No dia 16 de fevereiro, quando o Protocolo de Kyoto entrou em vigor, a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, cedeu 25 minutos da sua agenda à jornalista Miriam Leitão para falar sobre as principais questões ambientais do país. A entrevista foi ao ar em horário nobre, no programa Espaço Aberto, da Globonews. A ministra, que se esquiva quando pode da imprensa, discutiu o desmatamento na Amazônia, a pavimentação da BR-163 (Santarém-Cuiabá) e a transposição do rio São Francisco.
Com o gancho de Kyoto, a entrevistadora começou a conversa comentando que as queimadas e os desmatamentos já correspondem a 2/3 das emissões brasileiras de dióxido de carbono e perguntou à ministra como ela lida com as criticas feitas a ela por aliados políticos e amigos pessoais. Para Marina Silva, o governo Lula criou uma grande expectativa em todo o povo brasileiro e a ansiedade gera críticas. Em defesa própria, disse que desde que ingressou no ministério tem se preocupado com “questões estruturantes” e não com “pirotecnia”.
Marina falou que os trabalhos de sua equipe estão embasados em quatro diretrizes básicas: desenvolvimento sustentável, controle e participação social, fortalecimento do sistema nacional de meio ambiente e desenvolvimento da política ambiental integrada como os demais ministérios. Para ela, é compreensível que a população não consiga ver os resultados imediatos desse trabalho e, por isso, critique a sua gestão.
Para a ministra, o meio ambiente está ligado à dinâmica do desenvolvimento e o governo atual tem incorporado a variável ambiental no planejamento de sua ações. O combate ao desmatamento na Amazônia seria um exemplo claro da eficácia dessa força-tarefa. Segundo Marina, nunca houve tanto empenho de um governo para resolver a questão e 15 ministérios estão envolvidos em mais de 140 ações para combater as derrubadas. Os investimentos totalizam 390 milhões de reais. Ainda assim, ela é a primeira a reconhecer que os números desmatamento continuam vergonhosos.
A cobiça por terras na Amazônia, associada à ausência do Estado na região, levou ao assassinato da irmã Dorothy Stang. Marina fez questão de ser cuidadosa ao comentar o assunto para não culpar nenhum setor pelo crime. “Existem pessoas de bem com agendas positivas na região”, afirmou a ministra. Quanto ao recente embate com madeireiros e fazendeiros no Pará, provocado por decisões do governo federal de suspender planos de manejo florestal e recadastrar lotes agrários, Marina Silva negou que tenha cedido diante da reação dos dois grupos. “Não recuamos um milímetro sequer no que diz respeito ao projeto inicial”, atestou.
Marina comentou também o projeto de gestão de florestas públicas que o Governo enviou nesta quinta-feira,17 de fevereiro, em regime de urgência ao Congresso. O documento determina que as florestas poderão ser exploradas a partir de concessões de uso, ganhas por quem apresentar o melhor projeto de manejo e puder gerar mais empregos. Ela comparou o processo de licitação à maneira como é feita a exploração de petróleo no país. Segundo Marina, esse nível de organização vai incentivar a legalização das atividades na Amazônia Legal. Em dois anos de governo, o número de planos de manejo aumentou de 300 mil para 1 milhão e 300 mil.
A ministra também lembrou dos 500 mil km2 de terras já desmatadas que estão abandonadas e que devem servir para desenvolver a região amazônica sem que seja preciso desmatar mais. Afirmou ter “um compromisso visceral com a causa” e que “a questão está no coração do governo”. Por isso estaria sendo bem tratada.
Miriam Leitão aproveitou para perguntar se será possível proteger a Amazônia depois da pavimentação da BR-163, que liga Cuiabá a Santarém. A ministra afirmou ser impossível asfaltar a estrada sem que haja um plano de desenvolvimento sustentável e sem a criação de Unidades de Conservação no entorno. Para ela, essas serão as “estacas necessárias para que a estrada se preste apenas à finalidade a que ela foi criada”.
Os últimos minutos da entrevista foram dedicados ao projeto de transposição do rio São Francisco. Marina Silva disse que o Ministério do Meio Ambiente só é responsável pelo licenciamento da obra e pela revitalização do rio. Quando perguntada sobre o número irrisório de mudas que seriam plantadas às margens do Velho Chico – 2 mil por ano – a ministra respondeu que isto é apenas o início, depois certamente o número aumentará. Disse ainda que os ministérios do Meio Ambiente, Integração e das Cidades investirão juntos 500 milhões de reais no projeto. Sua pasta será responsável pela recuperação de 3 mil nascentes, pela criação de 2 milhões de hectares em áreas de conservação e pela recuperação de matas ciliares. Por fim, disse que a revitalização será feita independentemente do projeto de integração da bacia. Tomara que não seja apenas otimismo governista.
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