Estudo divulgado esta semana pelo Climate Policy Initiative (CPI/PUC-Rio) e pelo projeto Amazônia 2030 mostra que falhas na regulamentação e regime jurídico tem possibilitado o crescimento desenfreado do garimpo de ouro legal na Amazônia, trazendo impactos tão negativos quando aos da atividade ilegal.
O trabalho, intitulado “Garimpo Legal do Ouro na Amazônia: Recomendações para um Adequado Controle dos Impactos Socioambientais”, mostra que, entre 2016 e 2023, foram concedidas autorizações para a atividade em 630 mil hectares do bioma, o equivalente a quatro vezes a cidade de São Paulo.
O número representa 81% da área total liberada para a realização da mineração de ouro no Brasil (770.464 hectares). Segundo o documento, Pará e Mato Grosso concentram 99% das autorizações na floresta tropical, sendo 64% no Mato Grosso e 35% no Pará.
Apesar de legalizada, a atividade tem apresentado inúmeros problemas. Segundo os pesquisadores responsáveis pela análise, as normas que regulam a atividade são anacrônicas e sujeitas a um regime jurídico incompatível com o potencial de impacto da atividade.
“Apesar de legalizado, o garimpo de ouro na Amazônia provoca impactos socioambientais semelhantes aos da atividade ilegal, como desmatamento, contaminação por mercúrio, conflitos com povos tradicionais e trabalho escravo”, diz o trabalho.
Ainda de acordo com os pesquisadores, predominam hoje no país garimpos que operam em escala industrial e empresarial, ocupando áreas similares às de grandes mineradoras.
Além disso, flexibilizações indevidas do licenciamento ambiental em âmbito estadual e falta de transparência na implementação das salvaguardas socioambientais enfraquecem o controle da atividade, dizem os autores.
No Pará, por exemplo, o licenciamento ambiental da atividade ocorre de forma simplificada e descentralizada para os municípios, com pouca transparência e baixo controle, mesmo sendo o garimpo classificado, por lei, como atividade de alto impacto.
Outro ponto de destaque do estudo é a atuação cada vez maior das cooperativas de garimpeiros, que hoje operam em áreas 178% maiores do que aquelas exploradas por pessoas físicas e pequenas firmas somadas, e mais do que o dobro da média da mineração industrial.
“Essa mudança de escala transforma o garimpo em um verdadeiro empreendimento empresarial, sem que as regras ambientais e de controle tenham acompanhado essa evolução”, dizem as organizações responsáveis pelo trabalho.
Recomendações
Para enfrentar os impactos do garimpo legal na Amazônia, os autores propõem uma série de medidas urgentes. A principal delas é a exigência de pesquisa prévia obrigatória – hoje aplicada apenas à mineração industrial – também para atividades de garimpagem, sobretudo quando operadas por cooperativas.
O estudo também recomenda o arquivamento de projetos de lei que tramitam no Congresso e que, ao flexibilizar ainda mais o garimpo, podem aprofundar as distorções já existentes.
Além disso, destaca a importância de os estados – especialmente o Pará – reforçarem o licenciamento ambiental com mais rigor técnico, transparência e capacidade institucional, para evitar que a atividade siga sendo um dos principais vetores de degradação socioambiental na região.
“Há um descompasso profundo entre a realidade do garimpo hoje e a forma como o Estado o regula. Sem mudanças estruturais, o garimpo legal continuará sendo um vetor de degradação na Amazônia”, afirmam os autores.
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