em 2015. Sem a presença de chefes de Estado, a COP20 está sendo conhecida como a COP Indígena, é o que se ouve nos corredores e comentários dos side events, reuniões e encontros paralelos.
E não é à toa. As Terras Indígenas (Tis) e as Áreas Protegidas na Amazônia são responsáveis por armazenar mais da metade do carbono existente em toda a floresta, mais precisamente 55% – algo em torno de 47,3 bilhões de toneladas de carbono – segundo um estudo realizado pela Rede Amazônica de Informação Socioambiental Georreferenciada (RAISG).
E as grandes pressões e ameaças já são bastante conhecidas: o corte de madeira ilegal, a mineração, expansão desenfreada da agropecuária e construção de represas que põem em risco as florestais tropicais.
Tamanha quantidade de estoque de carbono foi uma surpresa para os pesquisadores, admitiu a ((o))eco, Sandra Ríos, integrante do Instituto del Bien Común (IBC) em Peru e uma das coordenadores do estudo em espanhol “Carbono en los bosques de la Amazonía: El poco reconocido papel de los territorios indígenas y las áreas naturales protegidas“, publicado na revista Carbon Management.
“Os povos indígenas demonstraram através do tempo que administram suas florestas de maneira muito mais eficiente do que nós não-indígenas fazemos. Essa quantidade de carbono armazenado reflete o bom manejo e uma boa conservação. Os povos indígenas podem utilizar os recursos naturais em suas terras para sobreviver, mas têm ido muito mais além. Eles administram suas florestas de tal forma que elas ainda sequestram uma boa porcentagem de carbono”, explicou Sandra Ríos.
O estudo teve início em setembro e reuniu pesquisadores e lideranças indígenas das seguintes instituições: o Centro de Pesquisa Woods Hole (WHRC), a própria RAISG, a Coordinadora de las Organizaciones Indígenas de la Cuenca Amazónica (COICA) e o Fundo de Defesa Ambiental (EDF).
Mudanças no clima
O informe apenas revelou o que já se supunha: os povos indígenas são importantes protagonistas para, não apenas conservar a floresta em pé e manter os estoques de carbono, como também contribuir para evitar os impactos ambientais nas mudanças do clima.
“Nunca tínhamos estado sob tanta pressão, agora este estudo demonstra que sim”, declarou Edwin Vásquez, coautor e presidente de COICA. “Agora temos evidência de que onde os direitos dos indígenas são preservados, as florestas estão em pé. Sabendo que mais da metade do carbono da região amazônica está nos territórios indígenas e nas áreas naturais protegidas, podemos dizer a nossos governantes que fortaleçam o papel e os direitos dos povos da floresta”, afirmou.
O estudo considera que uma importante proporção das TIs e áreas protegidas se encontra em situação de risco com “consequências potencialmente desastrosas” que podem afetar 40% dos territórios indígenas, um terço das áreas naturais protegidas e 24% que corresponde a ambas categorias, por tratar-se de áreas de superposição.
Manter a estabilidade da atmosfera amplia a gama de serviços ambientais e sociais fornecidos pela Amazônia e dependerá dos governos decidirem adotar políticas para assegurar a integridade ecológica das Tis e áreas protegidas, define o artigo.
O estudo adverte que a destruição contínua dos ecossistemas ricos en carbono diminuirá gradualmente sua capacidade de funcionar de forma adequada podendo resultar em “efeitos nocivos e potencialmente irreversíveis sobre a atmosfera e o planeta”.
Compromissos na COP20
Sandra Ríos espera que a COP20 no Peru sirva, pelo menos, para alinhar uma posição entre os países amazônicos a fim de traçar políticas comuns para a preservação da Amazônia e definir metas para evitar as emissões.
“Estamos em busca de compromissos. Esperamos demonstrar que nossa Amazônia armazena uma grande quantidade de carbono e que este estudo pode fazer parte de uma elaboração de estratégias para mitigar e adaptar às mudanças climáticas. O ordenamento e planejamento dos projetos de conservação devem ser pensados em conjunto”, argumentou.
Cerca de 14% das áreas indígenas ainda não estão legalmente reconhecidas. A Rede Amazônica de Informação Socioambiental Georreferenciada reforça a necessidade de reconhecer estas áreas oficialmente.
A situação dos povos indígenas na Amazônia ainda é “muito triste”, disse a ((o))eco a Relatora Especial da ONU para os direitos dos povos índigenas, Victoria Tauli-Corpuz.
“Tenho recebido muitas alegações de violações de direitos humanos dos povos indígenas na Amazônia, tanto no Peru, como no Brasil e no Equador. Se elas se confirmarem, não demonstram a seriedade de seus governos para tratar de temas relacionados às mudanças climáticas”.
A Relatora Especial da ONU conversou com ((o))eco durante o Global Landscapes Forum, um envento paralelo à conferencia oficial COP20 que reuniu neste fim de semana, na capital peruana, ambientalistas, cientistas, experts e ministros de sete países da América Latina para discutir temas de conservação da paisagem.
“Se você respeita os povos indígenas e seu direito à floresta, eles podem contribuir significativamente para as mitigações das mudanças do clima”, afirmou Victoria Tauli-Corpuz.
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