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Queimada iniciada em pasto atinge Estação Ecológica de Murici, em Alagoas

Incêndio iniciou na quinta-feira (2) e levou mais de 13 horas para ser contido. Multa para o proprietário da fazenda onde iniciou o fogo foi calculada em 312 mil reais

Carolina Lisboa ·
6 de dezembro de 2021 · 2 anos atrás

Um incêndio atingiu a Estação Ecológica de Murici (Esec Murici) no interior do estado de Alagoas, na tarde de quinta-feira (2). A brigada de incêndio do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) levou mais de 13 horas para conter o fogo, que se espalhou por um relevo de difícil acesso. As chamas foram iniciadas na Fazenda Jitituba e consumiram 26 hectares de mata no interior da Unidade de Conservação (UC) de Proteção Integral. A multa para o proprietário da Fazenda foi calculada em 312 mil reais.

Na sexta-feira (3), agentes ICMBio foram ao local para mensurar a área atingida dentro da Esec, e a partir daí calcular o dano ambiental e o valor da multa a ser aplicada. De acordo com Marco Antônio Freitas, analista ambiental e agente de fiscalização do ICMBio, a maior parte queimada foi de pastagem, mas o fogo também atingiu parte da Esec, entrando cerca de 100 a 150 metros na borda da mata e se estendendo por 4.4 km em linha reta, numa área chamada Serra da Santa Fé, entre as cidades de Murici e Messias. “O fogo começou no pasto da Fazenda Jitituba, no trecho leste da Esec de Murici, e terminou na Fazenda Santa Fé”, esclareceu o analista.

Freitas explica que, mesmo que o fogo não tenha sido causado pelo proprietário da fazenda, ele deve responder pelo ocorrido. “Todo proprietário de fazenda que fica em área de proteção é responsabilizado pelo fogo, seja ele qual for. Se tiver sido iniciado por um caçador, uma limpeza de pasto ou uma ponta de cigarro, ele é responsável por tudo o acontece no local. Então ele tem que zelar pela mata”.

Incêndio foi iniciado em uma fazenda. Foto: Marco Antonio Freitas/ICMBio.

O analista destacou que, no local atingido pelas chamas, não haviam mecanismos de proteção contra incêndios. “Uma propriedade que está dentro de uma reserva não pode deixar de ter um aceiro, que é uma estrada ou área limpa entre a mata e o pasto, que impede o fogo de se alastrar”.

Por fim, o analista avaliou que a área atingida deverá ser cercada, para que o trecho de mata atingida se regenere. “O que iremos recomendar dentro do processo administrativo que será instaurado pelo ICMBio é que ele [o proprietário] cerque a área novamente para evitar que o gado penetre na área de regeneração, e que ele faça um aceiro, mantendo limpo e com manutenção, para evitar futuros incêndios”.

A Esec Murici

A Estação Ecológica de Murici, criada em maio de 2001, possui 6.131,63 hectares, abrangendo parte dos municípios de Murici, Messias e Flexeiras, em Alagoas.

A Estação Ecológica é uma das categorias que se enquadram no grupo das UCs de Proteção Integral. Estas UCs têm como objetivo básico conservar biodiversidade, sendo admitido apenas o uso indireto dos seus recursos naturais. Mais especificamente, no âmbito das unidades classificadas como Estação Ecológica, é permitida apenas a realização de pesquisas científicas, e/ou a promoção de turismo ecológico com objetivos educacionais, quando devidamente disposto no Plano de Manejo, documento técnico com os objetivos gerais da UC, o qual estabelece seu zoneamento e normas.

Brigadistas combatem fogo na Esec de Murici. Foto: Divulgação.

A área da Esec Murici é considerada prioritária para a conservação de aves, sendo o habitat de pelo menos três espécies endêmicas, que são encontradas somente na Esec Murici: Pyrrhura griseipectus, Carpornis melanocephalus e Myrmotherula snowi, sendo que esta última conta com somente 20 indivíduos, sendo considerada a espécie de ave mais ameaçada de extinção do planeta. “Das 86 espécies de aves ameaçadas de extinção de todo o bioma Mata Atlântica, a gente cuida de 42 delas, que ocorrem na Esec Murici”, informou Marco Freitas.

Além disso, a Esec Murici é o último habitat da jararaca-de-murici (Bothrops muriciensis), a maior jararaca do Brasil, que, segundo Freitas, ocorre somente em um trecho de 2 x 2 km² dentro da Esec.

Na área da Esec havia, ainda, a ocorrência do limpa-folha-do-nordeste (Philydor novaesi), ave criticamente ameaçada de extinção que era encontrada apenas na Esec Murici e na Serra do Urubu. O último registro documentado da espécie foi em setembro de 2011, sendo considerada extinta em 2014.

A Esec Murici é a maior UC de Proteção Integral dentro da Mata Atlântica setentrional, o setor do bioma que está localizado ao norte do Rio São Francisco. De acordo com Marco Freitas, restam somente 2% da cobertura vegetal original da Mata Atlântica ao norte do Rio São Francisco, sendo esta a porção mais ameaçada de todo o bioma.

Estes remanescentes de mata, que compõem o chamado “Centro de Endemismo Pernambuco – CEP”, possuem a maior probabilidade de perda de espécies no bioma Mata Atlântica – que possui a cerca de 12% da sua extensão original – e, por isso, o CEP é reconhecido como uma das regiões do planeta onde os esforços de conservação são mais urgentes.

Foto: Marco Antonio Freitas/ICMBio.
  • Carolina Lisboa

    Jornalista, bióloga e doutora em Ecologia pela UFRN. Repórter com interesse na cobertura e divulgação científica sobre meio ambiente.

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