Em novembro de 2014, o governo de Santa Catarina entrou com uma ação no Supremo Tribunal Federal que pretendia obter a inconstitucionalidade de uma prerrogativa estabelecida pela lei do Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC): gestores de uma unidade de conservação podem barrar licenciamentos ambientais dentro das áreas protegidas e em zonas de amortecimento (áreas delimitadas no entorno) de unidades de conservação. O trâmite da ação acaba de sofrer um revés, após um parecer contrário a ela emitido pelo Ministério Público. Esse parecer cita argumentos de duas ONGs de proteção ambiental, a Rede-Pró UC e o Instituto de Justiça Ambiental, uma vitória para grupos engajados na conservação. E essa vitória mostra um caminho jurídico que outros podem percorrer.
Santa Catarina entrou com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIN) contra o parágrafo terceiro do artigo 36 do SNUC, que condiciona a aprovação de um empreendimento dentro ou próximo de uma área protegida à autorização do chefe dessa unidade de conservação. Por exemplo, caso uma fábrica quisesse se instalar em uma zona de amortecimento de um parque nacional, o gestor desse parque pode barrar o empreendimento, mesmo com todo o processo de licenciamento feito.
Para o governador Raimundo Colombo (PSD-SC), esse parágrafo da lei do SNUC é inconstitucional, pois submete “o exercício da competência constitucional de um ente federado (o estado) à aprovação de terceiros” (Leia a íntegra da Ação Direta de Inconstitucionalidade). Segundo o governador, cabe aos estados e somente aos estados decidir como realizarão o licenciamento e a aprovação de obras de seu interesse.
A duplicação da estrada que leva ao aeroporto internacional Hercílio Luz pode ter motivado a ação no STF. O governo prefere centralizar as decisões sobre licenciamento no estado para o órgão estadual: a Fundação do Meio Ambiente (FATMA), do que ter que lidar com restrições impostas pelos órgãos ambientais federais e municipais.
A Ação Direta de Inconstitucionalidade foi ajuizada no dia 26 de novembro de 2014 e aguarda a apreciação e votos dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF).
Parecer contrário
“Seria ótimo que mais instituições ambientais e institutos opinassem também nos autos, porque [o Amicus curiae] é um instrumento prático e gratuito, embora pouquíssimo difundido”
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Entretanto, no final de julho, o Ministério Público Federal publicou um parecer se manifestando contrário à ação. Em um documento de 16 páginas, o Procurador-Geral da República, Rodrigo Janot, argumenta que o parágrafo 3º do artigo nº 36 do SNUC não viola a autonomia dos entes federados.
“A competência dos Estados para expedir licenciamento ambiental não é abalada pela norma federal. Pretende-se tão somente garantir que, ante empreendimentos de significativo impacto ambiental sobre unidades de conservação, o órgão de gestão destas exerça controle prévio sobre as atividades”, diz o texto do documento.
Janot citou no parecer a petição feita em conjunto pela Rede Nacional Pró-Unidades de Conservação (Rede Pró-UC) e o Instituto de Justiça Ambiental (IJA) para participar do processo no Supremo como Amicus curiae, instrumento jurídico que permite a entidades civis se manifestarem nos autos do processo como interessados na causa.
Na petição citada por Janot, as duas ONGs defendem que a exigência da prévia autorização do gestor de unidade de conservação. Elas trabalharam em parceria. “A Rede Pró-UCs”, diz sua diretora Angela Kuczach, “escolhe quais são as maiores ameaças ambientais e, então, o Instituto de Justiça Ambiental (IJA) aciona a justiça da melhor forma possível”.
Para Cristiano Pacheco, advogado do IJA e autor da petição, a Amicus curiae é um instrumento essencial para a sociedade civil. “Quando a gente vê tramitar uma ADIN como essa, com um objeto realmente preocupante, ter esses instrumento da Amicus curiae é super importante para se fazer ouvir. Seria ótimo que mais instituições ambientais e institutos opinassem também nos autos, porque é um instrumento prático e gratuito, embora ainda muito pouco difundido”.
Contra a ação do governo de Santa Catarina, as duas ONGs também usaram o Princípio Internacional da Proibição de Retrocesso. Ele estabelece que não se pode criar uma lei mais fraca, menos protetiva, do que a norma anterior vigente.
Além da petição por escrito, Pacheco também requereu a oportunidade das ONGs fazerem uma defesa oral, na corte, dos argumentos já apresentados.
O parecer do procurador-geral Rodrigo Janot seguirá para o STF e os ministros devem julgar a ação, cujo relator é o ministro Dias Toffoli.
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A autorização para licenciamento é feita pela Coordenação Regional
Chimbica, o que voce entende "boa coisa' !
Ministério Público e ONGs juntos não é boa coisa!
Otimo exemplo para todos. Exemplo este, que pode e deve ser seguido nas questões da matança dos animais silvestres, que ocorre por atropelamento nas vias que cortam as unidades de conservação deste Brasil.
Eco, na Lei não fala de manifestação do chefe e sim autorização do órgão administrador. Isso é bem diferente do que está escrito.
Prezado Chato.
O Artigo 36 do SNUC em seu § 3o fala: "Quando o empreendimento afetar unidade de conservação específica ou sua zona de amortecimento, o licenciamento a que se refere o caput deste artigo só poderá ser concedido mediante autorização do órgão responsável por sua administração, E A UNIDADE AFETADA, mesmo que não pertencente ao Grupo de Proteção Integral, deverá ser uma das beneficiárias da compensação definida neste artigo." (caixa alta minha).
Quem responde pela "unidade afetada" é o gestor, salvo condições específicas designadas pelo Órgão Gestor, logo, embora o parágrafo não cite claramente a figura do chefe, o posicionamento do mesmo tem peso legal sim. O questionamento do governo de SC enfraquece a autonomia da UC por meio da figura do Chefe e do Órgão Gestor, nessa ordem, colocando -as em risco de forma direta.
Enquanto gastamos nosso tempo discutindo minúcias o interesse de uma ação com essa obviamente é facilitar o licenciamento, diminuir a já parca autonomia das UCs e alterar as questões de compensação ambiental.
Abçs,
Angela Kuczach não acredita em hierarquia institucional!