Pouco dias depois de ter tomado posse, que ocorreu no dia 17 de janeiro, o novo presidente do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), o médico veterinário Adalberto Eberhard, exonerou dos seus cargos os chefes de duas importantes unidades de conservação do país. No dia 31 de janeiro foram publicadas no Diário Oficial da União as demissões dos gestores da Área de Proteção Ambiental (APA) Costa dos Corais, em Alagoas, Iran Normande, e do Parque Nacional Marinho de Fernando de Noronha, Felipe Mendonça.
Como os próprios demitidos reconhecem, exonerações de cargos comissionados são comuns quando há troca de governo. Há quem veja, no entanto, viés político e até ideológico na retirada Normande e Mendonça, de suas funções de chefia. Ambos são servidores de carreira do ICMBio, órgão responsável pela gestão das áreas de conservação e proteção ambiental do país, e chamaram a atenção ultimamente por sua atuação à frente das duas unidades de conservação.
Em 2016, Normande abriu um processo que resultou na autuação e multa do atual secretário de Ecoturismo do Ministério do Meio Ambiente, Gilson Machado Guimarães Neto, por não cumprir regras de turismo sustentável em uma área de proteção ambiental. Ele tem uma pousada numa praia em São Miguel dos Milagres (AL), dentro da APA Costa dos Corais. “Ele descumpriu o Plano de Manejo da APA ao não retirar palhoças de madeira e palha da faixa de praia na frente de sua pousada”, conta Normande. “O Plano proíbe estruturas fixas na faixa de praia em toda a APA. Ele foi notificado para que fizesse a retirada e, como não cumpriu a notificação, foi multado.”
No caso de Mendonça, ele se notabilizou pelas críticas ao excesso de turistas em Fernando de Noronha. “As razões delas são estritamente legais, pois o plano de manejo da APA, após um processo de revisão que durou cinco anos, estabelece que o limite de visitantes por ano na ilha é de algo próximo a 90 mil”, explica. “Em 2018, no entanto, foi registrado o recorde de visitação no arquipélago, com 103 mil turistas.”
De acordo com ele, esse crescimento exponencial e sem os devidos cuidados em termos de estrutura do arquipélago, vem repercutindo gravemente tanto no que diz respeito à biodiversidade local, como socialmente. “Entre os problemas que isto gera estão a capacidade de esgoto da ilha que não atende a todos, mas somente a 50% das moradias”, diz. “Além disso, há bueiros estourando, água dessalinizada que não é suficiente para todos, grande produção de resíduos sólidos, precária estrutura portuária e aeroportuária e favelização.”
Por coincidência – ou não – Mendonça foi exonerado uma semana depois de uma reunião do presidente do ICMBio (que teria contado com a participação do ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles), com empresários de Fernando Noronha, certamente interessados no aumento do número de visitantes. Apesar disso, Mendonça evita atribuir sua demissão a este encontro. “Não saberia dizer [se esta foi a causa]”, esquiva-se. “Sou servidor público de carreira, houve uma mudança de governo e entendo que troca de chefias acontecem. Saio do cargo com o sentimento de dever cumprido.”
Além disso, para ele, o termo genérico “empresários” é muito vago. “Em Noronha existem diversos empresários que trabalham de forma tão digna, honesta, que não é possível e nem justo colocar todos em uma mesma caixa, sem distinção”, diz. “Cada vez mais o empresariado local e a comunidade entende o papel do ICMBio na conservação e na economia local. Trabalhamos muito em parceria com o empresariado local. Sou particularmente muito grato a diversos deles de quem tivemos muito apoio.”
Normande também evita especular sobre as razões de sua exoneração. “Não tenho informações suficientes para concluir algo a respeito”, justifica. “Exonerações de cargos comissionados são comuns quando há troca de governo. Fomos pegos de surpresa, no entanto, por imaginar que antes haveria a nomeação da Diretoria do ICMBio em Brasília, para então realizar trocas em cargos de chefia de unidades de conservação, que historicamente foram ocupados por quadros técnicos de dentro do próprio Instituto.”
Para ele, nem mesmo o fato de ter declarado, nas redes sociais, voto no candidato do PT, Fernando Haddad, no segundo turno das eleições presidenciais do ano passado, influenciou na sua exoneração. “Acredito que não”, diz. “Se assim fosse, muitos outros teriam sido demitidos também.’
Procurados insistentemente por meio de suas assessorias de imprensa, o presidente do ICMBio e o ministro do Meio Ambiente não quiseram se manifestar. O secretário de Ecoturismo do Ministério do Meio Ambiente também não atendeu aos pedidos de entrevista.
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O governo está sendo amador. Se exonerasse de uma só vez os centenas de cargos comissionados do Icmbio "que declararam voto no candidato do Petê", não ia ter esse mimimi que um ou outro foi perseguido. Aliás, quem votou 13 e tem cargo em comissão nesse governo já devia ter pedido pra sair dia 2, pra honrar suas próprias tweetadas e lacradas.