A dois dias do segundo turno e a menos de uma semana para uma reunião internacional sobre mudanças climáticas no Quênia (África), o próprio presidente-candidato Luiz Inácio Lula da Silva divulgou quinta-feira, dia 26, a mais recente estimativa de desmatamento da Amazônia. Segundo uma projeção feita pelo Inpe, entre agosto de 2005 e agosto de 2006, sumiram 13.100 km2 de floresta, meio Alagoas.
O cálculo foi baseado na análise de 34 imagens de um total de 220 colhidas pelo Prodes, sistema usado pelo Inpe para monitorar a cobertura vegetal da Amazônia. Ano passado, o governo só divulgou os números do desmatmento para o período de 2004 e 2005 em dezembro, depois de estudar 77 imagens. Gilberto Câmara, diretor do Inpe, reconheceu que a divulgação foi um pouco precipitada. O motivo seria a realização da Convenção do Clima da ONU, marcada para 6 de novembro no Quênia, onde o o governo gostaria de anunciar a queda no desmate. No início de 2007 o Inpe deve divulgar os números finais, mas aposta numa variação de apenas 10%, que pode ser tanto para mais quanto para menos.
A taxa divulgada nesta quinta-feira é a segunda menor desde 1991 e representa uma queda de 30% em relação ao desmatamento registrado entre 2004 e 2005, que ficou em 18.790km2. Diferentemente dos anos anteriores, o governo não anunciou o quanto cada estado amazônico derrubou de floresta. E também não soube precisar o quanto de mata foi derrubado ilegalmente ou com autorização dos órgãos ambientais.
O que o governo admitiu é que aumentou o índice de desmatamento na região da Ferrovia dos Carajás, entre Pará e Maranhão. Lá , a floresta está virando carvão para abastecer as siderúrgicas do pólo produtor de ferro-gusa – apesar das ações de fiscalização na região. Outras áreas onde os desmates ilegais cresceram foram no norte do Mato Grosso e no centro-sul do Pará, além do extremo leste do Acre. “Mas evitamos a derrubada de um bilhão de árvores e a morte de 40 milhões de aves e de um milhão de primatas”, estimou a ministra do Meio Ambiente.
Marina Silva aproveitou para desfiar as ações do governo que, segundo ela, foram fundamentais para frear o desmate. Ela lembrou a realização de 11 operações de combate à corrupção na Amazônia, a prisão de 380 pessoas entre funcionários do Ibama, de órgãos estaduais, madeireiros e grileiros, a apreensão de 814 mil m3 de madeira e, ainda, a proteção de quase 20 milhões de hectares de floresta através da criação de parques e reservas federais – que ainda não foram consolidadas . “Seguramos o touro e baixamos sua cabeça. O desafio agora é o desenvolvimento sustentável”, disse.
Para isso, a ministra aposta na consolidação de três Distritos Florestais, onde madeira e outros produtos seriam obtidos com técnicas de manejo, planos de desenvolvimento sustentável como o da BR-163 , e na implementação de unidades de conservação com um total de quase 10 milhões de hectares. Além da entrada em vigor da Lei de Gestão de Florestas Públicas, vista por muitos como uma forma de privatização da floresta.
Outras ferramentas serão dois novos satélites que vigiarão a Amazônia com mais precisão, a partir de 2009. Os satélites norte-americanos Landsat e Modis, utilizados hoje pelo Inpe para calcular as taxas de desmatamento, deixarão de funcionar em 2007 e 2008, respectivamente. Um avião com equipamentos especiais também está sobrevoando a Amazônia e observando a floresta sob as nuvens.
Questionado sobre se a queda no desmate poderia ser atribuída só às ações do governo, Paulo Barreto, pesquisador do Imazon (Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia), afirmou que a redução foi importante, mas que as causas têm mais a ver com “condições do mercado”. “Por isso não temos garantia de continuidade. Mas a ação do governo deve ter tido algum efeito”, disse.
Segundo ele, até recentemente o governo estava aumentando multas, criando parques e reservas, mas como o mercado estava bom, o desmatamento seguia aumentando. “Agora, a principal diferença é a situação do mercado. Há influência de multas e unidades de conservação, mas é óbvio que o agronegócio foi muito importante nesse contexto”, completou.
Marina Silva não negou a influência da redução dos preços de commodities como a soja na queda do desmatamento, mas afirmou que a mesma seria insuficiente para reduzir as taxas de perdas de floresta aos níveis atuais. “Onde as ações (de governo) aconteceram houve pressão sobre a ilegalidade e queda no desmate“, afirmou.
Paulo Adário, coordenador da campanha Amazônia do Greenpeace, disse que a estimativa de desmatamento anunciada hoje tende a impressionar, mais foi sucinto: “A notícia é boa e seguramente reflete medidas do governo, mas não tomarei nenhuma champagne”, disse.
Para o ambientalista, 13.100 km2 ainda é uma área significativa de floresta perdida, rica em biodiversidade e com papel fundamental na regulação do clima global. “A média (de desmate) do governo Lula ainda é muito alta, só poderemos celebrar quando os fatores que levam ao desmatamento forem controlados. O agronegócio ainda é a base da balança econômica nacional”, ressaltou.
Falou grosso
Lula, que pouco ou nada fala sobre meio ambiente em seus embates televisivos com o candidato tucano, aproveitou o anúncio para rebater os boatos de internacionalização da Amazônia, ressuscitados por polêmica recente com o governo britânico. Segundo ele, “alguns países desenvolvidos” têm poucos conselhos a dar ao Brasil em termos de conservação, pois teriam aprendido a preservar só depois de desmatar seus territórios. “E muitos acordos internacionais voltados à proteção do meio ambiente e à redução da poluição não são implementadas por serem incompatíveis com a vontade ou com a ganância do crescimento econômico que querem alguns países”, disse.
Segundo o presidente-candidato, com o desmatamento em queda na Amazônia, o Brasil prova que é possível desenvolver e ao mesmo tempo preservar a região. “Devemos afirmar definitivamente que a Amazônia é brasileira, que o domínio soberano do nosso território é inquestionável. Quem quiser conhecer ou explorar a Amazônia tem que pedir licença para o Brasil. Não abriremos mão da Amazônia”. São Tomé, que tinha que ver pra crer, deverá passar em Brasília em 2007.
* Aldem Bourscheit é jornalista e trabalha como freelancer em Brasília.
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