A chuva que caiu entre quinta-feira e sábado (18 a 20 de fevereiro) em Roraima serviu para amenizar o avanço dos incêndios que assolaram o estado durante dias. Apenas dois focos de calor foram identificados pelos satélites do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) nas últimas horas. Um número que contrasta com o dos dias anteriores. Durante a semana passada, mais de 380 focos de calor haviam sido registrados.
Um arco de fogo com centenas de quilômetros de extensão, formou-se no Noroeste de Roraima. “A região que a gente considera mais crítica, a que chamamos de Arco do Fogo de Roraima, começa em Iracema, na região de Campos Novos, depois passa por Mucajaí, desvia para Alto Alegre, passa por Amajari e vai até a fronteira com a Venezuela. É uma frente de assentamentos.”, afirma o comandante do Corpo de Bombeiros, coronel Paulo Sérgio.
O município mais atingido é Iracema, ao sul da capital Boa Vista, onde foram detectados no dia 15 de fevereiro, 129 focos de calor. A razão é simples, o município está na região do Apiaú, área crítica quando se fala em avanço de desmatamentos e queimadas em Roraima.
No projeto do Apiaú estão pequenos e médios agricultores, além de pecuaristas, que, sem acesso a outras tecnologias, ainda recorrem ao fogo para prepar a terra para o plantio. “É aquela cultura de preparar a terra com queimadas, apesar do esforço para o uso de alternativas ao fogo”, lamenta o coronel.
Ilha de Maracá
A ilha de Maracá fica na trajetória de um arco de fogo com centenas de quilômetros de extensão.Quando a chuva começou, a brigada de combate ao fogo da Estação Ecológica de Maracá estava pronta para se mobilizar e enfrentar o fogo que ia em direção à reserva. A brigada é formada por 14 índios contratados em comunidades próximas.
Havia duas frentes de incêncios, que vinham de dois projetos de Assentamento do Incra. Do Norte, o fogo do assentamento Trairão, em Amajari (RR), se aproximava da unidade de conservação. Ao Sul, as queimadas do assentamento Paredão, em Alto Alegre (RR), já estavam a 2,5 quilômetros da Ilha de Maracá.
Um sobrevôo na região demonstrou que, pelo menos por enquanto, o perigo foi afastado. A chuva apagou o fogo. “Estamos mais tranquilos, mas continuamos mobilizado e acompanhando a situação”, afirma o gerente de fogo da Estação Ecológica, Bruno de Campos Souza. Neste domingo, uma equipe do Instituto Chico Mendes e outra do Ibama partem para áreas próximas da unidade de conservação, para acompanhar a situação e orientar as comunidades. “Se for identificado que alguém queimou de proprósito, fazer a autuação”, conta Bruno Souza.
El Ninõ
Em relação a outros grandes incêndios ocorridos no estado, em 1998 e 2003, Roraima está mais preparado. Foram tomadas medidas antes mesmo que o fogo começasse. “Em 1998, a gente não tinha mecanismos de controle de avaliação em 98, mas em 2003 já tínhamos monitoramento por satélite”, afirma o comandante do Corpo de Bombeiros de Roraima.
O problema é que em Roraima se prefere apagar o fogo a evitar que ele seja acesso. No ano passado, o estado alterou o Código Floresta a revelia da lei federal, para permitir que agricultores continuassem a usar Áreas de Preservação Permanente para a produção. E o próprio secretário de Agricultura, Eugênio Thomé, afirmou durante uma audiência pública que o calendário de queimadas (que só deve começar em março, após início das chuvas) não deveria ser respeitado.
VEJA VÍDEO COM DECLARAÇÕES DO SECRETÁRIO
Roraima já estava aguardando o início dos incêndios neste mês de fevereiro. Desde o ano passado, sob fenômeno El Niño, uma forte estiagem atinge o estado e bastava apenas os agriculores ascenderem o pavio para o fogo começar a tomar conta do lavrado, nome regional dado as savanas, além das áreas de floresta. No dia 8 de fevereiro, quando foi instalado o Centro Integrado, com participação do Ministério do Meio Ambiente e órgãos estaduais, para coordenar as ações contra o fogo, municípios do estado já estavam sob situação de emergência, devido à falta d’água.
“Roraima está sob o efeito do El Niño e todo munda sabe, o agricultor sabe que a floresta tá seca, se queimar vai virar incêndio. Mesmo assim, queima, e ainda com agravante, queima ao meio dia e aí não tem controle e prejudica terceiros, porque sai para a floresta ou para lotes vizinhos, e queima cercas, casas, queima tudo.”
O fogo atinge também Unidades de Conservação. Dois focos de calor foram identificados dentre da Estação Ecológica de Maracá, no município de Amaraji (RR). O assentamento do Paredão, a alguns quilômetros da Ilha, é um dos mais atingidos pelo fogo. Para proteger as Unidades de Conservação, o Instituto Chico Mendes enviou duas aeronaves de combate ao fogo para Roraima. Uma delas com capacidade para 3 mil litros de água. A outra pode levar 2 mil litros.
O instituto conta também com quatro brigadas treinadas para combater o fogo dentro de áreas protegidas. O Ibama também enviou equipes para Roraima. Um helicóptero do PrevFogo atua em assentamentos do Incra. Além disso, existem cinco brigadas treinadas pelo instituto trabalhando nos estado. Um avião Cessna para monitoramento do Corpo de Bombeiros do Distrito Federal também ajuda no combate aos incêndios.
Enquanto isso, a Defesa Civil, tenta amenizar o sofrimento das pessoas. Desde o ano passado, cerca de mil bebedouros para animais foram construídos e dezenas de poços artesianos construídos. Onde não é possível a perfuração, são usados caminhões-pipa. É o caso de Pacaraima (RR), na fronteira com a Venezuela, e bairros mais elevados de São João do Baliza (RR), sul do estado. Em São João, a opção pelos caminhões foi escolhida após a tentativa frustrada de perfuração de um poço com 180 metros de profundidade. “Sem estudos geológicos, aí é preciso ficar na adivinhação e o solo ainda é rochoso”, afirma o comandante do Corpo de Bombeiros.
*Vandré Fonseca é repórter em Manaus
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