Estudo publicado nesta quarta-feira (18) na revista científica Ecosystems mostra que metade da vida marinha em recifes tropicais do Atlântico Sul não vai mais existir até o final do século, se o nível de emissão de gases estufa for mantido no patamar atual.
Liderado por pesquisadores brasileiros da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) e Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), o estudo criou um modelo matemático da cadeia alimentar dos recifes tropicais, algo inédito para as pesquisas da área, para entender como o aumento de temperatura do planeta afeta diretamente a alimentação e a vida marinha nesses ambientes.
O trabalho usou como base os cenários previstos pelo 5° Relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas da ONU, o IPCC – o anterior ao relatório divulgado na última semana.
O local escolhido para os estudos foi o Atol das Rocas, primeira reserva biológica marinha do país, a 150 km do arquipélago de Fernando de Noronha. “Por ser uma área protegida, os recifes do Atol são um laboratório do que seria um ecossistema natural, com mínima interferência humana direta”, explica Guilherme Longo, pesquisador da UFRN e co-autor do estudo.
O modelo criado pelos pesquisadores ao longo dos últimos 7 anos conseguiu comparar a biomassa de diversos organismos a cada ano, incluindo peixes, tartarugas, algas, corais e outros invertebrados, levando em consideração a eficiência daquele recife em circular energia e matéria.
A projeção indica que total de biomassa nos recifes do Atlântico Sul cai 1% sob o cenário otimista (RPC 2.6, considerado impossível de ser atingido no relatório mais recente do IPCC), 8% no cenário intermediário (RPC 4,5) e 44% no cenário de emissões atuais (RPC 8,5), fazendo com que toda a vida marinha do recife entre em colapso.
É uma reação em cadeia e com impactos em vários aspectos: a biomassa dos recifes transfere menos energia para o próximo animal da teia alimentar, a algas têm menos nutrientes, os peixes se tornam menos resistentes, diminuindo e fragilizando as espécies. “Os recifes correm o risco de se tornarem cidades-fantasma no mar, totalmente sem vida”, dizem os pesquisadores.
“O último relatório [do IPCC] acabou sendo bastante confirmatório em termos de cenário. O que ele faz é trazer uma robustez ainda maior nas predições anteriores [que serviram de base para o estudo], então, muda pouca coisa em termos das projeções de temperaturas. Tem cenários, como o RPC 2.6, que a gente simulou, que esse relatório já mostra que é praticamente impossível atingir”, explicou Longo, a ((o))eco. Segundo o relatório mais recente do IPCC, divulgado na última semana, o aumento da temperatura global vai atingir 1,5ºC em 2030, dez anos ante do previsto.
Apesar da emergência climática exposta no documento, Longo acredita que o quadro pode ser revertido. “O interessante é que tanto os relatórios do IPCC quanto nossas projeções mostram que os cenários mais drásticos vão ocorrer daqui a 20-30 anos, então, de certa forma, temos ainda algum tempo para mudar essa trajetória.”
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