O desembargador Henrique Carlos de Andrade Figueira, presidente do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJRJ), decidiu nesta terça-feira (30 de agosto) pela validade da licença de operação das quatro usinas termelétricas flutuantes sob responsabilidade da empresa de origem turca Karpowership, na Baía de Sepetiba. Com essa deliberação, em favor de recurso do empreendedor, foi revogada decisão anterior da juíza Georgia Vasconcellos da Cruz, da Segunda Vara da Fazenda Pública do TJRJ. Ela havia determinado em 22 de julho a suspensão do licenciamento e de atividades desse projeto até que fosse apresentado e aprovado Estudo e Relatório de Impacto Ambiental (EIA-RIMA), liberado pelo Estado nesse conturbado processo.
“Entende o Requerente que a medida deferida gera grave ameaça à ordem pública, econômica e social, em razão da paralisação de projeto crucial no auge da maior crise do Estado do Rio de Janeiro, deficitário em obras de infraestrutura”, afirma o desembargador em sua decisão. No mesmo contexto, pondera: “Ressalta que não descumpriu a coisa julgada na ação civil pública porque o Decreto Estadual 46.890/2019, norma posterior, em seu artigo 48 parágrafo único, dispensou as hipóteses de prévio estudo de impacto ambiental. Narra que representantes do IBAMA estavam presentes na reunião que deferiu a dispensa de EIA-RIMA para o empreendimento, firmando acordo de cooperação”.
O desembargador embasou os seus argumentos em deliberação do Instituto Estadual do Ambiente (Inea) que não considerou o empreendimento potencialmente impactante para o ambiente da Baía de Sepetiba, mesmo sem ter estudos prévios para tal comprovação. Figueira também contestou os argumentos do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MPRJ) que, em Ação Civil Pública (ACP) defendeu a realização de EIA-RIMA para que o empreendedor pudesse comprovar que não há risco ambiental relacionado às termelétricas, além de ter ressaltado que, legalmente, o Estado não poderia liberar a empresa dessa obrigação.
Nesse sentido, observou o presidente do TJRJ: “Ou seja, ao tratar como similares situações que a princípio se aparentam díspares, e ao impor ao Réu o ônus da prova (quando caberia ao Autor, Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro, a prova de as hipóteses não identificar o ponto de merecerem tratamento equivalente), a r. decisão atacada ofende a ordem pública.”
A empresa turca também conseguiu, por meio de recurso, reverter a decisão da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) que havia revogado a outorga de autorização do empreendimento, por descumprimento de prazos contratuais acordados. Essa decisão havia sido tomada, durante reunião da Diretoria Colegiada da agência reguladora, realizada em 9 de agosto. A partir da nova deliberação, até o momento, as outorgas concedidas estão válidas.
Segundo informado à reportagem de ((o))eco pela Aneel, por intermédio de sua assessoria de imprensa, “o efeito suspensivo foi deferido pelo Diretor Geral, conforme Despacho n° 2.289, de 19/8/2022”. No comunicado foi acrescentado que “somente a revogação das outorgas foi suspensa e, portanto, todo o restante da decisão da Diretoria da ANEEL foi mantida, inclusive quanto à negativa dos excludentes de responsabilidade pelo atraso”.
“O recurso foi sorteado para uma nova relatoria e deverá ser levado para análise do colegiado da ANEEL”, informou a agência reguladora. Ainda segundo esclarecimentos enviados à reportagem, “sob o ponto de vista exclusivo das outorgas da ANEEL, a empresa pode dar andamento nas suas atividades”. “No entanto, vale esclarecer, que o atraso até aqui verificado é superior a 90 dias e, portanto, todas as multas são aplicadas normalmente, assim como segue normalmente o processo de rescisão dos Contratos de Comercialização firmados no leilão”.
Organização da sociedade civil reafirma continuidade de luta no Judiciário
Com surpresa e indignação, a diretora executiva do Instituto Arayara, Nicole Oliveira, se manifestou sobre a decisão mais recente do TJRJ. “Essa decisão é uma aberração jurídica. Ela é muito mais política do que jurídica, pois está revertendo a decisão de uma desembargadora do próprio Tribunal. Então é o presidente do Tribunal que está basicamente desfazendo uma decisão da desembargadora de uma simples execução de uma sentença transitada em julgado [quando não cabe mais recurso].”
A ambientalista afirma que o Instituto Arayara está analisando todas as medidas jurídicas cabíveis para definir a tomada de decisão necessária nesse processo. O primeiro passo nesse sentido já foi dado no dia 30 de agosto, com o envio de notícia de fato ao MPRJ, recurso que envolve investigação aprofundada sobre um determinado problema de repercussão para a coletividade. Nesse caso, a demanda se refere à necessidade de investigação sobre a tramitação burocrática do licenciamento ambiental das termelétricas, alvo de inúmeros questionamentos de organizações da sociedade civil com desdobramentos em decisões judiciais já alcançadas por força de mobilização junto ao MPRJ. “Vamos lutar para que o EIA-RIMA seja mantido. Isso não acabou ainda”, adianta.
Segundo consta no documento enviado ao MPRJ, “no dia 24/05/2022 a Comissão Estadual de Controle Ambiental – CECA, órgão vinculado ao Instituto Estadual de Meio Ambiente (INEA), no âmbito dos processos SEI-070002/005430/2022 e SEI-070002/014726/2021 deliberou, por maioria, pela inexigibilidade de realização de EIA/RIMA para quatro UTEs flutuantes que seriam instaladas na Baia de Sepetiba, com capacidade de geração de 560 MW.”
Ainda segundo a demanda encaminhada ao MPRJ, “consoante foi pontuado pelo representante da Procuradoria-Geral do Estado do Rio de Janeiro na reunião, existe, desde 2006, sentença judicial transitada em julgado na ACP nº 00315584620048190001, em que o Estado do Rio de Janeiro, por meio de seus órgãos, está proibido de reconhecer a inexigibilidade de EIA/RIMA para atividades previstas no rol do art. 2º da Res. 01/86 do CONAMA.”
Para Nicole, dadas às questões de interconexões ecológicas e à relação de interdependência entre os ecossistemas, a decisão judicial mais recente sobre o projeto de implementação das termelétricas expõe ao risco ambiental, não somente a Baía de Sepetiba, como o bioma da Mata Atlântica e a biodiversidade marinha do Rio de Janeiro.
Há também o perigo de abertura de precedentes no Judiciário, segundo a ambientalista: “Isso abre espaço para que outros projetos que, claramente causem danos ambientais, simplesmente porque tem uma manifestação do Inea dizendo que não existe possibilidade de impacto, fiquem isentos de apresentar EIA-RIMA, mecanismo que deve ser usado em caso de projetos que causem riscos ambientais”, alerta.
Sem estudos prévios e diálogo com a sociedade, termelétricas são de alto risco, aponta ambientalista
Apesar de inconformada com o mais recente desdobramento jurídico sobre as usinas termelétricas da Baía de Sepetiba, a operadora de direito e ambientalista Mara Siqueira confessa que algo assim “já era esperado”, tendo em vista o cenário conturbado que envolve o projeto energético desde o início das tentativas de implementação desse empreendimento “sem diálogo com a sociedade civil e sem estudos ambientais prévios”.
Segundo analisa a especialista que também atua como pesquisadora e educadora socioambiental, tais elementos resultam em uma situação de alto risco socioambiental para uma região de grande importância para a pesca artesanal, a conservação da biodiversidade e o turismo. Os problemas mencionados têm sido apontados em reportagens que ((o))eco tem publicado.
“As comunidades pesqueiras, marisqueiras, caiçaras e mesmo urbanas do território não tiveram a oportunidade de se expressar”, afirma. Ela relata que os moradores só tomaram conhecimento sobre o empreendimento quando as balsas já estavam na Baía de Sepetiba. “Não foram respeitadas as questões de governança social”, denuncia. Na sua opinião, uma grande conquista da sociedade civil foi “conseguir reverter esta situação absurda ao cancelar o licenciamento da empresa turca, derrubando a inexigibilidade de apresentação de estudos prévios de impactos ambientais” a partir de ações de articulação e parceria com o Ministério Público.
“A empresa turca, em nenhum momento, parou com a evolução do processo de instalação das usinas e, na semana passada, anunciou em mídia que estava pronta para funcionar, induzindo a população ao erro. Assim, tentava passar a falsa sensação, na manchete postada, de que estaria liberada para ativar as operações de suas termelétricas, quando houve uma decisão anterior que obrigou o Inea a cancelar a liberação de funcionamento das mesmas e notificando a empresa para parar com suas atividades, imediatamente”, critica a ambientalista.
Pelo imbróglio jurídico que se formou, Mara considera que, muito provavelmente, vai haver “um jogo de empurra” no âmbito do Judiciário fluminense, até que o caso seja levado à Justiça Federal. “Infelizmente, estamos num país onde não se fazem estudos prévios das reais demandas das comunidades locais, porque só o [enfoque] político-financeiro é que importa e se sobrepõe ao socioambiental”, lamenta.
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Como morador de Sepetiba lamento muito q seja concedida licença pra está empresa degradar maís ainda a Baía de sepeiq sofre a décadas com o impacto do porto de sepetiba pra mim fica claro os desmandos deste governo atual do RJ.incompetente e promíscuo temos q tentar mobilizar toda a sociedade civil contra está decisão q no mínimo é desemcabida cabe ressaltar quanto esta empresa está investindo na Campanha do atual governo.