Um grupo de empresários e entidades do setor de Tecnologia de Informação (TI) se reuniu ontem (3) em São Paulo para tentar entender o cenário do desenvolvimento de tecnologias verdes no Brasil e os desafios a serem enfrentados para alcançar melhor desempenho na cadeia de produção de equipamentos, com uso de insumos menos poluentes, diminuição de emissões e reciclagem de aparelhos, por exemplo. As dificuldades não são poucas.
No fim do ano passado, a União Internacional de Telecomunicações (UTI) informou que este ano o mundo bateria um recorde em telefonia móvel: seriam cerca de 4 bilhões de celulares em todo o planeta. O número foi alcançado pouco tempo depois do anúncio, em fevereiro passado, segundo a GSM Association, organização que reúne entidades do setor. No Brasil, de acordo com último levantamento da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), de abril deste ano, são 154,6 milhões de aparelhos, sendo 38 milhões em São Paulo.
A cada segundo, sete computadores são vendidos e, em 2012, a estimativa é de que haja dois bilhões deles no mundo. No Brasil, segundo levantamento divulgado em maio passado pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), a média é de um para cada três habitantes, o que representa cerca de 60 milhões de aparelhos.
Diante de tantos números, é inegável que mundo está cada vez mais conectado. Mas, por trás da crescente inclusão digital, um grave problema ambiental continua negligenciado: a alta emissão de gases de efeito estufa produzidos pelo setor e a falta de descarte adequado do lixo eletrônico.
Até hoje, o país não possui legislação federal que regule a cadeia de produção destes equipamentos ou a disposição de resíduos sólidos. Um projeto de lei está parado na Câmara desde 2007.
Atraso brasileiro
O setor de tecnologia de informação é responsável por cerca de 2% das emissões mundiais de gases de efeito estufa, número comparável ao da aviação civil. Por isso, há mais de uma década, o desafio de coordenar de maneira sustentável a produção de equipamentos tecnológicos foi assumido por vários países, como Alemanha, Estados Unidos e Japão. São determinações que abrangem várias etapas da cadeia de produção.
Em meados da década de 1990, a União Européia criou uma diretiva que obrigou empresas a recolherem e destinarem seus produtos de forma adequada. No Japão há legislação semelhante. Na Califórnia (EUA), desde 2006 é limitado o uso de substâncias agressivas na produção de eletrônicos. Há dez anos, o Reino Unido implementou uma norma sobre licitações públicas sustentáveis. E não são só os países desenvolvidos estão à frente neste sentido. A Coréia do Sul também tem sua lei para empresas de TI.
No Brasil, apenas dois projetos de lei tentaram regular o setor, o PL 4438/1998, do então deputado Paulo Paim (PT/RS), que traz, inclusive, responsabilidades aos consumidores sobre descarte de materiais, e o PL 2061/2207, do deputado Carlos Bezerra (PMDB/MT), considerado falho em aspectos que dizem respeito às obrigações do usuário e que, por isso, foi apensado ao projeto anterior. Desde 2007, os projetos não entram na pauta de votação. “Talvez o Estado esteja aguardando a pressão da iniciativa privada para se movimentar”, diz José Antônio Milagre, advogado especializado em Direito Eletrônico.
Segundo Milagre, São Paulo, Bahia, Mato Grosso, Ceará, Rio de Janeiro e Paraná já possuem leis ou projetos de lei sobre o assunto. No entanto, apesar de serem ações que visam suprir uma falha do governo federal, a iniciativa tem seu lado ruim. “[O governo federal] não pode deixar que os estados criem suas próprias leis, porque, assim, não haverá unificação nas normas e é preciso que haja um padrão a ser seguido”, defende.
Com esse atraso, o Brasil continua sem regulação das emissões na cadeia de produção e sem projetos de reciclagem de materiais eletrônicos. O resultado disso é o acúmulo de toneladas de sucata eletrônica contaminando o solo e as águas. Para se ter uma idéia do problema, somente as baterias de celulares são responsáveis por 80% do chumbo utilizado no mundo.
Entraves e alternativas
Atualmente, apenas algumas empresas isoladas de telefonia e de computação têm programas para diminuição de impactos ambientais em sua cadeia de produção e recolhem materiais obsoletos. Nokia e Dell são exemplos. Ambas recebem, inclusive, equipamentos de outras marcas para serem reciclados. Mas elas são exceções e encontram um forte oponente quando o assunto é reciclagem: o próprio consumidor.
Segundo pesquisa da Nokia, realizada em julho de 2008, a média mundial de pessoas que guardam aparelhos velhos em casa é de 44%. No Brasil esse número cai para 32%. Em nível global, 74% disseram que não pensam em reciclar seus telefones, apesar de que quase o mesmo número, 72%, achar que a reciclagem faz diferença para o meio ambiente.
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Segundo Jô Elias, diretora de comunicação da empresa, se cada um dos três bilhões de usuários de celulares no mundo (no ano passado) devolvessem para reciclagem um de seus aparelhos velhos, a economia de energia, matéria-prima e emissões seria equivalente a retirada de 4 milhões de carros das ruas. No Brasil, apenas 2% dos usuários de telefonia móvel reciclam seus aparelhos. “O setor precisa realizar uma força tarefa para solucionar esses problemas”, disse.
Várias são as ações apontadas como incentivo à implantação da chamada TIC (Tecnologia de Informação e Comunicação) Verde. Na lista, estão campanhas governamentais de conscientização do consumidor para a importância da reciclagem de materiais eletrônicos, adoção de critérios de sustentabilidade em licitações públicas, bônus do IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) para quem utiliza produtos recicláveis na produção, isenção de impostos no comércio de créditos de carbono – atualmente, as empresas que investem em produção limpa recolhem impostos pela alíquota máxima – e criação de instrução normativas para o setor.
Enquanto tais ações não são implementadas, pequenas atividades isoladas tentam tapar um pouco do buraco no setor. Entre os dias 12 e 14 de agosto, durante o 2º Congresso Nacional de TIC Verde, haverá postos de coleta de sucata eletrônica do Instituto de Engenharia de São Paulo, onde será realizado o encontro. Empresários do setor também estudam a criação de um portal, no estilo do Transparência Brasil (organização autônoma de combate à corrupção), listando empresas e locais de descarte. Por enquanto, continua a cargo de cada usuário decidir de quem compra e onde descartar seus equipamentos.
Atalhos:
2º Congresso Brasileiro de TIC Verde
Pontos de coleta de aparelhos obsoletos Nókia
Reciclagem de computadores
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