Belém (PA) – Lideranças indígenas do Baixo Tapajós, região paraense onde vivem 14 povos indígenas, consideram que estão sendo deixadas à margem de participação efetiva nos espaços da Zona Azul, onde se realizam as negociações e os eventos oficiais da COP30, em Belém. O sentimento foi expresso durante entrevista coletiva, realizada nesta quarta-feira (12), no campus da Universidade Federal do Pará (UFPA), onde buscaram esclarecer sobre o confronto ocorrido entre manifestantes e agentes de segurança na noite de terça-feira. Foi afirmado que não havia orientação ou intenção de promover vandalismo no local e, sim, de ocupar o ambiente pacificamente para ampliar a visibilidade das reivindicações e contribuições desses povos na luta global pelo equilíbrio climático.
“Se esta é a COP com maior participação histórica de povos indígenas, a gente esperava chegar à Zona Azul”, afirma Auricélia Arapium, reconhecida liderança feminina na região. “Nós somos a solução e precisamos estar na mesa de negociação. Queremos dialogar, mas eles se negam a ouvir o que temos a dizer”, argumenta em relação às lideranças governamentais e diplomáticas que estão costurando acordos na Conferência do Clima. Ela e outros líderes presentes na coletiva afirmaram que desejam falar com o presidente Lula e que não têm previsão de outros protestos.
Neves Arara Vermelha, Margareth Maitapu e o cacique Gilson Tupinambá, outras lideranças participantes da mesa durante a entrevista coletiva, também reforçaram que não houve orientação de promover desordem no local, apesar da revolta sentida pela falta de diálogo. “Nós não estamos contra o governo”, assegura o cacique.
Tupinambá ressalta que os territórios indígenas da região estão afetados por atividades incompatíveis com a proteção da natureza e de seus modos de vida, incluindo o garimpo e o agronegócio. Ele destacou, também, que há inúmeras deficiências na infraestrutura de saúde. “O soro está na cidade, enquanto a cobra está no território” compara criticamente. “Nossa luta é em defesa do território. Não temos bandeira política. Queremos que o estado brasileiro assegure saúde nas nossas comunidades e reconheça quem realmente faz gestão”, acrescenta.
“Precisamos que a população pare de nos julgar sem conhecer a realidade dos nossos territórios, pois já enfrentamos muito racismo”, ressalta Margareth Maitapu, referindo-se às repercussões negativas do episódio na Zona Azul. Ela diz ser fundamental que tanto a sociedade como os veículos de comunicação reconheçam o valor da luta dos povos indígenas em favor de todas as formas de vida e ajudem a disseminar as suas contribuições para o equilíbrio climático.
As lideranças também reafirmaram a importância da homologação dos territórios indígenas como ação política de enfrentamento da crise climática, reivindicação da NDC Indígena lançada pré-COP30. Da mesma forma, criticaram a lentidão de inúmeros processos que aguardam decisão política. “O governo alega que não tem recursos humanos e financeiros para as demarcações”, critica Arara Vermelha.
Em relação ao financiamento de projetos para fortalecer a sustentabilidade de territórios indígenas, as lideranças argumentam que os recursos não chegam efetivamente para atender essas demandas. Houve também críticas diretas ao Fundo Florestas Tropicais para Sempre (TFFF, na sigla em inglês), oficializado como uma importante deliberação da COP30. “Não queremos falsas soluções”, observa Auricélia Arapium. Ela compara essa iniciativa ao controverso mercado de carbono e diz que o governador do Pará, Helder Barbalho, está negociando créditos sem consulta aos povos indígenas, denuncia que tem reafirmado recorrentemente.
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