Na semana passada, a ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, afirmou que o desmatamento na Amazônia em 2010 será “o menor do menores”. Ela falou isso baseada em dados preliminares do Deter, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Anunciou, satisfeita, que entre agosto de 2009 e maio de 2010, o desmatamento na região caiu 47% em relação ao mesmo período do ano anterior.
No entanto, a ministra poderia ter tido mais cautela em suas afirmações, dizem especialistas. “Torcemos para que as previsões dela estejam corretas, trabalhamos para isso, mas fazer este tipo de afirmação baseada em dez meses de dados é muita futurologia. Ainda faltam dois meses que podem revelar muito mais desmatamento”, afirma Marcio Astrini, da Campanha da Amazônia do Greenpeace.
“Dizer que o desmatamento ficará abaixo dos 7.464 km2 divulgados pelo governo no ano anterior é arriscado, pois precisamos esperar os próximos dados de julho de 2010 para termos melhor previsão”, afirma Sanae Hayashi, pesquisadora do Imazon e coordenadora técnica do Sistema de Alerta do Desmatamento do instituto (SAD). Dalton Valeriano, pesquisador do Inpe, afirmou ao jornal Folha de S. Paulo que deduzir a queda do desmatamento pelos dados preliminares do Deter é “especulação”.
Os dados do Deter devem ser confirmados pelo Prodes, sistema mais preciso do mesmo instituto que fotografa durante a seca e que detecta desmates em áreas de até seis hectares. O desmatamento pequeno tem representado, de acordo com o Inpe, 60% do total de desmates na floresta.
A afirmação da ministra ocorreu uma semana antes da divulgação, pelo Imazon, do Boletim Transparência Florestal. Contrapondo os dados “otimistas” da ministra, o instituto afirma que, em junho de 2010, o SAD detectou 172 km2 de desmatamento na Amazônia Legal, o que representa um aumento de 15% em relação ao mesmo mês do ano passado. Já de agosto de 2009 a junho de 2010, o desmatamento acumulado foi de 1.333 km2 – um aumento de 8% em comparação com o período entre agosto de 2008 e junho 2009. Em junho de 2010, 67% do desmatamento ocorreu no Pará, seguido por Amazonas (13%) Mato Grosso (10%), Rondônia (8%), Acre (1%), Roraima (0,5%) e Tocantins (0,5%).
Sanae Hayashi explica a diferença entre os números do Deter e do SAD. “Primeiro é preciso entender o que cada sistema considera como desmatamento”. De acordo com ela, para o Deter, regiões desmatadas são as que apresentam vários níveis de degradação como exploração madeireira, floresta queimada e corte raso. Já para o SAD, desmatamento são as áreas que tiveram corte raso, ou seja, supressão total da floresta com exposição do solo.
“Em agosto de 2008 teve muita área degradada (exploração madeireira e floresta queimada) e pouca de corte raso. Por isso, dentro deste período, o Deter apresentou números elevados de desmate, enquanto que o SAD detectou baixo valor desmatado. Como os dados de desmatamento acumulado do atual calendário (agosto de 2009 a junho de 2010) são comparados com os de mesmo período do ano anterior, então os dados do Deter apresentam maior redução, já que o valor da área desmatada em agosto 2008 foi super alto, conforme os padrões do Deter. E, por outro lado, os dados do SAD apresentam pequeno aumento, já que os números absolutos não diferenciaram tanto de um ano para outro”, explica.
Daqui para frente
Diante destes dados, fica a pergunta: para onde caminhará o desmatamento na Amazônia daqui para frente? “Ele vem diminuindo por causa de uma série de medidas de mercado e públicas, como o corte de créditos, a moratória da soja, a questão da pecuária, a crise econômica. O resultado foi um decréscimo do desmate nos últimos quatro anos. No entanto, existe uma ofensiva estabelecida em 2010, que é a tentativa de mudança do Código Florestal. Este tipo de ação tem um efeito negativo muito grande no combate ao desmatamento”, afirma Astrini.
“O perdão do que já foi feito sinaliza a possibilidade de perdão no futuro. A expectativa de fragilizar a reserva legal é outro fator que pode levar a mais desmatamento”, complementa Paulo Barreto, pesquisador do Imazon, em uma referência às mudanças propostas na reformulação do Código Florestal.
Clique aqui para entender as propostas feitas pelo deputado federal Aldo Rebelo (PCdoB-SP).
Em alguns lugares, a corrida pelo desmate já tem aumentado. Nos seis primeiros meses deste ano foram dadas 260 autorizações para desmatamento no Tocantins, contra 350 de todo o ano passado. “Temos notado uma demanda crescente de pedidos. Quando perguntamos por que querem desmatar, uma das razões expostas é em relação à moratória de cinco anos para novos desmates proposta na discussão do Código Florestal”, afirma Denílson Bezerra Costa, diretor de Recursos Florestais do Instituto Natureza do Tocantins (Naturatins). Até o final do ano, este estado já terá emitido no mínimo 500 licenças para desmate, a maioria delas para a abertura de pastagens.
Portanto, todo cuidado é pouco ao se falar em desmatamento; há muito mais coisas em jogo para determinar o futuro do desmate na floresta do que os dados preliminares divulgados pela ministra.
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