A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), do último dia 2 de março, de tornar nula a legislação aprovada pela Assembleia Legislativa de Rondônia (ALE-RO) que proibia a destruição ou inutilização de equipamentos em operações de combate aos crimes ambientais, expõe o leque de iniciativas semelhantes, aprovadas nos últimos quatro anos pelos parlamentos dos estados da Amazônia Legal. Lei com o mesmo teor foi sancionada em Roraima, cujo objetivo era proteger maquinários usados pelo garimpo, incluindo aeronaves.
Os dois casos são apenas um pequeno exemplo de força da agenda antiambiental comum nas Assembleias Legislativas da região. Parte das cadeiras são ocupadas por políticos ligados ou financiados pelo agronegócio, além daqueles que estão ideologicamente afinados com a principal corrente política nestes estados: o bolsonarismo.
Entre 2019 e 2022, embalados pela política bolsonarista de “deixar a boiada passar”, deputados estaduais (ou por vezes o próprio poder Executivo) apresentaram projetos de lei para fragilizar as leis locais de proteção ambiental. As propostas mais comuns estão no sentido de reduzir o poder de fiscalização das agências, além de acabar ou diminuir o tamanho de unidades de conservação.
O caso mais recente aconteceu em fevereiro, quando a Assembleia Legislativa de Mato Grosso aprovou em primeiro turno uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC 12/2022) que praticamente inviabiliza a criação de novas áreas protegidas no estado.
No caso de Rondônia, o governador Marcos Rocha (União) precisou apenas de uma canetada para revogar, às vésperas do segundo turno de 2022, a existência da Estação Ecológica Soldado da Borracha, localizada entre Porto Velho e Cujubim.
Os dois estados estão entre os maiores redutos do bolsonarismo no país, concentrando elevados índices de desmatamento e queimadas. A ofensiva contra o arcabouço legal de proteção do meio ambiente na Amazônia Legal se dá por meio dos instrumentos jurídicos mais convenientes.
Ainda em ato de ofício, o governador Marcos Rocha liberou o licenciamento do garimpo no rio Madeira, na região de Porto Velho. A atividade é bastante comum, sendo possível encontrar balsas de garimpo na região central da capital, aos olhos de qualquer um. Após recursos movidos pelo Ministério Público Estadual, o Tribunal de Justiça anulou partes do decreto.
Para conter os potenciais danos de tais medidas, recursos são impetrados junto ao Poder Judiciário para pedir as suas ilegalidades. As ações são movidas por organizações da sociedade civil, partidos políticos e os Ministérios Públicos em suas duas esferas: o Federal e o Estadual.
A inconstitucionalidade da lei rondoniense, que vetava a destruição de maquinários, foi definida pelo ministro Gilmar Mendes, e seguida pela maioria do plenário do STF. A lei foi aprovada pela Assembleia de Rondônia em dezembro de 2021. Ela tem como autor o deputado Alex Redano (Republicanos), um dos principais entusiastas da agenda antiambiental na Casa. Na ocasião, ele ocupava a presidência da ALE-RO.
A lei de Roraima que também proibia órgãos do Estado de destruírem equipamentos foi aprovada pela Assembleia Legislativa em maio de 2022. O Ministério Público Federal ajuizou Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) junto ao STF para anular a lei. O processo ainda está em análise pela Corte.
Em janeiro de 2021, o governador de Roraima, Antônio Denarium (PP), enviou para a Assembleia Legislativa projeto que implementou o licenciamento para a atividade de lavra garimpeira. Aprovada pelo Parlamento e sancionada por Denarium, a Lei 1.351/2021 estabelecia critérios menos rígidos para a emissão das licenças ambientais, permitindo até mesmo o uso do mercúrio.
A proposta não especificava para quais áreas haveria a concessão de exploração, o que geraria conflitos com a legislação federal. A partir de ação movida pela Rede, o ministro Alexandre de Moraes de forma liminar e monocrática anulou a validade da legislação.
O entendimento básico das ações movidas – e acatado na maioria das vezes pela Justiça – é o de que essas leis estaduais são inconstitucionais por se confrontarem com a legislação federal. Mesmo tendo consciência de que suas medidas correm o risco de serem anuladas pelo Judiciário, deputados e governadores bolsonaristas insistem em tais práticas – muitas das vezes apenas como aceno às suas bases eleitorais.
Se essas leis acabam por não ter efeito constitucional, na prática sua aplicação – mesmo que momentânea – representa graves danos à proteção ao meio ambiente. Incentivados pela sensação de amparo legal, muitos praticam crimes ambientais, em especial a invasão de áreas públicas, incluindo unidades de conservação e terras indígenas. Até os tribunais declararem a inconstitucionalidade, o estrago na floresta já está feito.
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Muito bom texto e comentário.
num país de faz de conta, por mais deploráveis que sejam as iniciativas de algumas casas legislativas estaduais, e dos próprios especuladores, criminosos ambientais, que surfam na esperança da impunidade, a lentidão da justiça apenas reforça a sensação dessa impunidade. Enquanto o Brasil não se tornar um país sério, em que as leis e a constituição são para valer, as lamentações dos ambientalistas, como eu e outros, serão inócuas. Triste e desanimador reconhecer essa realidade, que favorece aos que causam danos ao meio ambiente. Privatizam-se os ganhos às custas dos estragos ao meio ambiente – perda de todos – socialização dos prejuízos…