Manaus – A senadora Marina Silva, candidata à presidente pelo Partido Verde, foi sabatinada pelo Fórum Amazônia Sustentável, no sábado, 14 de agosto, no auditório da Universidade Federal do Amazonas (Ufam), em Manaus. Durante o debate, defendeu um plano estratégico de infra-estrutura para a Amazônia, que coloque no mesmo nível de importância a viabilidade econômica e a ambiental.
Esta foi a segunda sabatina com candidatos à presidente realizada pelo Fórum. Plínio de Arruda Sampaio (PSOL) já havia sido ouvido em Belém. A sabatina de José Serra (PSDB) está marcada para o dia 19 de agosto. Dilma Roussef (PT) confirmou que vai participar, mas não definiu uma data para o debate.
“Os atuais investimentos tratam problemas sociais e ambientais como externalidades, mas não necessidades importantes. É preciso compreender que a viabilidade econômica e a ambiental fazem parte da mesma realidade, sobre o risco de repetir as mesmas tragédias do resto do Brasil”, afirmou a senadora.
Um exemplo destes erros, segundo Marina Silva, é a Usina Hidrelétrica de Belo Monte. A obra não tem sequer viabilidade econômica, tanto que é subsidiada pelo governo federal, de acordo com ela. “Não é uma comédia cometer os mesmos erros de anos atrás, como em Belo Monte, onde erros apontados há 20 anos ainda não tiveram solução”, criticou.
Marina alternou elogios ao presidente Lula e críticas à política ambiental e às ações voltadas à Amazônia do governo. Demonstrou que, caso eleita, vai seguir as diretrizes que defendia quando era ministra do Meio Ambiente, mas abandonadas pela administração federal.
Marina pretende retomar o Plano Amazônia Sustentável, lançado quando ela era ministra. O Plano trazia cinco eixos estratégicos, conforme explicou a senadora: programas de desenvolvimento sustentável, gestão ambiental e ordenamento territorial, inclusão social, infra-estrutura e um novo padrão de financiamento para a região.
“Infelizmente foi entregue ao ministro Mangabeira Unger, que ignorou os eixos estratégicos e se concentrou no ordenamento territorial, esquecendo que reordenamento não é apenas distribuir terras”, criticou Marina, demonstrando descontentamento também com o Programa Terra Legal. “Quase três vezes o patrimônio do Banco do Brasil foi entregue a particulares”, protestou.
Meio Ambiente e Desenvolvimento
A senadora defendeu que a proteção do Meio Ambiente não é um entrave ao desenvolvimento e destacou que o rigor no licenciamento evita atrasos em obras importantes devido a problemas na Justiça. De acordo com ela, entre 2002 e 2008, quando esteve no ministério, o número de licenças ambientais concedidas por ano dobrou. “Por fazer bem-feito, as pessoas começaram a reclamar. A vantagem é que não iam para a Justiça”, destacou.
Para a candidata verde, é preciso mudar o modelo de ocupação da floresta amazônica, a fim de serem evitados erros que estão levando à destruição do cerrado e da caatinga. Marina Silva acredita que a Amazônia representa um cenário único para um novo caminho de desenvolvimento, que significa também a redução nas emissões de carbono e preservação da floresta e biodiversidade. “Sem os índios e sem a floresta, perdemos a vantagem competitiva da região”, afirmou a candidata.
Ela se posicionou contra a reconstrução do trecho não consolidado da BR-319, entre Manaus e Porto Velho, apesar de conhecer o apoio que a obra recebe dos políticos do Amazonas. O governo federal recupera a rodovia, mas as obras em um trecho de 400 quilômetros ainda aguardam o licenciamento ambiental. Para a ex-ministra a hidrovia do Rio Madeira e a BR-163 (entre Cuiabá e Santarém) tornam a BR-319 é desnecessária.
“Podemos recuperar os trechos já consolidados. Mas no trecho não consolidado, há um alto impacto ambiental. Como não vai haver atividade econômica, a recuperação não se justifica apenas para pessoas passearem de carro. É melhor subsidiar passagem de avião”, propôs a senadora. Ela colocou em dúvida os interesses de quem defende a recuperação da BR-319 e comparou a recuperação da rodovia ao processo de o licenciamento da BR-163, entre Cuiabá (MT) e Santarém (PA).
Quando Marina Silva chegou ao ministério, havia pressão para que a estrada fosse asfaltada. As obras foram suspensas, enquanto era elaborado um plano sustentável para o entorno. Mas no fim, as obras não foram para frente. “Mesmo com a licença, a BR-163 não entrou como prioridade do PAC, a construtora desistiu e os governos pararam de pressionar”, recorda. “Foram 18 milhões de hectares de Áreas de Preservação ao Longo da rodovia, áreas indígenas… Será que por isto, perderam o interesse pela estrada?”, questionou Marina.
Código Florestal
A candidata criticou o relatório apresentado por Aldo Rebelo (PC do B) sobre o Código Florestal. “Estão querendo mudar o teste, em vez de passar por ele”, declarou. “Este relatório é um dos piores retrocessos na legislação brasileira, principalmente para as florestas. Ele revoga o artigo primeiro, que diz que florestas são bens sociais. Estão dizendo que as florestas não são bens de todos, mas só de alguns”, lamentou.
Para ela, o Código precisa incorporar a Constituição de 1988, a Lei de Gestão de Florestas e a Lei de Crimes Ambientais. A proposta apresentada por Aldo Rebelo não atende a economia de Carbono do século XXI, na visão da senadora, que espera uma nova proposta de alteração da lei a ser apresentada pelo governo federal.
Ela foi questionada sobre a proposta de construção de um porto próximo ao Encontro das Águas, em Manaus. “O Estudo de Impacto Ambiental deveria ter apresentado alternativas. O porto é importante, não significa que tenha que ser construído em detrimento de populações que estão ali”, declarou.
A senadora se declarou uma candidata programática, em contraponto ao que chamou de alianças pragmáticas lideradas por PT e PSDB. Uma aliança como com base em programa de governo, segundo Marina Silva, só pode ser feita por ela, pois os dois partidos se tornaram reféns do fisiologismo do DEM e do PMDB. “É preciso uma política de longo prazo para o curto prazo dos partidos, no lugar de uma política de curto prazo para o longo prazo dos partidos”, discursou.
Ela lembrou do esforço para aprovar a Lei de Concessão de Florestas Públicas, implantada quando era ministra. Lembrou também das críticas que recebeu do geógrafo Aziz Ab’Saber, mas manteve a postura em favor da idéia. “O Capital político não deve ser usado apenas para aumentar o capital político, mas para investir no que realmente possa fazer diferença”, declarou. Ela propôs avanços no projeto. “O Serviço Florestal Brasileiro deveria ser para a economia da floresta o que a Embrapa é para a agricultura”, defendeu.
E não deixou de criticar os adversários: “Querem nos convencer que precisamos só de bons gerentes. Mas precisamos é de visão estratégica. Um grande estrategista consegue bons gerentes”. E finalizou: “Os Estados Unidos tiveram que escolher entre um negro e uma mulher. Nós temos a chance de escolher uma mulher negra, que nasceu no Norte”.
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