A transposição do rio São Francisco, projeto de grande magnitude que desviou parte das águas do Velho Chico para estados do nordeste, levou também um habitante indesejado para a bacia do rio Paraíba do Norte, no Eixo Leste da transposição: uma espécie de peixe invasora. O Moenkhausia costae é uma espécie de piaba ou lambari conhecida popularmente como tetra-fortuna e sem ocorrência registrada no rio Paraíba do Norte antes da transposição. Agora, de acordo com coleta feita por pesquisadores, é o terceiro peixe mais abundante no açude de Poções, o primeiro da bacia a receber as águas do São Francisco, em março de 2017.
A proliferação de espécies invasoras já era um risco que estava no radar dos pesquisadores desde o começo do projeto de transposição, por isso, cientistas de universidades da Paraíba e do Rio Grande do Norte correram para fazer um levantamento completo de todas as espécies que ocorriam na bacia do rio Paraíba do Norte antes da transposição, trabalho publicado em 2018 na revista Biota Neotropica. No total, 47 espécies de peixes de água doce foram identificadas.
“Nós já achávamos que com a transposição do rio São Francisco havia esse risco grande de espécies invasoras adentrarem a bacia do rio Paraíba do Norte, por isso nós fizemos um levantamento de todos os peixes que já foram identificados na bacia, desde os registros dos primeiros exploradores, até coletas [feitas em 2016] e listamos todas as espécies registradas num artigo, já para ter como referência do que havia antes da transposição. E essa espécie, a Moenkhausia costae, não estava na nossa lista. E nós sabíamos desse risco, mas não sabíamos que ia ser tão rápido”, conta o pesquisador Telton Ramos, do Laboratório de Ecologia Aquática da Universidade Estadual da Paraíba, e um dos autores tanto do estudo atual sobre a tetra fortuna quanto do levantamento anterior.
O Eixo Leste da transposição, que conecta o São Francisco ao Paraíba do Norte, foi concluído em março de 2017. Cerca de um ano depois, projetos de pesquisa e monitoramento realizados na bacia do rio Paraíba do Norte começaram a identificar a presença da Moenkhausia costae. Telton lembra ainda que antes de irem ao local, encontraram um pescador que contou que havia aparecido uma piaba nova no açude, e que os pescadores estavam “pegando muito esse peixe lá”. Era o alerta, um invasor havia chegado e se estabelecido.
“Na primeira vez que a gente coletou, em julho de 2018, foram poucos exemplares, apenas 5. Ou seja, é provável que a espécie tivesse acabado de chegar ali e ainda não tinha se proliferado, porque a metodologia que a gente usa é padronizada. E em janeiro de 2020 nós voltamos, no período chuvoso, e coletamos 36 exemplares. Foi a terceira espécie mais abundante, mostrando que, provavelmente, a espécie tem se proliferado e reproduzido no novo ambiente”, explica o pesquisador, que junto a outros quatro autores das universidades Estadual da Paraíba, e Federal da Paraíba e do Rio Grande do Norte, assim o artigo publicado na última semana na revista Biota Neotropica.
Os desequilíbrios ecológicos causados pela introdução de uma espécie exótica podem variar, a depender de quem é o invasor e do ambiente em que ele é introduzido. No caso da Moenkhausia costae, Telton alerta que o principal impacto é a competição com as espécies nativas, em especial a Astyanax bimaculatus, piaba nativa do açude Poções.
“Qualquer espécie introduzida é considerada um grande impacto às nativas. Quando são predadoras, como o tucunaré, por exemplo, é provável que ela vá comer os peixes menores e pode dizimar populações e causar extinções locais. A Moenkhausia costae não é uma predadora, mas ela vai competir por recursos e pode até se alimentar de peixes pequenos e ovos de outras espécies. Isso tudo vai causar impacto nas populações nativas. E lá [no açude] tem uma outra espécie de piaba que é nativa, a Astyanax bimaculatus, e geralmente elas têm o mesmo nicho, se alimentam da mesma coisa, se reproduzem mais ou menos no mesmo período, então essas duas espécies vão competir entre elas para ver quem prolifera mais. E o que a gente tem visto é que a invasora está sobrepujando a nativa, porque ela foi mais abundante na nossa amostragem do que a nativa. Então, a Moenkhausia costae pode se expandir e a nativa diminuir ou até ser extinta localmente. Além disso, uma espécie invasora vinda do São Francisco pode trazer uma doença que não existia no rio Paraíba do Norte e com isso também provocar a mortandade de peixes”, resume o pesquisador.
Até agora a invasora só foi registrada no primeiro açude, o Poções, situado no município paraibano de Monteiro. Na sequência do curso do rio, há outro açude, chamado Camalaú, onde a espécie de piaba ainda não apareceu. Telton ressalta, entretanto, que a pesquisa foi paralisada com a pandemia e não foram feitas novas coletas desde janeiro de 2020. Além disso, com as chuvas, se o açude transbordar é provável que a espécie vá adentrar no rio, “e seguir a cascata: açude Camalaú, açude Boqueirão, e aí se espalhar pelo resto da bacia”, alerta o pesquisador.
Os impactos também podem seguir literalmente em efeito cascata e se a piaba invasora chegar no açude Boqueirão, por exemplo, estará diante da Apareiodon davisi, uma espécie endêmica da Caatinga considerada Em Perigo de extinção de acordo com o Livro Vermelho da Fauna Brasileira Ameaçada de Extinção (Volume VI – Peixes).
“Para Moenkhausia costae acho que agora não tem mais jeito. Quando a espécie é introduzida, é difícil retirá-la, ainda mais depois que ela estabelece uma população, como é o caso da costae. Já está estabelecida, se reproduzindo e certamente ela vai chegar nos outros açudes. O que o pessoal pode tentar fazer é evitar novas introduções, isso é responsabilidade do canal, dos órgãos públicos, que podem fazer barreiras para evitar que novas espécies passem”, destaca Telton Ramos, que lembra que as barreiras em questão estavam previstas no plano do projeto de transposição. “Não é que somos contra a transposição, nós estamos só alertando pros impactos que ela pode causar”, conclui.
O grupo de pesquisadores da Universidade Estadual da Paraíba dará início a uma Pesquisa Ecológica de Longa Duração (PELD) e a expectativa é fazer um monitoramento contínuo e de longo prazo sobre os efeitos da transposição na ictiofauna da bacia do rio Paraíba do Norte, assim como monitorar os peixes invasores. Telton adianta, inclusive, que há indícios de outras duas espécies exóticas no Paraíba do Norte, oriundas do São Francisco, mas não revela mais detalhes, pois a pesquisa ainda está em andamento.
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Sei sim todo o valor, por isso mesmo que tenho plena certeza que o atual governo jamais faria uma obra dessa magnitude. Alias nem menor. Esse governo não teve capacidade de comprar vacina no período certo para o povo brasileiro. Como ele iria fazer obra dessa magnitude e mais para o nordeste, no qual, ele só vem por interesse. O dinheiro do Brasil atual, está sendo muito bem usado para comprar votos dos CENTRÃO como você bem deve saber.
Caro Sr Pesquisador, após esta sua resposta ficou mais do que evidente o lado político da história, falar que o atual governo não seria capaz de realizar uma obra dessa magnitude. Agora lhe pergunto: o Sr.Pesquisador sabe dizer qual foi o valor inicial orçado para a obra e por quanto ela ficou no NÃO término da obra? Sem mais delongas, obrigado.
rapaz… aproveitem este peixe. bem fritinho é um “tira gosto” formidável. Aqui no sul tem bastante.
Se as barreiras previstas pela transposição, estiverem sido feitas como planejado, isso não é possível. Na verdade, é possível que não tenha passado pela barreira exemplares de Moenkhausia costae e sim ovos fecundados dessa espécie.
Opa. Desculpe mas essa sua notícia que a espécie ocorria antes da transposição no rio Paraíba do Norte é falsa. Esse açude é monitorado muito antes da transposição pela equipe do trabalho, e os próprios pescadores afirmaram a chegada da espécie. Os pescadores tem alertado que a espécie tem se proliferado. Não existe reclamação nenhuma no artigo, nem na repôrtagem. Os pesquisadores estão cumprindo seu papel de mostrar os resultados das pesquisas. A reportagem é importantíssima para levar as informações a população. Nós nordestinos não vivemos chorando, isso coisa de novela que enfatiza a pobreza em algumas regiões do Nordeste. No entanto. em todas regiões tem pessoas pobres e ricas, aqui também.
Em momento algum foi falado em política. Ademais, a transposição do São Francisco não foi obra do atual Governo, é uma das grandes obras do Governo do Lula. Esse atual Governo jamais teria capacidade de fazer uma obra nessa magnitude.
Creusa Lima da Silva – Esta grande obra marcou plenamente a História do Brasil pelo feto de vários governante não ter boa vontade de erradicar a seca e a fome na Região Nordeste do país. Luis Inácio Lula da Silva, mostrou a sua “Cara” para o povo e o mundo através das sua obras.
De fato. Lula deu o cano. Como sempre. Quem levou a água foi Bolsonaro
Usar o nome Rio Paraíba apenas tem causado muito problema com os outros dois rios, Paraíba do Sul e Paraíba do Meio.
Na reportagem aparece a denominação de RIO Paraíba do Norte.
O rio que recebeu a transposição do Rio São Francisco tem como denominação apenas de Rio Paraíba, com nascentes na divisa do Estado de Pernambuco, cuja bacia hidrográfica fica localizada dentro do do estado da Paraíba.
A mídia podre negativista ja está em ação contra o governo BOLSONARO. É pura inveja, dor de cotovelo essa e outras matérias que procuram defeitos nas obras do governo Federal. Ora falam de peixes invasores, ora falam dos problemas que o canal da transposição trás aos animais selvage s da regiao. Ora falam que dezenas de motoristas de caminhões pipa ficam sem emprego. Ora falam que o asfalto trás perigo aos animais. Ora falam que a ferrovia trás prejuízos. Etc etc etc
Está obra não foi realizada pelo atual governo, ele seria incapaz de fazer tal obra. Ademais estamos mostrando os fatos, a povo quer saber o que está acontecendo.
A espécie encontrada já era observada em menor escala no açude mencionado, é provável que as espécies nativas também tenham se expandido, a vida em geral tenha se expandido, lamentavelmente a pesquisa se resumiu a um peixe que também existe no Rio São Francisco. Quem sabe essa abundância de água traga a criação de espécies que alimente melhor, que traga uma renda para muitos moradores da região, pois temos que aceitar o lado bom da balança ou sermos os eternos choradores nordestinos.
Este açude é monitorado desde 2012 e nunca foi registrado essa espécie, nem no açude nem na bacia do Rio Paraíba do Norte. Ninguem está choramingando, estamos mostrando um fato que aconteceu e é nossa obrigação mostrar para população o que está acontecendo que ja foi relatado por muitos pescadores. Ademais, as leis brasileiras são claras, introdução de espécies exoticas é considerado crime no Brasil.
Tem algum risco dos peixes da bacia do Paraíba do norte fazerem o sentido inverso e se tornarem invasores no rio São Francisco?
Tem sim, mas é bem menor, muitos km para subir de canais, e só poderia ser uma especie de pequeno porte.