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Entrevista: Gerald Schotman, cientista-chefe da Shell

Especialista defende estratégia da empresa de diminuir impacto de combustíveis fósseis e fazer transição gradativa para energias limpas.

Fabíola Ortiz ·
12 de março de 2013 · 12 anos atrás
Geraldo Schotman, durante evento promovido pela Shell. Foto: divulgação
Geraldo Schotman, durante evento promovido pela Shell. Foto: divulgação

Só em 2011, a gigante petrolífera holandesa, que opera em 80 países, teve um lucro de 31 bilhões de dólares e produziu 2% da produção mundial de petróleo e 3% de todo o gás produzido no mundo.

Em uma conversa franca, o cientista chefe da empresa deu exemplos de energias mais limpas no mundo e afirmou que as projeções para 2050 apontam para uma fatia das energias alternativas que chegará a 30% do total gerado no mundo.

Em 2012, pela primeira vez, espera fechar as contas com produção maior de gás natural do que petróleo, enquanto em 2011, a fatia do gás ficou em 48% da sua produção total.

A partir de 2011, a Shell fez uma parceria com a Cosan para produzir etanol. Juntas, criaram a marca Raízen, que já comercializa mais de 2 bilhões de litros por ano de etanol produzido no Brasil a partir de cana-de-açúcar – que gera teor mais baixo de carbono.

Schotman ainda falou sobre a polêmica da exploração de petróleo no Ártico. Segundo estimativas da US Geological Survey, o Ártico armazena até 30% do gás natural e cerca de 13% do petróleo mundial ainda não descobertos. Acredita-se que mais de 80% destes recursos estão localizados offshore.

No relatório de sustentabilidade da empresa, a “Shell reconhece que há uma certa oposição pública em relação ao futuro desenvolvimento dos recursos energéticos presentes no Ártico”, mas que mesmo assim não pretende paralisar sua operação.

((o))eco – É possível pensar em um futuro sustentável para o setor energético com a chamada “energia limpa”?
Gerald Schotman – Sim, acho que isso é possível, mas claramente ainda não estamos lá. A questão é que o mundo precisa de muita energia e de fazer isso o mais acessível, seguro e aceitável. Ou seja, como equilibrar os custos e torná-la uma energia verde. É muito mais que emissões de CO2, estou incluindo água e a nossa pegada ecológica, por exemplo. Uma mudança nesse sentido é passar a usar mais gás natural.

((o))eco – Quais exemplos o senhor pode dar sobre energias mais limpas?
Gerald Schotman – Há um exemplo no Catar, no Oriente Médio, onde temos uma usina de GTL (Gas-to-Liquids, ou gás para líquido, um processo que transforma gás natural em combustíveis líquidos). Essa usina foi projetada para não usar água doce de zonas áridas e não há intercâmbio de água com o ambiente externo. Isso mostra que é possível ter soluções de energia que não requerem água, e soluções de água que não requerem uma grande quantidade de energia.

Outro exemplo ainda é de pequeno porte, mas pode funcionar bem em larga escala. Em Omã, também no Oriente Médio, o desafio está em conseguir extrair mais dos reservatórios (de óleo). É possível fazer isso através da injeção de vapor. Assim, nos unimos a uma empresa que faz painéis solares que concentram a luz de espelhos para aquecer estufas, as quais geram vapor, que, por sua vez ajuda a extrair mais dos reservatórios.

((o))eco – Na Shell, qual é a fatia da produção energética a partir de fontes alternativas?
Gerald Schotman – Em 2050, o mundo precisará dobrar a sua capacidade de geração de energia em relação a hoje. A quantidade de energias alternativas no mundo é, em media, entre 3 e 4 %, alguns países têm mais, outros menos, mas é pouco. A projeção no mundo é que as alternativas devem crescer para 20 ou 30% do total em 2050. Ainda assim, 70% da demanda de energia terá que vir dos combustíveis fósseis. Na Shell, não optamos entre o fóssil ou alternativa. Ao mesmo tempo que é preciso ter uma agenda forte na área de alternativas, estamos investindo na segunda geração de biocombustíveis, de como evitar desperdício e gerar energia a partir daí. Os investimentos da Shell em tecnologia ultrapassam US$1,1 bilhão por ano nos últimos 5 anos.

((o))eco – O que a Shell vislumbra no campo das alternativas no Brasil?
Gerald Schotman – Aqui no Brasil são os biocombustíveis. Temos uma sociedade com a Cosan. Usamos a chamada tecnologia de segunda geração de biocombustíveis e assumimos um compromisso de não competir com alimentos e em ser “water neutral” (neutro em relação à utilização de água).

((o))eco – A exploração da Shell de petróleo no Ártico é alvo de críticas por parte de entidades ambientalistas, que querem frear essa iniciativa. É viável explorar petróleo no Ártico?
Gerald Schotman – O Ártico é uma área intocada e é correto que as pessoas estejam preocupadas e queiram saber os impactos na região. Ainda não estamos na fase de desenvolvimento, estamos na fase de prospecção e acreditamos ter princípios claros. Há décadas sabemos como operar e lidar com estes tipos de ambiente. Vamos continuar acompanhando o debate com as pessoas que estão preocupadas, vamos continuar sendo abertos e transparentes. Mas, sim, acreditamos que é viável trabalhar naquele ambiente e vamos demonstrar isso.

  • Fabíola Ortiz

    Jornalista e historiadora. Nascida no Rio, cobre temas de desenvolvimento sustentável. Radicada na Alemanha.

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