O Pantanal e outras áreas úmidas globais são peça-chave para enfrentar as crises climática e da biodiversidade, bem como protegem economias, populações urbanas, indígenas e tradicionais. Mas, ainda recebem menos recursos e apoio para sua conservação.
A análise foi partilhada esta semana na sede do Parlamento Europeu, em Bruxelas, num painel com representantes de entidades como da diplomacia brasileira, sociedade civil e Comissão Europeia, o órgão legislativo do bloco.
Luciana Leite, defensora da Biodiversidade e do Clima na ong Environmental Justice Foundation (EJF), disse que, embora a maioria da comunidade internacional pense na Floresta Amazônica ao pensar no Brasil, protegê-la não pode “custar o Pantanal”.
“Enquanto o Brasil se prepara para sediar a COP 30 [ano que vem] pedimos aos líderes da União Europeia e do Brasil para canalizar mais recursos para proteger e restaurar o Pantanal. Há tempo, mas devemos começar a agir agora”, alerta.
No encontro na capital da Bélgica, foi ressaltado que as áreas úmidas armazenam até 30% do carbono do solo planetário e 40% das espécies conhecidas de plantas e animais dependem delas.
Embaixador na União Europeia, Pedro da Costa e Silva pontuou que muitos países já vivenciam impactos das rápidas mudanças climáticas, como as enchentes e a seca devastadoras no Brasil.
“No Pantanal, o desafio de combater os incêndios continua sendo enorme. Com a ajuda de parceiros, a ideia é gerar discussões e abrir caminhos para um trabalho conjunto”, avaliou o diplomata.
Florika Fink-Hooijer, diretora de Ambiente na Comissão Europeia, pede que a natureza seja posta no “centro das atenções” e avalia que a humanidade não faz o necessário diante das crises do desequilíbrio do clima e da perda de biodiversidade.
“O Pantanal brasileiro é uma prova: se você não se importa o suficiente com a interdependência entre biodiversidade e mudanças climáticas, teremos um desastre”, destacou.
Representando no Parlamento Europeu a Aliança Progressista dos Socialistas e Democratas, Annalisa Corrado disse que proteger áreas úmidas é uma questão de presente e futuro. “A biodiversidade é a chave para a nossa existência neste planeta e para nossa saúde”, afirmou.
Já o diretor da ong Wetlands International na Europa, Chris Baker, lembrou que grande parte dos recursos e cadeias de suprimento que abastecem a região “dependem e impactam as áreas úmidas ao redor do mundo”.
“Elas não são algo distante, elas fazem parte do nosso mundo. Para resolver esses problemas, precisamos de uma abordagem como os instrumentos essenciais de cooperação de que estamos falando”, ressaltou.
Enquanto isso, entidades civis brasileiras esperam que o Pantanal seja em breve incluído numa regulação da União Europeia que veta a compras de produtos e derivados ligados ao desmate e outros impactos socioambientais.
Num primeiro momento, essas regras valerão apenas para os prejuízos registrados em florestas, que cobrem uma pequena parte de biomas como o Pantanal e o Cerrado.
A norma deve entrar em vigor em dezembro, sob protestos e pedidos de adiamento de governos e setor privado de grandes produtores e exportadores agropecuários, como Brasil, Índia, Indonésia e Estados Unidos.
Futuro do pretérito
O clamor das entidades reunidas em Bruxelas reforça o de organizações no Brasil todo frente a mais de um ano catastrófico para o Pantanal sul-americano.
Foi queimado no bioma 1,22 milhão de ha de janeiro a agosto, ou 249% a mais que a média dos cinco anos anteriores para o período, de 374 mil ha. Nos mesmos meses deste ano, o município que mais queimou foi Corumbá (MS), mostra o Monitor do Fogo do MapBiomas.Em maio, mostramos que a temperatura média no Pantanal subiu 4ºC desde 1980 e pode chegar até 10ºC até o fim do século, além de mais 182% de ondas de calor. As análises são do Laboratório de Aplicações de Satélites Ambientais (Lasa) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
Além disso, a seca extrema tem impedido a navegação de grandes embarcações pelo Rio Paraguai por até 4 meses ao ano.
Apesar do cenário ameaçador para economias, conservação da natureza e pessoas, governos do Brasil, de países vizinhos, dos estados pantaneiros e setor privado mantêm planos para consolidar a Hidrovia Paraguai-Paraná, cujas obras são licenciadas de forma fragmentada.
A via exigirá dragagens e remoção de pedrais para que navios se movimentem o ano todo. Segundo cientistas, isso comprometerá os ciclos de cheias e vazantes, mudando de vez o Pantanal hoje mundialmente conhecido.
Para estimular mais obras como essa, uma iniciativa para ampliar o transporte de cargas pelos rios brasileiros e tornar as hidrovias um bom negócio privado é costurada por Ministério de Portos e Aeroportos e Casa Civil, conta o Poder360.
Com informações da EJF.
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