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IPAM propõe destinar florestas públicas para frear o desmatamento na Amazônia

Pesquisadores defendem que ampliar a proteção de 80 milhões de hectares pode ser o principal legado do Brasil na COP30 e um passo essencial para estabilizar o clima no continente

Karina Pinheiro ·
16 de outubro de 2025

Às vésperas da COP30, que será realizada em Belém, dois dos principais pesquisadores do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM) propõem um caminho ambicioso para o Brasil consolidar sua liderança climática: ampliar a proteção das florestas amazônicas em até 80 milhões de hectares. A proposta foi apresentada em uma carta publicada na última terça-feira (14) na revista científica Nature por Paulo Moutinho e André Guimarães, diretores do IPAM.

Segundo os pesquisadores, essa expansão representaria “a maior contribuição individual de uma nação ao combate da crise climática”. Para eles, o país tem nas mãos uma oportunidade histórica de transformar áreas hoje vulneráveis em uma barreira estratégica contra o desmatamento e as emissões de gases de efeito estufa.

“Este pode ser o maior legado do Brasil para a COP30, em Belém, e para além dela. Ao promover essa expansão da área protegida na região, o país terá feito a maior contribuição individual de uma nação ao combate da crise climática”, afirma Moutinho.

Florestas públicas sob ameaça

O ponto central da proposta está na destinação das Florestas Públicas Não Destinadas (FPNDs). Cerca de 50 milhões de hectares que ainda não têm definição de uso estão sob domínio federal ou estadual. A legislação brasileira prevê que essas áreas sejam destinadas à conservação ou ao uso sustentável, mas, segundo o IPAM, o processo tem sido adiado há anos pelos governos regionais.

Durante essa indefinição, as FPNDs se tornaram alvos de grilagem, garimpo ilegal e desmatamento, problemas que se agravaram na última década. Dados do instituto indicam que essas áreas concentram 36,5% de toda a perda de vegetação nativa na Amazônia. Somente no primeiro semestre de 2025, mais de 69 mil hectares foram desmatados nessas florestas, enquanto outros 32,7 milhões de hectares permanecem sob risco.

Para Moutinho e Guimarães, destinar essas terras a unidades de conservação, terras indígenas, florestas estaduais ou federais de uso sustentável e áreas comunitárias é essencial para “fechar o mapa do desmatamento”.

Incentivos à conservação em propriedades privadas

A proposta do IPAM também inclui a proteção de 30 milhões de hectares adicionais de vegetação florestal fora das áreas públicas. Desse total, 20 milhões de hectares pertencem a pequenos proprietários rurais que poderiam receber apoio técnico e financeiro para preservar suas áreas e aumentar a produtividade em terras já abertas.

Outros 10 milhões de hectares correspondem a excedentes de Reserva Legal em grandes propriedades, ou seja, áreas que, pela legislação, poderiam ser legalmente desmatadas, mas que poderiam ser mantidas intactas por meio de programas de pagamento por conservação, como o Conserv.

“Considerando que mais de 90% da agricultura brasileira depende da chuva, proteger mais florestas e os serviços que elas prestam na formação das chuvas. É fundamental para garantir a segurança alimentar global”, ressalta Moutinho. “Com assistência técnica adequada, é possível intensificar a produção em áreas já desmatadas, enquanto os produtores são remunerados para conservar as florestas restantes.”

Rumo à COP30: legado e urgência

A destinação das florestas públicas deve estar entre os principais temas da COP30, marcada para novembro de 2025. O Brasil chega à conferência como anfitrião e sob expectativa de apresentar medidas concretas para cumprir suas metas climáticas.

Segundo cálculos do IPAM, se as florestas públicas não destinadas fossem destruídas, 19,1 bilhões de toneladas de CO₂ seriam liberadas na atmosfera, o equivalente a 51% das emissões globais anuais.

Para os autores da carta, evitar esse cenário e garantir a proteção dessas áreas pode definir o papel do Brasil na transição climática global. “A Amazônia é a chave da estabilidade climática continental. Proteger suas florestas não é apenas uma decisão ambiental, mas um imperativo econômico e social”, concluem.

  • Karina Pinheiro

    Jornalista formada pela Universidade Federal do Amazonas (UFAM), possui interesse na área científica e ambiental, com experiência na área há mais de 2 anos.

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