Notícias

António Guterres diz que 1,5°C será ultrapassado e reforça necessidade de adaptação

Secretário-geral da ONU reforça que adaptação e cooperação internacional são essenciais diante da crise climática. Declaração ocorre a menos de três semanas da COP 30

Karina Pinheiro ·
22 de outubro de 2025

A meta global de limitar o aquecimento da Terra a 1,5°C acima dos níveis pré-industriais,  marco central do Acordo de Paris, não será atingida. A declaração foi feita nesta quarta-feira (22) pelo secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, durante uma reunião da Organização Meteorológica Mundial (OMM), em Genebra.

“Uma coisa já está clara: não conseguiremos conter o aquecimento global abaixo de 1,5°C nos próximos anos”, disse Guterres. “Ultrapassar o limite agora é inevitável.”

A declaração, feita a menos de três semanas da 30ª Conferência do Clima da ONU (COP30), que será realizada em Belém do Pará, antecipa o tom das discussões que devem dominar a cúpula: como lidar com um planeta que já ultrapassou o limite seguro de aquecimento e como financiar a adaptação dos países mais vulneráveis.

O planeta à beira do limite

De acordo com o observatório europeu Copernicus, a temperatura média global já é 1,4°C superior à registrada entre 1850 e 1900. Cientistas preveem que o aumento de 1,5°C, antes visto como linha vermelha, poderá ser ultrapassado ainda nesta década.

A diferença de meio grau é pequena apenas nos números. Na prática, representa a intensificação de eventos extremos, como secas, incêndios florestais, ondas de calor e tempestades, além da aceleração do degelo polar e da destruição de ecossistemas marinhos.

“Essas mudanças estão levando nosso planeta à beira do abismo”, afirmou Guterres, pedindo que os governos apresentem planos nacionais de ação que traduzam compromissos em medidas concretas.

A fala do secretário-geral ocorre dias antes da divulgação do novo relatório da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC), que deve atualizar o panorama das Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs), os compromissos climáticos apresentados por cada país. A expectativa é que o documento seja divulgado na próxima sexta-feira (24).

Adaptação ganha força na agenda

Diante da constatação de que o aquecimento global ultrapassará 1,5°C, ganha força a percepção de que a adaptação aos impactos da crise climática deixou de ser opção e tornou-se uma necessidade urgente.

Um novo relatório da UNFCCC, publicado ontem (21), mostra avanços expressivos na elaboração dos Planos Nacionais de Adaptação (NAPs), instrumentos que orientam como os países se preparam para enfrentar os efeitos da crise climática.

Até 30 de setembro de 2025, 144 países tinham iniciado a elaboração de seus NAPs, e 67 nações em desenvolvimento, entre elas 23 dos países mais pobres e 14 pequenos Estados insulares, já enviaram oficialmente seus planos à ONU.

Os documentos definem estratégias para fortalecer a resiliência climática e integrar a adaptação às políticas de desenvolvimento em áreas como água, alimentação, saúde, infraestrutura e meio ambiente.

O relatório destaca o papel do multilateralismo como motor da ação climática. O Fundo Verde para o Clima (GCF) já aprovou US$ 6,9 bilhões para projetos de adaptação em países em desenvolvimento, enquanto programas como a NAP Global Network e o UN4NAPs promovem trocas técnicas entre mais de 100 países.

Simon Stiell, secretário-executivo da ONU para Mudança do Clima, destacou que os avanços em planejamento precisam agora ser acompanhados por fluxos financeiros mais consistentes.

“Muitos países ainda não têm acesso ao financiamento de que precisam. Com frequência, enfrentam processos de aprovação complexos e apoio fragmentado”, afirmou. “Os sistemas estão cada vez mais preparados, mas o financiamento precisa começar a fluir.”

O estudo também revela que os países estão começando a alinhar seus NAPs às metas de mitigação e aos relatórios de transparência do Acordo de Paris. Em muitos casos, ações de adaptação já são incorporadas às políticas públicas, com foco em alertas precoces, equidade de gênero, participação comunitária e redução de vulnerabilidades.

Em 119 países, sistemas multirriscos de alerta precoce já estão em funcionamento, aumentando a capacidade de resposta diante de eventos extremos. Para especialistas, trata-se de um avanço importante para conectar a agenda climática às necessidades cotidianas das populações.

  • Karina Pinheiro

    Jornalista formada pela Universidade Federal do Amazonas (UFAM), possui interesse na área científica e ambiental, com experiência na área há mais de 2 anos.

Leia também

Notícias
7 de julho de 2025

Participação inédita de comunidades tradicionais na UNFCCC reforça protagonismo rumo à COP30

Durante a SB62, lideranças de comunidades tradicionais do Brasil e da América Latina participaram formalmente das negociações da Plataforma de Comunidades Locais e Povos Indígenas da UNFCCC

Reportagens
5 de outubro de 2015

Acordo de Paris começa, enfim, a ganhar cara

Texto-base proposto por co-presidentes cai de 85 para 20 páginas e inclui revisões de ambição a cada 5 anos e aceno às nações-ilhas; proposta brasileira é diluída, mas permanece no rascunho do tratado.

Vídeos
10 de junho de 2018

Vídeo: A humanidade vai conseguir cumprir o Acordo de Paris? por Claudio Angelo

O coordenador de Comunicação do Observatório do Clima explica as forças que se opõem à transição da economia do baixo carbono e quem parece estar ganhando essa batalha

Mais de ((o))eco

Deixe uma resposta

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Saiba como seus dados em comentários são processados.