O governo promoveu mais uma mudança nas regras de fiscalização ambiental – a segunda em menos de dois anos – e retirou a autonomia dos fiscais em campo, que agora precisam da autorização prévia de um superior para aplicar uma multa. As novas regras foram publicadas na quarta-feira (14) da semana passada através de uma instrução normativa conjunta assinada pelo ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, e os presidentes do Ibama, Eduardo Fortunato Bim, e do ICMBio, Fernando Lorencini.
Em entrevista ao O Globo, após repercussão negativa da carta dos servidores, o ministro Ricardo Salles afirmou que o objetivo da norma era acelerar processos, mas que o Ministério irá analisar a manifestação. “Se houver mesmo necessidade de ajuste, o faremos”, disse.
Desde a publicação da instrução normativa, ao menos três manifestações endereçadas às presidências das autarquias foram feitas para pedir que a norma seja revista. Uma feita por servidores do Ibama, outra pelos servidores do ICMBio e uma terceira pela Diretoria de Proteção Ambiental, do Ibama, assinada pelo diretor Olímpio Ferreira Magalhães. Segundo os servidores, a instrução normativa engessa o trabalho do dia a dia no momento em que as regras da norma anterior – que ajustou as normas após a criação dos núcleos de conciliação – começaram a ser implementadas.
“É como se nos mantivéssemos presos sempre a uma nova adequação”, reclama um fiscal para a reportagem de ((o))eco. A identidade do servidor será mantida em sigilo. Desde 2019, servidores da área ambiental federal estão proibidos de dar entrevista sem autorização prévia da assessoria de imprensa do Ministério do Meio Ambiente.
Servidores do Ibama protestam contra IN
Mais de 300 servidores de carreira do Ibama assinaram uma carta, publicada na segunda-feira (19), pedindo modificações na Instrução Normativa. Os servidores alegam que as normas inviabilizam o seguimento dos processos em todo país. Na carta, também endereçada ao presidente do Ibama, os servidores afirmam que as atividades nas autarquias estão paralisadas, pois não foram tomadas medidas prévias no sistema eletrônico para incorporar as inúmeras mudanças promovidas pela entrada em vigor da norma.
“Para evitar responsabilização aos servidores e de forma preventiva, estes estão apresentando suas razões no presente documento, à administração das autarquias executoras, IBAMA e ICMBio, para exercer o direito de recusa em iniciar procedimentos com a norma vigente e, muito menos com norma administrativa revogada, tendo em vista que não há meios disponíveis para o cumprimento dos prazos e, com o não cumprimento, há sanções previstas na Lei Federal 8.112/1990, podendo até o servidor ser demitido. Num completo descompasso com a situação das autarquias executoras da Política Nacional de Meio Ambiente, que vem sofrendo há anos com a diminuição no quadro de servidores, ao invés de realizar concurso público e assim prover os cargos vagos, a administração aprova norma que, sem meios para cumprir, pode levar a demissão de mais servidores”.
Em decorrência disso, todos os servidores que assinam a carta declaram que estão com suas atividades paralisadas pelas próprias autarquias. “Registramos que, no momento, os meios necessários para o estrito cumprimento do nosso trabalho não estão disponíveis e que todo o processo de fiscalização e apuração de infrações ambientais encontra-se comprometido e paralisado frente ao ato administrativo publicado. O resultado imediato e inevitável é a potencialização da sensação de impunidade, que é apontada como uma das principais causas do aumento do desmatamento na Amazônia, bem como de outros crimes ambientais no país”.
Em ofício de orientação, o Coordenador-Geral de Fiscalização Ambiental do Ibama, Ricardo José Borrelli, afirmou que a lavratura do auto de infração e a elaboração do relatório de fiscalização devem ser feitos com os procedimentos já estabelecidos, ou seja, usando a norma anterior, revogada pela nova. Para os servidores, fingir que a norma não mudou fere o princípio da legalidade do ato administrativo.
“Rogamos à toda a sociedade o apoio necessário para que haja, por parte dos gestores do MMA, IBAMA e ICMBio, uma atitude com vistas ao equacionamento do quadro de paralisação total imposto pela publicação da INC MMA/IBAMA/ICMBIO 01/2021 e para que não nos lancem convite em assumir riscos no cumprimento de atos sem a existência de norma vigente que nos ampare. Como já dito, isto é irregular, ilegal e configura mera tentativa de arrefecer uma crise administrativa sem precedentes que se instalou com a alteração da norma”, denunciam.
Na mesma direção, servidores do ICMBio encaminharam ontem uma carta endereçada ao presidente do ICMBio, Fernando César Lorencini, ao coordenador-geral de Proteção (CGPRO/ICMBio), Diego Bezerra Rodrigues, e ao diretor de Criação e Manejo de Unidades de Conservação (Diman/ICMBio), Marcos de Castro Simanovic, em apoio à manifestação dos colegas servidores do Ibama, levantando os mesmos pontos. Segundo os servidores do ICMBio, se a norma se mantiver, “será necessário um enorme esforço de readaptação de procedimentos, sistemas e capacitação, recomeçando quase do zero toda a dinâmica Fiscalização, Conciliação, Instrução e Julgamento de autos de infração no ICMBio e no Ibama”.
Diretoria de proteção pede revogação das novas regras
No início da noite desta terça-feira (20), o diretor de Proteção Ambiental do Ibama, Olímpio Ferreira Magalhães, pediu a imediata modificação de cinco pontos da Instrução Normativa: a do conceito de relatório de fiscalização; mudança nos prazos para contemplar excepcionalidades; permitir que outros agentes envolvidos na operação possam sanar pendências apontadas pela chefia e alteração de artigo para deixar claro que o relatório de fiscalização deixou de representar, necessariamente, a abertura do processo administrativo ambiental.
“Entendo que as mudanças em questão devem ser válidas imediatamente, tendo em vista a importância do tema. Feitas essas considerações, encaminho à apreciação e encaminhamentos pertinentes”, escreve Magalhães, em nota técnica encaminhada ao presidente do Ibama, Eduardo Bim.
Desde a chegada de Bolsonaro ao poder, em 2019, o número de autos de infração vem despencando. Em abril de 2020, Salles mudou toda a cúpula de fiscalização do Ibama após Bolsonaro se irritar com uma reportagem do Fantástico, da TV Globo, que mostrou os bastidores de uma megaoperação em Terras Indígenas no sul do Pará. Na ocasião, foram exonerados: o coordenador de operações de fiscalização do Ibama, Hugo Loss, um dos entrevistados na reportagem do Fantástico; o coordenador-geral de fiscalização ambiental, Renê Luiz de Oliveira; além do então diretor de Proteção Ambiental, Olivaldi Azevedo.
PV entra na briga
Não são apenas os servidores que pedem a mudança na instrução normativa. Os deputados Israel Batista (PV-DF), Célio Studart (PV-CE) e Leandre (PV-PR), todos do Partido Verde, entraram com um decreto legislativo para sustar a Instrução Normativa Conjunta. Segundo os deputados, é responsabilidade do parlamento sustar normas do Poder Executivo “que extrapolem seu poder regulamentar.”
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É uma palhaçada descabida e maldosa.
Tinha que ter o dedão do $alle$, Pode jogar fora.