Reportagens

Insegurança alimentar afeta moradores da região impactada pela hidrelétrica de Belo Monte

Estudo realizado em 500 domicílios do município de Altamira, no Pará, revela que 61% deles sofrem com o problema

José Tadeu Arantes ·
10 de maio de 2024

O impacto socioambiental causado pela usina hidrelétrica de Belo Monte, no Pará, já foi classificado como “desastre” por pesquisadores, ambientalistas e diferentes veículos da mídia. Os danos voltaram a ser apontados, recentemente, em relatório de vistoria produzido pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama). De acordo com o documento, foram constatados assoreamento e obstáculos à navegação no rio Xingu, alta mortalidade de árvores e inviabilização da reprodução de peixes, além da desestruturação do modo de vida de povos indígenas e comunidades ribeirinhas.

Um novo estudo, conduzido com apoio da FAPESP, enfocou especificamente a insegurança alimentar na cidade de Altamira, que sofreu forte impacto com a construção da barragem hidrelétrica de Belo Monte por ser o centro urbano mais populoso da região. Essa posição tornou Altamira um ponto central para a distribuição de bens, serviços e apoio logístico essenciais à construção da barragem. Como resultado, sua população foi fortemente afetada.

A construção de Belo Monte, realizada entre 2011 e 2015, provocou crescimento populacional sem o planejamento adequado para provisionamento de serviços à população local e aos migrantes em busca de trabalho. O choque fez de Altamira uma das cidades mais violentas do Brasil. Embora a população tenha declinado após o término da construção da barragem, o número de habitantes registrado pelo Censo de 2022 alcançou um total de 126.279 pessoas, 27,46% superior a 2010, data do Censo precedente. A título de comparação, a população total do Brasil cresceu apenas 6,46% no mesmo período.

O estudo em pauta foi publicado no International Journal of Environmental Research and Public Health. O trabalho revela que 61% dos domicílios de Altamira apresentam algum nível de insegurança alimentar e nutricional.

“Realizamos o estudo em julho de 2022, cerca de sete anos após o final da construção, visitando 500 domicílios representativos do total de habitações da área urbana de Altamira. A escala utilizada para medir segurança e insegurança alimentar e nutricional domiciliar classifica essa condição em três graus. Verificamos que os piores níveis de insegurança alimentar e nutricional estavam associados a domicílios mais pobres, cujos responsáveis possuíam baixo nível de escolaridade e taxas mais elevadas de desemprego. Além disso, os domicílios que sofriam mais de insegurança alimentar tinham um maior número de moradores. As famílias deslocadas de suas antigas áreas de moradia e reassentadas também enfrentavam insegurança alimentar maior”, diz o demógrafo Igor Cavallini Johansen, pós-doutorando no Núcleo de Estudos e Pesquisas Ambientais da Universidade Estadual de Campinas (Nepam-Unicamp) e primeiro autor do estudo.

Johansen afirma que, diferentemente de outros estudos que já avaliaram insegurança alimentar no contexto de construção de hidrelétricas no Brasil, a pesquisa por ele liderada utilizou a Escala Brasileira de Insegurança Alimentar (Ebia) domiciliar, com uma metodologia cientificamente validada para analisar o fenômeno do acesso a alimentos em qualidade e quantidade suficiente e fome. “Por meio dessa escala, utilizamos oito questões padronizadas que, dependendo do número de respostas positivas, classificam a condição de insegurança alimentar e nutricional do domicílio investigado”, conta.

Esse indicador compreende três categorias: (1) segurança alimentar (quantidade e qualidade adequadas de alimentos); (2) insegurança alimentar leve (qualidade afetada e preocupação com a disponibilidade futura de alimentos); (3) insegurança alimentar moderada a grave (de qualidade inadequada e início de escassez de alimentos a quantidade de alimentos insuficiente, compreendendo diferentes níveis de fome entre adultos e até mesmo crianças no domicílio).

“Formulamos e testamos três hipóteses: (1) de que os moradores do domicílio foram afetados por uma variedade de fatores que, em conjunto, produziram uma situação de insegurança alimentar; (2) de que a pobreza desempenhou papel fundamental entre os fatores e os grupos mais afetados foram aqueles retirados de suas casas e realocados nos Reassentamentos Urbanos Coletivos (RUCs); (3) de que, além do impacto da construção da barragem, o problema foi agravado pela pandemia de COVID-19”, informa Johansen.

Vista parcial da cidade de Altamira, no Pará, em agosto de 2022. Ao fundo, o rio Xingu. Foto: Igor Cavallini Johansen.

Na análise, múltiplas variáveis socioeconômicas foram consideradas: índice de riqueza (classificação dos domicílios em estratos socioeconômicos: mais pobre, intermediário, menos pobre), levando em conta as características da habitação e a existência ou não de bens como veículos e eletrodomésticos; se o entrevistado era beneficiário do programa Bolsa Família; se os moradores se autodeclararam oficialmente impactados pela construção da barragem; se a residência fazia parte de Reassentamento Urbano Coletivo; número de membros do domicílio; se havia nele algum integrante com 60 anos ou mais; e sexo, cor da pele, idade, estado civil, nível educacional e situação de trabalho do responsável pelo domicílio.

“As três hipóteses foram confirmadas. Como era previsível, verificamos que os diferentes fatores engendravam uns aos outros: o impacto causado pela construção da barragem aumentava significativamente a probabilidade de os moradores residirem em áreas de reassentamento; isso ampliava as chances de a família pertencer às camadas sociais mais pobres; o que, por sua vez, implicava risco de insegurança alimentar. Em 69,7% dos domicílios, os moradores tiveram maior dificuldade de acesso às quantidades e tipos desejados de alimentos após a conclusão da construção da barragem, em 2015”, relata Johansen. E acrescenta que, desse percentual, 52,5% reconheceram que a dificuldade já existia antes do início da pandemia de COVID-19. Os demais atribuíram à pandemia a piora nas condições de segurança alimentar e nutricional.

“Entre nossos resultados, foi interessante observar que moradores de domicílios com membros com 60 anos ou mais apresentaram menor incidência de insegurança alimentar. Isso porque, geralmente, essas famílias podiam contar com a aposentadoria desses idosos para compor sua renda, potencialmente reduzindo a exposição à pobreza e, consequentemente, à insegurança alimentar”, comenta Johansen.

O pesquisador lamenta não dispor de uma análise valendo-se da mesma escala (Ebia) aplicada antes da construção de Belo Monte, para poder comparar com os resultados obtidos depois. “De qualquer forma, foi chocante constatar um quadro com 61% de insegurança alimentar quando o consórcio construtor da hidrelétrica alega ter investido R$ 6,5 bilhões (aproximadamente U$ 1,3 bilhão) na região voltados a ações socioambientais e de sustentabilidade no período entre 2016 e 2022. O que foi feito desse dinheiro todo?”, questiona Johansen.

Infelizmente, os desacertos de Belo Monte não constituem um fenômeno isolado. Impactos socioambientais de grande monta têm sido o corolário de megaprojetos desse tipo na região amazônica. Outro estudo realizado pelo mesmo grupo de pesquisa e liderado por Caroline Arantes, professora da West Virginia University, nos Estados Unidos, mostrou que, no contexto das hidrelétricas de Santo Antônio e Jirau (em Porto Velho, Rondônia), comunidades de pescadores foram impactadas por perdas na produção e lucros da pesca após a construção das barragens. Em resposta aos impactos, os moradores tiveram de adaptar suas estratégias de pesca e recursos de sustento, com uma redução significativa do consumo de peixe nos domicílios. “Essas comunidades de pescadores que comiam peixe diariamente passaram a consumi-lo apenas uma a duas vezes por semana, ou até mesmo menos do que isso”, diz Johansen. Esse estudo foi publicado no Journal of Environmental Management.

Outro estudo precedente, neste caso sobre pescadores do rio Xingu no contexto pós-construção de Belo Monte, indica que não só os peixes ficaram mais escassos, como também os produtos alimentícios de maneira geral também ficaram mais caros na região. Os dados foram divulgados no periódico Human Ecology.

Todos esses trabalhos contaram com contribuições do professor Emilio F. Moran, que coordena o projeto “Depois das hidrelétricas: processos sociais e ambientais que ocorrem depois da construção de Belo Monte, Jirau, e Santo Antônio na Amazônia Brasileira”, contemplado com auxílio à pesquisa da FAPESP por meio do Programa São Paulo Excellence Chair (SPEC).

Além desse auxílio, o estudo foi apoiado por meio de Bolsa de Pós-Doutorado concedida a Johansen e de Bolsa de Pós-Doutorado concedida a Vanessa Cristine e Souza Reis, também integrante da equipe de pesquisadores.

O artigo Poverty–Food Insecurity Nexus in the Post-Construction Context of a Large Hydropower Dam in the Brazilian Amazon pode ser acessado em: https://www.mdpi.com/1660-4601/21/2/155.

Posicionamento da Norte Energia

Após publicação da reportagem, a Norte Energia entrou em contato para rebater pontos da matéria. Veja a nota na íntegra:

A Norte Energia, concessionária da Usina Hidrelétrica Belo Monte, rebate os pontos controversos sobre os impactos do empreendimento apresentados na matéria  “Insegurança alimentar afeta moradores da região impactada pela hidrelétrica de Belo Monte”, publicada nesta quarta-feira, dia 08/05, na editoria Cotidiano da Folha de S.Paulo. 

Sobre o tema insegurança alimentar, a reportagem traz que: “61% dos agregados familiares de Altamira viviam algum nível de insegurança alimentar e desnutrição” e que o “acesso a alimentos na quantidade e qualidade desejada tornou-se mais difícil para 69,7% dos agregados familiares após a conclusão da construção da barragem em 2015. Cerca de metade destes agregados familiares (52,5%) disse que já tinha sido difícil antes da pandemia, e o resto culpou a pandemia pelo agravamento da insegurança alimentar desde então.”

A Norte Energia esclarece que realiza o monitoramento do consumo proteico das famílias desde julho de 2012 e os dados atuais demonstram que a taxa de consumo proteico recomendada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) é de 12kg/ano/pessoa e os dados de 2023 mostram que a média de consumo no Xingu é de 34kg/ano/pessoa, isto é, o a taxa média de consumo de pescado no Xingu é 280% maior que a recomendação da OMS.

Quanto à alegação da insegurança alimentar, há que se considerar que o termo vem sendo utilizado de forma genérica, sem estabelecer ferramentas para a medição. O que se pode afirmar, com base no monitoramento de consumo protéico das famílias monitoradas no âmbito do Plano Básico Ambiental (PBA), que se constitui em um conjunto único e singular de dados sobre o tema no rio Xingu, é que a população ribeirinha está consumindo alimentos de origem proteica suficientes, conforme os indicadores de referência nacionais e internacionais. Ou seja, não há cenário de insegurança alimentar, uma vez que parâmetros que possibilitam acompanhar esta questão vêm sendo aferidos desde 2012. 

Embora, em termos de nutrição, a troca de pescado por produtos industrializados não seja avaliada como positiva, este fenômeno é comum em comunidades urbanas, rurais e em outros países, especialmente em desenvolvimento. A questão é muito mais ampla e a consequência da transição dos padrões de alimentação das sociedades modernas é impulsionada por fatores econômicos e de mercado.

Nesse sentido, o título da matéria, onde se menciona que a “insegurança alimentar aumenta” não tem embasamento, visto que não há dados prévios à construção da usina coletados por aqueles pesquisadores, para serem comparados com os dados atuais. Inclusive, isso é citado no artigo tomado como base para a matéria: “Poverty–Food Insecurity Nexus in the Post-Construction Context of a Large Hydropower Dam in the Brazilian Amazon”, portanto, não se pode estabelecer nexo causal dos aumentos de pobreza e insegurança alimentar com a hidrelétrica Belo Monte.

Necessário destacar a execução dos Projetos de Geração de Renda e de Subsistência, integrantes do Programa de Atividade Produtivas que é voltado à população indígena, bem como os Projetos de Reparação Urbana e Rural, e Projetos e ações de Assistência Técnica (ATES) junto às famílias urbanas, rurais, ribeirinhas e pescadoras que são realizados pela Norte Energia. Por exemplo, somente na Terra Indígena Paquiçamba, localizada na Volta Grande do Xingu, a produção de pescado por meio de ações de aquicultura alcançou aproximadamente 115 toneladas nos anos de 2022 e 2023. 

Sobre os temas assoreamento e erosão do rio Xingu e obstáculos à navegação fluvial, a companhia informa que nos monitoramentos realizados até o momento, no âmbito do Projeto de Monitoramento Hidrossedimentológico, as médias de concentração de sedimento, para os pontos observados ao longo do Xingu, incluindo o Trecho de Vazão Reduzida (TVR), continuam evidenciando a baixa carga de transporte de sedimento como característica física da bacia do rio Xingu em comparação a outros grandes rios da Amazônia. 

Conforme o esperado, em função da característica dos sedimentos na região de inserção de Belo Monte, até o momento não foram observadas mudanças significativas nos padrões de deposição, transporte e erosão do sedimento de fundo do TVR.

Imagens de satélite e de levantamento aerofogramétrico compiladas para os períodos anterior e posterior à implantação do barramento não denotam o surgimento de bancos de areia ou de intensificação de processos erosivos no TVR como um todo, incluindo a foz do Bacajá. Dessa forma, não há perda de canais de navegação com a implantação da hidrelétrica,  cuja atividade- a navegação – é continuamente monitorada e avaliada.

Para apoiar a navegabilidade foram implantadas 11 bases de apoio em locais que, historicamente, muito antes de empreendimento, apresentavam dificuldades de navegação nos períodos de baixa vazão do Xingu, conforme sua sazonalidade. Para atuação nessas bases de apoio, a mão de obra é contratada diretamente de comunidades indígenas e ribeirinhas localizadas no entorno. São cerca de 66 profissionais, entre pilotos e auxiliares. Trata-se de pessoas com grande conhecimento sobre as condições de navegação em determinados trechos do rio Xingu, contribuindo também para a geração de empregos na região.

Além disso, cabe registrar que, como mitigação à implantação do barramento, foi criado um Sistema de Transposição de Embarcações (STE), que funciona de forma ininterrupta desde 2015, permitindo o deslocamento de embarcações na Volta Grande do Xingu, com índice de satisfação cima de 90% – já foram realizadas 16 campanhas de Avaliação de Satisfação dos Usuários do STE. O desempenho do funcionamento do STE é avaliado por meio de indicadores relativos à transposição de embarcações, cargas, pessoas e os tempos médios de transposições. As análises demonstram que os registros de tempo médio de travessia vêm se estabilizando abaixo dos nove minutos, sendo considerado os melhores índices já monitorados desde o início da operação do sistema. 

Sobre a alegação do aumento da mortalidade de árvores, a Norte Energia monitora, desde 2012, florestas aluviais e de formações pioneiras, e os dados dos monitoramentos, apresentados anualmente ao órgão fiscalizador, demonstram que nas duas classes de vegetação da floresta às margens do rio no TVR, se observa que a floração e a frutificação se mantiveram ao longo do tempo. Da mesma forma, as taxas de mortalidade de árvores seguem o padrão observado para áreas naturais da Amazônia, sem observação de alterações após a implantação do empreendimento. 

Sobre a “impossibilidade de reprodução de diversas espécies de peixes”, a companhia informa que os resultados de monitoramentos do Projeto Básico Ambiental (PBA) da usina, conduzidos pela Universidade Federal do Pará (UFPA), demonstram que a maioria das espécies manteve a proporção de peixes maduros ao longo de 12 anos de estudo na região da Volta Grande do Xingu. Algumas espécies tiveram mudanças no padrão de reprodução, cenário previsto no Estudo de Impacto Ambiental (EIA) do empreendimento. Contudo, não ocorreu a extinção de qualquer espécie de peixe nas áreas de influência do empreendimento.

Adicionalmente, ações de mitigação e compensação vêm sendo implementadas no âmbito do PBA como:  Destinação de recursos à compensação ambiental para proteção e manutenção de sítios reprodutivos e de alimentação da fauna de peixes; Projeto experimental com desenvolvimento de protocolos de reprodução de espécies de peixes nativas do Xingu e de interesse social; Implantação de laboratórios de ecologia e de reprodução de peixes na Universidade Federal do Pará (UFPA); Recomposição da vegetação na Área de Preservação Permanente (APP) de modo a manter os ambientes de reprodução e alimentação; Fortalecimento das ações produtivas com pescadores, entre outras ações visando o desenvolvimento local das populações da Volta Grande do Xingu. 

Sobre a “perturbações no modo de vida das comunidades indígenas e ribeirinhas”, a Norte Energia rebate as acusações e esclarece que as ações desenvolvidas pela empresa  estão pautadas no respeito aos direitos humanos e na participação ativa dos seus defensores e das organizações da sociedade civil envolvidas. Os espaços de diálogo têm permitido abordar temas e o cuidado de populações vulneráveis, atendidas no compromisso de Belo Monte. O respeito aos povos indígenas está presente desde a concepção do empreendimento, considerando que o projeto de engenharia da hidrelétrica sofreu revisões para assegurar que nenhuma Terra Indígena fosse inundada, além de atender às leis constitucionais e infraconstitucionais do Estado brasileiro, protocolos e convenções ratificados pelo Brasil que tratam de direitos e garantias aos Territórios e Povos Indígenas, assim como ao meio ambiente. 

A questão indígena tem relevante destaque no processo de licenciamento da Usina Hidrelétrica Belo Monte em razão da região onde está o empreendimento, com a presença de diversas etnias. Portanto, todas as ações empenhadas para o cumprimento dessas obrigações são desenvolvidas em observância às políticas de direitos humanos e às melhores práticas de responsabilidade social e ambiental, que inclui o atendimento a normativas e legislações junto aos povos indígenas.

Outro destaque é o atendimento aos Padrões de Desempenho (PDs) estabelecidos pela International Finance Corporation (IFC), que norteiam os denominados Princípios do Equador (PE). Vale frisar o cumprimento ao PD 7, que reconhece que os Povos Indígenas, como grupos sociais com identidades distintas daquelas convencionais de sociedades nacionais. Tais padrões e princípios estabelecem diretrizes, com base em legislações, normativas e práticas consagradas no âmbito internacional, voltadas para questões socioambientais, de saúde e segurança dos trabalhadores e comunidades afetadas e no entorno do projeto, bem como de direitos humanos.

A Norte Energia, no âmbito do PBA do Componente Indígena (PBA-CI), já investiu cerca de R$ 1,2 bilhão e executa 42 Programas e Projetos, aprovados pela Funai em 2012,  com destaque em educação, saúde, preservação do patrimônio cultural, atividades produtivas, proteção territorial.  Somam-se, ainda, compromissos estabelecidos em três Termos de Cooperação firmados entre empreendedor e órgão indigenista nacional e outras obrigações estabelecidas no bojo das licenças ambientais e autorizações já concedidas, por instituições diversas, para o empreendimento.

Observa-se grande aumento populacional das comunidades indígenas na região do Médio Xingu: antes da implantação da usina de Belo Monte, a população indígena da somava 2 mil pessoas em 26 aldeias. Atualmente são 8.568 – 5.096 indígenas aldeados e 3.472 em contexto urbano/ribeirinho – de nove etnias diferentes.

O alinhamento contínuo entre Norte Energia, FUNAI e povos indígenas tem sido realizado, visando, sobretudo, associar à eficiência das ações executadas, a preservação e valorização de sua riqueza cultural. Nesse sentido, ações de fortalecimento das organizações indígenas, de proteção da cultura tradicional e da educação, de apoio à promoção da saúde, de subsistência e geração de renda, de preservação e conservação territorial e ambiental vêm sendo continuamente promovidas, acumulando resultados, dentre outros tantos, como:

–       elaboração de materiais didáticos nas línguas de cada povo;

–       revitalização da língua Xipaya e Kuruaya;

–       formação de professores indígenas para atuação nas TIs do Médio Xingu;

–       apoio à elaboração de três Protocolos de Consulta, dez Planos de Vida em consonância com a Política Nacional de Gestão Territorial e Ambiental de Terras Indígenas (PNGATI) e um Plano de Gestão Territorial e Ambiental;

–       a companhia construiu e equipou 56 salas de aula e 31 Unidades Básicas de Saúde Indígena em Terras Indígenas. Atualmente, há redução de mais de 90% dos casos de malária na região.

–       valorização cultural dos artefatos e artesanatos indígenas;

–       premiações em produções audiovisuais indígenas;

–       captação de cerca de R$ 3 milhões de reais em recursos externos por meio de projetos elaborados pelas associações;

–       formação de Agentes Ambientais Indígenas para acompanhamento dos monitoramentos ambientais e territoriais participativos;

–       mais de 71 toneladas de alimentos produzidos;

–       produção de chocolate artesanal pelos indígenas ribeirinhos.

–       até o momento, entre as ações proativas, a empresa construiu 779 casas para indígenas, sendo 334 de alvenaria e 445 de madeira.

Alegações sobre alterações no modo de vida das comunidades indígenas estão, em sua maioria, relacionadas às atividades produtivas. Nesse sentido, importante lembrar que os Estudos Etnológicos do EIA da UHE Belo Monte informam que as roças são fundamentais para a segurança alimentar dos povos indígenas, bem como os produtos da pesca e da caça. Ainda de acordo com o documento, o consumo de alimentos industrializados adquiridos no comércio regional constituía, já em 2009, complemento aos produtos tradicionais. Entre os Juruna do Km 17, por exemplo, o pescado já era comprado regularmente de vendedores que ofereciam seus produtos na Área Indígena. Como medida mitigadora, foi previsto no PBA-CI, a implementação do Programa de Atividades Produtivas, que tem como objetivo fortalecer a segurança alimentar e a geração de renda nas comunidades indígenas localizadas na área de influência da Usina Hidrelétrica de Belo Monte. Para tanto, o projeto promove um conjunto de ações de fortalecimento de atividades tradicionais, de cunho agroextrativistas, como a coleta de castanha e de babaçu, bem como apoia a experimentação de inovações demandadas atualmente pelas atividades que, apenas recentemente, vem sendo inseridas nos sistemas produtivos das comunidades assistidas, como o cultivo de cacau e a criação de aves.

As atividades e ações do Programa de Atividades Produtivas estão organizadas em dois projetos: o Projeto de Subsistência Indígena e o Projeto de Desenvolvimento de Atividades Produtivas e Comercialização.

Projetos de geração de renda junto a populações tradicionais pressupõem a conciliação de atividades e ou conhecimentos tradicionais, uso sustentável do território, produção de excedente e valor competitivo para inserção no mercado. A partir de conhecimentos tradicionais, do manejo sustentável do meio ambiente, os projetos de geração de renda devem viabilizar uma produção em escala comercial (excedente), com preços competitivos no mercado, com a devida legalização e controles, e com viabilidade para agregar renda às comunidades que – comumente, e sobretudo na região amazônica – habitam áreas distantes dos grandes centros, de difícil acesso e de logística complexa de escoamento da produção. 

Nesse contexto, em relação às comunidades ribeirinhas, é importante destacar que a empresa construiu os Reassentamentos Urbanos Coletivos (RUCs) dotados de toda infraestrutura para acomodar, com novas moradias, as famílias que residiam em áreas historicamente suscetíveis a cheias do Rio Xingu e sem nenhum tipo de acesso à sistema de saneamento básico. Os RUCs se tornaram novos bairros que foram integrados à cidade de Altamira e possuem equipamentos públicos, estabelecidos de acordo com as demandas técnicas dessa população, como escolas, Unidades Básicas de Saúde (UBS), quadras poliesportivas, espaços de convivência, além de um completo sistema de saneamento básico.

A melhoria de vida dessas famílias é uma realidade comprovada em indicadores monitorados periodicamente junto às famílias reassentadas. Em 2011, antes da realocação, o Índice de Desenvolvimento Familiar (IDF) dessas famílias era de 0,66 e atualmente esse índice aumentou para 0,71[1]. Nesse mesmo contexto, observou-se diminuição do percentual de moradores abaixo da linha de pobreza no município de Altamira, de 25% em 2010 (Censo IBGE) para 3% em 2023, conforme dados da Pesquisa de Condições de Vida aplicada pelo Programa de Monitoramento dos Aspectos Socioeconômicos da usina. As famílias são acompanhadas periodicamente e, em caso de necessidade, são encaminhadas para atendimento social na rede socioassistencial municipal.

Desde 2012, já foram realizados mais de 20 mil atendimentos, com recursos de Belo Monte, que vão desde o encaminhamento de crianças e adolescentes para a rede escolar, passando por atendimentos de saúde, acesso a aposentadoria e benefícios sociais, capacitação para reinserção no mercado de trabalho e emissão de documentos civis. Ao se levar em conta a evolução de tais indicadores, é notório que a situação das famílias realocadas pela Norte Energia evoluiu positivamente quando se compara com a situação observada anteriormente à execução das medidas de mitigação.

A Norte Energia executou também a construção de 609 km de redes de água e esgoto e implantação da rede de saneamento de Altamira, conectando 19 mil imóveis. Altamira tem hoje um alto índice de saneamento, de 90% (a capital, Belém, possui 12%).

Vale destacar que os Royalties de Compensação Financeira pelo Uso dos Recursos Hídricos (CFURH) são de cerca de R$ 200 milhões por ano. O Plano de Desenvolvimento Regional Sustentável do Xingu (PDRSX), promovido pela Norte Energia, prevê uma destinação orçamentária de R$ 500 milhões. Os investimentos realizados em ações socioambientais representam R$ 7,1 bilhões, desde o início da implantação do projeto, em 2010.

[1] Índice de Desenvolvimento Familiar (IDF) é uma metodologia elaborada pelo Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (IPEA) que avalia a partir de informações constantes no formulário do Cadastro Único, o grau de vulnerabilidade das famílias. A classificação do IDF varia de 0 a 1, sendo 1 (um) o melhor desenvolvimento familiar e 0 (zero), o pior. Famílias com IDF abaixo de 0,5 são consideradas em situação de vulnerabilidade.


 *Editado às 00h40 do dia 13/05/2024, para acrescentar a resposta da Norte Energia.

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