Manaus, AM — O macaco-de-cheiro-de-cabeça-preta (Saimiri vanzolinii) ocupa a menor área entre todos os primatas neotropicais conhecidos, apenas 87 mil hectares, uma extensão menor do que o município do Rio de Janeiro. Encontrado apenas na parte sul e em ilhas no entorno da Reserva de Desenvolvimento Sustentável de Mamirauá, no Amazonas, ele divide o espaço com outras duas espécies de macacos-de-cheiro, o S. cassiquiarensis e o S. macrodon, que ocupam também grandes áreas fora da reserva.
Pesquisadores ainda tentam compreender o que determina os limites entre as áreas ocupadas pelas três espécies e porque o vanzolinii, batizado em homenagem ao biólogo e músico Paulo Vanzolini, tem um território tão restrito. Algumas respostas são dadas em artigo publicado no início deste mês na revista científica Primates, por um grupo de pesquisadores liderados pela bióloga Fernanda Pozzan Paim, do Instituto Mamirauá.
“A conclusão é que essas áreas (onde ocorrem cada uma das três espécies de Saimiri) exibem diferenças entre elas e que cada uma possui as condições necessárias para a sobrevivência da espécie que abriga”, explica a pesquisadora. “Então é dessa forma que a gente afirma que as barreiras são ecológicas, não são geográficas”.
O vanzolinii, que segundo os cientistas surgiu há aproximadamente 260 mil anos, ali mesmo na região, está espremido entre seus primos, que apareceram antes em outros locais e se espalharam até chegar a região. O Rio Japurá, que limita a reserva, serve também para dividir a área de ocorrência do cassiquiarensis, que vive mais ao norte, e a do macrodon, ao sul da região.
O cassiquiarensis, que segundo cientistas surgiu há cerca de 300 mil anos, se espalha desde o Japurá, incluindo a parte leste da RDS Mamirauá, até a Colômbia e Venezuela. Em território brasileiro, ocupa todo o Noroeste do Amazonas e Oeste de Roraima. Como limite oriental, encontra os Rios Branco e Negro, e ao sul, o Solimões.
Já o macrodon, mais antigo, que surgiu provavelmente há cerca de 420 mil anos, é encontrado desde o Japurá, a norte, até o Rio Juruá, ao sul, nos estados do Amazonas e Acre, além da Colômbia, Equador e Peru.
O estudo demonstrou que em Mamirauá os três macacos-de-cheiro são encontrados em diferentes tipos de várzea (alta, baixa e chavascal, paisagem que passa mais tempo alagada durante o ano). Outros fatores, como tamanho da copa das árvores e composição florística, podem ter relação com o território ocupado pelos diferentes saimiris. Nos chavascais ocupados pelo vanzolinii, o estudo verificou que ocorrem mais cipós, além de existir disponibilidade de figueiras, item importante na dieta, durante o ano inteiro.
O resultado aponta também algumas hipóteses para explicar o tamanho reduzido da área ocupada pelo Saimiri vanzolinii. “Essa região tem características propícias para a sobrevivência da espécie, mas pode ser também que, pelo fato dela ser muito recente em comparação com as outras do gênero na escala evolutiva, não teve tempo de se dispersar, de aumentar a área”, teoriza a bióloga. Além disso, conforme acrescenta Fernanda Paim, o mico-de-cheiro-da-cabeça-preta tem duas outras espécies competindo com ele, que podem estar impedindo que ele aumente seu território.
Devido à pequena área que ocupa, em uma região úmida, o mico-de-cheiro-de-cabeça-preta é vulnerável a mudanças climáticas que possam afetar a região. Os pesquisadores destacam a importância de conhecer melhor os hábitos, necessidades e região onde essa primata vive, para aprimorar planos de proteção à espécie.
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