Reportagens

Em defesa do Santo Antônio

Grupo de senhoras que prometeu limpar o rio em Nova Friburgo retirou 60 toneladas de lixo de suas águas com a ajuda de 200 voluntários. Ainda assim garantem: falta muito.

Nai Frossard ·
7 de agosto de 2007 · 18 anos atrás

As moradoras de Muri, em Nova Friburgo, mostraram que não estão para brincadeira. No último fim de semana vestiram luvas e galochas, se muniram de sacos plásticos, e em 48 horas removeram 60 toneladas de lixo do rio Santo Antônio, que corta a cidade serrana fluminense. De dentro d´água saíram móveis podres, pneus, latas velhas, carcaça de geladeira, troncos e galhos de árvores, latrinas quebradas e até um sutiã.

A ação, organizada por um grupo de senhoras, contou com o apoio de Corpo de Bombeiros, militares, Defesa Civil, prefeitura de Friburgo, concessionária da RJ 116 (Rota 116), Secretaria Estadual de Rio e Lagoas (Serla), Conselho Municipal de Meio Ambiente e muitos voluntários. Grande parte comparaceu no primeiro dia do mutirão: sábado. Mas mesmo com ajuda de quase 200 pessoas só foi possível limpar um terço do trecho previsto, tamanha a sujeira. Alair Muniz Cardoso, morador que contribuiu com a faxina, ficou em choque ao retirar uma latrina do rio: “Não tem condições, beira de rio não é para jogar lixo algum, muito menos uma privada!”, disse. Pois é, no Santo Antônio foram encontradas duas.

“Hoje cada vez mais dependemos da atitude pró-ativa das comunidades na solução dos problemas sócio-ambientais. Muito do lixo que encontramos tem valor, porque é material reciclável, como pneus e ferro. Se a comunidade vendesse o que foi jogado fora, podia ainda ganhar um dinheiro”, disse o presidente da Comissão Municipal de Meio Ambiente, Fernando Cavalcante.

Os 20 homens cedidos pelo Corpo de Bombeiros para o mutirão ficaram encarregados do corte de galhos e troncos de árvores entulhados no leito do rio. “Tem muita coisa para retirar, e esse é um trabalho que não se termina em dois dias”, afirmou o sub-tenente Ribeiro, comandante da equipe de Bombeiros.

“Estou muito contente porque o nosso sonho está sendo realizado, num movimento em conjunto com moradores, comunidade, autoridades, o que mostra que fomos ouvidas, acreditaram em nós e já estamos nos organizando para o próximo mutirão, em setembro”, disse Lenita Kaufmann, uma das líderes do grupo. A idéia é limpar toda a extensão do rio. “Isso é só o começo, é só uma gotinha do que podemos fazer”, garantiu Lenita.

“Todos estão de nota mil, a comunidade se integrou ao trabalho”, comentou a moradora Letícia Moraes. Mas para Maria Grilo, coordenadora do mutirão, a adesão poderia ter sido maior. “No sábado foi uma maravilha, tinham autoridades, muitos caminhões, hoje [domingo] não tem autoridades e não tem tantos caminhões. Nós moradores estamos tirando o lixo que ainda resta com a tropa, na mão”, disse Maria Grilo, que mesmo assim festejou o sucesso do trabalho: “ Foi altamente positivo, porque foi a primeira vez que nos unimos. Nós, mulheres de Muri, organizamos algo e tivemos êxito”.

Nas margens do rio foram plantadas centenas de mudas de árvores e flores. As organizadoras escolheram pinheiros, hortênsias e lírios para enfeitar o curso do Santo Antônio, ainda que nenhuma seja uma espécie típica da mata atlântica. “As hortênsias e os lírios não chegam a ser agressivos porque são plantas adaptadas à nossa flora, e elas estão sendo plantadas onde não existe mais mata nativa, perto da estrada, para embelezar e proteger a mata ciliar, impedindo a supressão voluntária.”, afirmou o assessor da vice-presidência da Serla, Alessandro Vianello. O plantio das mudas foi acompanhado e orientado por uma engenheira florestal do órgão.

“Foi exaustivo mas valeu muito a pena, e o que mais deu satisfação foi ouvir das pessoas ´dona, foi bacana, me avisa do próximo mutirão e conte comigo`. Começamos com força e vamos dar continuidade ao projeto”, informou Maria Grilo, uma das senhoras que avisou que se não houvesse participação das autoridades e apoio para retirar o lixo, colocaria todo o entulho no meio da estrada e sentaria em cima. Mas não precisou. Palmas para as mulheres de garra de Muri.

*É jornalista em Friburgo.

Leia também

Notícias
19 de dezembro de 2025

STF derruba Marco Temporal, mas abre nova disputa sobre o futuro das Terras Indígenas

Análise mostra que, apesar da maioria contra a tese, votos introduzem condicionantes que preocupam povos indígenas e especialistas

Análises
19 de dezembro de 2025

Setor madeireiro do Amazonas cresce à sombra do desmatamento ilegal 

Falhas na fiscalização, ausência de governança e brechas abrem caminho para que madeira de desmate entre na cadeia de produção

Reportagens
19 de dezembro de 2025

Um novo sapinho aquece debates para criação de parque nacional

Nomeado com referência ao presidente Lula, o anfíbio é a 45ª espécie de um gênero exclusivo da Mata Atlântica brasileira

Mais de ((o))eco

Deixe uma resposta

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Saiba como seus dados em comentários são processados.