A pandemia de coronavírus pode reduzir drasticamente as populações de chimpanzés, gorilas, bonobos e orangotangos, alertam cientistas do The Great Ape Health Consortium, organização científica internacional voltada para a saúde dos grandes símios. Em carta publicada na revista científica Nature na última terça-feira (24), os cientistas urgem para que medidas preventivas drásticas sejam tomadas para salvaguardar a saúde destes animais. A carta é assinada por 26 pesquisadores de instituições de todo o mundo.
A preocupação baseia-se no fato de que os grandes símios, que compartilham cerca de 98 do DNA humano, são suscetíveis a pegar doenças respiratórias das pessoas. Sabe-se que mesmo patógenos que produziram sintomas leves em humanos foram letais para grandes símios no passado.
O fato de o Covid-19 ser fatal para alguns humanos leva os especialistas a temer que isso possa ser devastador para os grandes macacos. Ainda não foram relatados casos de contaminação do Covid-19 em grandes símios, portanto, o verdadeiro impacto é desconhecido. Mas os especialistas alertam que muitos grandes macacos já correm risco de extinção devido à destruição de seus habitats e à caça dessas espécie nos países em que elas ocorrem.
Como medida de prevenção, os pesquisadores sugerem o fechamento de parques nacionais, reservas e zoológicos. Parques nacionais no Congo e Ruanda já fecharam para turistas e pesquisadores, mas a decisão não é fácil. Sem a presença humana, aumenta o risco de que esses animais sejam caçados.
“Na situação atual, recomendamos que o turismo [para avistamento] de grandes macacos seja suspenso e a pesquisa de campo reduzida, sujeita a avaliações de risco para maximizar os resultados de conservação (por exemplo, a caça furtiva pode aumentar com menos pessoas nas proximidades). Tais esforços devem incluir formas de compensar a perda de ganhos com o turismo, tomando o cuidado de não interferir no trabalho para salvar vidas humanas”, dizem os especialistas na carta.
“As pessoas mais jovens, que podem estar menos suscetíveis ao risco de doenças graves do Covid-19, são as que têm mais chances de caminhar pelos parques nacionais da África e da Ásia para ver grandes macacos em estado selvagem”, disse Thomas Gillespie, pesquisador da Emory University & Rollins School of Public – Atlanta/EUA e um dos líderes do artigo publicado na Nature. “Seria extremamente difícil monitorar se eles estavam infectados com o Covid-19, pois podem não ter sintomas óbvios”.
Pesquisa publicada em 2008 revelou a primeira evidência direta de transmissão de vírus de humanos para macacos selvagens. Desde então, vírus respiratórios humanos comuns causam surtos letais em grandes macacos selvagens que se acostumaram com as pessoas. Em 2016, cientistas relataram a transmissão de um coronavírus humano a chimpanzés selvagens no Parque Nacional Taï, na Costa do Marfim.
Em 2017, Thomas Gillespie foi coautor de um relatório que mostra que 60% das mais de 500 espécies de primatas no mundo estão ameaçadas de extinção, enquanto 75% têm populações em declínio.
O número de gorilas-das-montanhas sobreviventes tem aumentado, com cerca de 1.000 indivíduos vivendo agora na República Democrática do Congo e Uganda, e a espécie foi transferida de criticamente ameaçada para ameaçada. É o único grande macaco que se acredita estar aumentando em número. Mas estes ganhos recentes podem ser rapidamente revertidos se o Covid-19 for introduzido nessas populações, por isso a proteção é fundamental neste momento crítico, defendem os especialistas.
As últimas orientações da União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN) dizem que a distância normalmente mantida entre as pessoas e os grandes símios deve aumentar de 7 para 10 m. Também diz que ninguém que esteja doente ou que tenha tido contato com alguém doente nos últimos 14 dias deve ter permissão para visitar grandes símios.
“Como especialistas em conservação e saúde desses animais, instamos governos, profissionais de conservação, pesquisadores, profissionais de turismo e agências de financiamento a reduzir o risco de introduzir o vírus nesses macacos ameaçados”, dizem os especialistas. “Esperamos o melhor, mas devemos nos preparar para o pior e considerar criticamente o impacto de nossas atividades nessas espécies ameaçadas”.
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