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Com falhas na regulação, garimpo de ouro legalizado cresce na Amazônia

Pesquisa mostra que, mesmo que realizado de forma legal, garimpo de ouro provoca impactos ambientais semelhantes aos da atividade ilegal

Cristiane Prizibisczki ·
16 de abril de 2025

Estudo divulgado esta semana pelo Climate Policy Initiative (CPI/PUC-Rio) e pelo projeto Amazônia 2030 mostra que falhas na regulamentação e regime jurídico tem possibilitado o crescimento desenfreado do garimpo de ouro legal na Amazônia, trazendo impactos tão negativos quando aos da atividade ilegal.

O trabalho, intitulado “Garimpo Legal do Ouro na Amazônia: Recomendações para um Adequado Controle dos Impactos Socioambientais”, mostra que, entre 2016 e 2023, foram concedidas autorizações para a atividade em 630 mil hectares do bioma, o equivalente a quatro vezes a cidade de São Paulo.

O número representa 81% da área total liberada para a realização da mineração de ouro no Brasil (770.464 hectares). Segundo o documento, Pará e Mato Grosso concentram 99% das autorizações na floresta tropical, sendo 64% no Mato Grosso e 35% no Pará.

Apesar de legalizada, a atividade tem apresentado inúmeros problemas. Segundo os pesquisadores responsáveis pela análise, as normas que regulam a atividade são anacrônicas e sujeitas a um regime jurídico incompatível com o potencial de impacto da atividade.

“Apesar de legalizado, o garimpo de ouro na Amazônia provoca impactos socioambientais semelhantes aos da atividade ilegal, como desmatamento, contaminação por mercúrio, conflitos com povos tradicionais e trabalho escravo”, diz o trabalho.

Ainda de acordo com os pesquisadores, predominam hoje no país garimpos que operam em escala industrial e empresarial, ocupando áreas similares às de grandes mineradoras. 

Além disso, flexibilizações indevidas do licenciamento ambiental em âmbito estadual e falta de transparência na implementação das salvaguardas socioambientais enfraquecem o controle da atividade, dizem os autores.

No Pará, por exemplo, o licenciamento ambiental da atividade ocorre de forma simplificada e descentralizada para os municípios, com pouca transparência e baixo controle, mesmo sendo o garimpo classificado, por lei, como atividade de alto impacto.

Outro ponto de destaque do estudo é a atuação cada vez maior das cooperativas de garimpeiros, que hoje operam em áreas 178% maiores do que aquelas exploradas por pessoas físicas e pequenas firmas somadas, e mais do que o dobro da média da mineração industrial.

“Essa mudança de escala transforma o garimpo em um verdadeiro empreendimento empresarial, sem que as regras ambientais e de controle tenham acompanhado essa evolução”, dizem as organizações responsáveis pelo trabalho.

Recomendações

Para enfrentar os impactos do garimpo legal na Amazônia, os autores propõem uma série de medidas urgentes. A principal delas é a exigência de pesquisa prévia obrigatória – hoje aplicada apenas à mineração industrial – também para atividades de garimpagem, sobretudo quando operadas por cooperativas. 

O estudo também recomenda o arquivamento de projetos de lei que tramitam no Congresso e que, ao flexibilizar ainda mais o garimpo, podem aprofundar as distorções já existentes. 

Além disso, destaca a importância de os estados – especialmente o Pará – reforçarem o licenciamento ambiental com mais rigor técnico, transparência e capacidade institucional, para evitar que a atividade siga sendo um dos principais vetores de degradação socioambiental na região.

“Há um descompasso profundo entre a realidade do garimpo hoje e a forma como o Estado o regula. Sem mudanças estruturais, o garimpo legal continuará sendo um vetor de degradação na Amazônia”, afirmam os autores.

Leia o estudo completo aqui

  • Cristiane Prizibisczki

    Jornalista com quase 20 anos de experiência na cobertura de temas como conservação, biodiversidade, política ambiental e mudanças climáticas. Já escreveu para UOL, Editora Abril, Editora Globo e Ecosystem Marketplace e desde 2006 colabora com ((o))eco. Adora ser a voz dos bichos e das plantas.

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