Reportagens

Aquecimento bate 1,2ºC em 2016

Organização Meteorológica Mundial afirma que este ano tem 95% de chance de ser o mais quente da história e que cumprir meta de 1,5oC do Acordo de Paris exigirá esforço “dramático”

Claudio Angelo · Camila Faria ·
14 de novembro de 2016 · 8 anos atrás
Maxx Dilley (esq.) e Petteri Talaas (centro), da OMM, explicam a tendência de temperatura de 2016. Foto: Claudio Angelo/OC.
Maxx Dilley (esq.) e Petteri Talaas (centro), da OMM, explicam a tendência de temperatura de 2016. Foto: Claudio Angelo/OC.

O aquecimento da Terra nos primeiros nove meses de 2016 chegou a cerca de 1,2oC acima da média pré-industrial e há hoje 95% de chance de que o ano termine batendo o recorde absoluto de mais quente desde o início dos registros.

O recado vem da Organização Meteorológica Mundial, que lançou nesta segunda-feira na COP22, em Marrakesh, seu balanço anual preliminar O Estado do Clima.

Segundo o documento, as temperaturas globais entre janeiro e setembro foram 0,88oC mais altas que a média do período 1961-1990, e cerca de 1,2oC maiores que a média pré-industrial. Em 2015, o planeta atingiu 1oC acima da média pré-industrial. Em algumas regiões do Ártico russo, as temperaturas chegaram a 7oC acima da média.

Recordes de eventos extremos foram batidos novamente ao longo de todo o ano: no verão, uma localidade no Kuwait atingiu 54oC, a temperatura mais alta já registrada na Ásia; a Tailândia bateu seu recorde absoluto, com 44,6oC; furacões atingiram o Sudeste Asiático, as ilhas do Pacífico, a Coreia do Norte e o Caribe, com o furacão Matthew encabeçando a lista das tempestades mais letais: 546 mortos no Haiti. A única porção de terra do mundo com temperaturas abaixo da média neste ano foi uma região entre o norte da Argentina, o Paraguai e a Bolívia.

Um relatório do Banco Mundial lançado também nesta segunda-feira em Marrakesh dá uma dimensão dos impactos desses extremos: segundo o banco, o prejuízo causado por desastres naturais no mundo tem sido subestimado em 60%: as perdas em consumo chegam a US$ 520 bilhões 26 milhões de pessoas são empurradas para a pobreza todos os anos.

Alta velocidade

O salto de 0,2oC em apenas um ano é uma mudança de marcha desde o início das medições globais com termômetros, em 1880. Daquela época até 2012, o planeta aqueceu 0,85oC e, de 2012 a 2015, 0,15oC.

De acordo com o secretário-executivo da OMM, Petteri Talaas, a tendência atual de aquecimento foi turbinada pelo forte El Niño de 2015/2016, que além de elevar a temperatura dos mares causou uma série de outras perturbações nos ecossistemas que ajudaram a impulsionar ainda mais a subida do termômetro global. Alguns desses fenômenos, como os megaincêndios florestais do Canadá deste ano, ainda mantiveram as emissões de CO2 em alta, mesmo com uma estabilização no setor de energia em 2015.

As temperaturas seguem elevadas mesmo nos últimos meses, com a reversão do El Niño para La Niña, quando as águas do Oceano Pacífico resfriam. “É provável que a temperatura não seja tão alta no ano que vem”, disse Maxx Dilley, chefe de Previsão de Clima e Adaptação da OMM. No entanto, prosseguiu, “a mudança está acontecendo muito mais rápido que a capacidade do processo de acompanhar”.

O “processo” a que Dilley se referiu é o Acordo de Paris, o único mecanismo internacional já proposto para enfrentar a mudança do clima. O acordo está tendo os detalhes de sua implementação rascunhados na COP de Marrakesh, que entra em sua fase decisiva nesta terça-feira, com a chegada de ministros de 196 nações.

Paris estabelece que o mundo precisa estabilizar o aquecimento da Terra em bem menos de 2oC em relação à era pré-industrial e fazer esforços para limitá-lo a 1,5oC.

Na hipótese de os próximos anos repetirem o salto de temperatura de 2016, o limite de 1,5oC terá sido ultrapassado em 2018. A chance de isso acontecer é muito baixa, mas a série de recordes de extremos climáticos deste ano ajuda a pôr em perspectiva a dificuldade que o mundo terá de cumprir a meta.

Falando a jornalistas nesta segunda-feira em Marrakesh, o finlandês Petteri Talaas praticamente descartou que seja possível evitar a ultrapassagem da meta de 1,5oC sem recorrer a tecnologias de emissão negativa – ou seja, de captura ativa de carbono da atmosfera.

“[A meta de 1,5oC] ainda é factível, mas precisaremos de um declínio muito dramático nas emissões ao longo dos próximos anos, e a questão passa a ser quão preparados os países estão para gerenciar esse declínio.”

Talaas recusou-se a comentar o impacto que a eleição de Donald Trump para a presidência dos EUA terá sobre as metas de Paris e a tendência de aquecimento. No fim de semana, relatos na imprensa internacional afirmaram que Trump quer retirar os EUA do Acordo de Paris, como prometeu na campanha, da forma mais rápida possível.

Balanço de carbono

A única boa notícia da manhã de segunda-feira em Marrakesh foi dada pelos pesquisadores do Global Carbon Budget Project, ligado à Universidade de East Anglia, no Reino Unido.

Eles afirmaram que as emissões de CO2 por queima de combustíveis fósseis em 2016 devem ficar estagnadas pelo terceiro ano consecutivo.

A redução no uso de carvão mineral para geração de eletricidade nos EUA e na China estão entre os principais fatores da redução. No entanto, alertou a equipe britânica, as emissões por mudanças de uso da terra continuaram altas, o que fez com que a concentração de gases-estufa na atmosfera aumentasse. Desmatamento na Indonésia (cujas florestas contêm muito mais carbono que as da Amazônia) e incêndios florestais no Canadá estão entre as causas do crescimento.

 

Republicado do Observatório do Clima através de parceria de conteúdo. logo-observatorio-clima

 

 

 

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  • Claudio Angelo

    Jornalista, coordenador de Comunicação do Observatório do Clima e autor de "A Espiral da Morte – como a humanidade alterou a ...

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