A trilha que Olímpio “abriu” há mais de um século para chegar aos 1.540 metros daquela montanha, pelo morro da Boa Vista, está hoje fechada ao público, dentro do Parque Estadual Pico do Marumbi.
Pedro Hauck, editor do portal Alta Montanha, lembra que todas as áreas protegidas com morrarias naquele estado devem sua existência à pressão de montanhistas. Naquelas unidades, manutenção de trilhas, controle de erosões e brigadas de incêndio ainda dependem dos mesmos montanhistas e de voluntários.
Em Minas Gerais, não fosse a atuação de esportistas como André Ilha, atual presidente do Instituto Estadual de Florestas do Rio de Janeiro, boa parte da Serra do Cipó teria sido devorada por pedreiras. A criação do Parque Nacional da Serra dos Órgãos (RJ), há setenta anos, também foi influenciando por adeptos da altitude. Apesar do trabalho histórico, recentemente dois escaladores foram detidos por tentar escalar dentro do parque estadual da Serra do Intendente (MG), enquanto centenas de trilhas e vias estão bloqueadas no interior das mais de 1.600 unidades de conservação federais, estaduais e municipais brasileiras.
Para Hauck, órgãos ambientais agem muitas vezes com radicalismo, afastando montanhistas dos parques, ao invés de atraírem potenciais aliados da conservação. “Há muito montanhista contra a proposta do parque nacional da Serra da Mantiqueira, pois temem proibições. Tudo isso está enfraquecendo a cultura do montanhismo, fazendo com que ninguém mais assimile a ética e o respeito às montanhas. O tiro está saindo pela culatra”, disse. O Brasil tem cerca de 20 mil montanhistas e escaladores.
Conforme Kika Bradford, coordenadora do programa Acesso às Montanhas na Federação de Montanhismo do Estado do Rio de Janeiro, há restrições à presença de montanhistas dentro e fora de unidades de conservação. No Espírito Santo, lembra, o instituto de florestas fechou todos os parques estaduais ao montanhismo. E não só por desconhecimento sobre a atividade ou por nivelar pelo nível da falta de respeito com a natureza todos os candidatos a visitantes: a legislação brasileira também é um entrave.
“Abertura de vias de escalada sobre pinturas rupestres e outros tipos de degradação devem ser evitadas, obviamente, mas muitos locais estão fechados por puro desconhecimento da atividade. Além disso, a legislação brasileira dá margem para diferentes interpretações, fazendo com que chefes de unidades de conservação e proprietários de terras evitem o acesso acreditando que podem ser responsabilizados por acidentes”, comentou a diretora-executiva da Access PanAm, organização internacional dedicada a manter, abrir e proteger áreas de montanhismo.
Conforme a montanhista, a falta de educação no país para atividades ao ar livre faz com que todos os visitantes sejam nivelados por baixo, enquanto, de maneira geral, montanhistas têm um bom comportamento em ambientes naturais. “Eles acabam pagando o pato. Também há problemas com guias obrigatórios em áreas protegidas, que privam o visitante da liberdade de ir, não garantem maior segurança à atividade e eliminam o prazer da aventura”, reclamou.
Para março de 2010, está previsto para acontecer em Minas Gerais um grande debate entre gestores de unidades de conservação, montanhistas, escaladores e afins. Segundo Bradford, o caminho para a solução dos impasses nacionais passa obrigatoriamente por muita conversa e atuação política. “A solução não é única, depende das características de cada região do Brasil. Queremos acesso, mas com responsabilidade e mínimo impacto ambiental”, ressaltou.
“Eu não acho que exista um problema único ou maior, eles variam de país para país, incluindo hostilidades e restrições governamentais, mineração, abastecimento público de água, legislação e usos da terra. Mas talvez o tema central é que as montanhas não estão legalmente ou efetivamente protegidas, como ocorre em muitas e muitas áreas na América Latina. Mas felizmente isso está mudando, com a liderança de montanhistas locais na exploração e controle da atividade em seus países”, completou por e-mail desde os Estados Unidos, Armando Menocal, organizador e fundador do Access Fund naquele país.
Dia das morrarias
Um ano antes, a entidade havia promovido a formação de comitês em 78 países para debater e implementar ações para melhorar a convivência de populações com esses ambientes e protegê-los do turismo predatório, obras de infraestrutura e até das alterações do clima. Tudo caminha lentamente, como uma subida de montanha.
O tema escolhido para este ano foi “gestão de riscos de catástrofes em zonas montanhosas”, reconhecendo que muitas comunidades ao redor do globo, por questões culturais ou empurradas pela pobreza ou falta de planejamento público, vivem sob a ameaça de erupções vulcânicas, tremores e deslizamentos de terra, além de inundações.
Como O Eco mostrou (veja aqui), 85% dos locais afetados pelas enchentes de 2008 na região do Morro do Baú (SC) haviam sido alterados por “ações humanas”, como plantio de árvores exóticas, desmatamento e lavouras, em margens de rios e encostas montanhosas.
Atalhos:
Access Panamerican
Acesso às Montanhas
Federação Gaúcha de Montanhismo
Federação Paranaense de Montanhismo
Dia Internacional das Montanhas (Espanhol)
Federação de Montanhismo do Estado de São Paulo
Confederação Brasileira de Montanhismo e Escalada
Federação de Montanhismo do Estado de Minas Gerais
Federação de Montanhismo do Estado do Rio de Janeiro
Federação de Montanhismo e Escalada do Estado do Ceará
Saiba mais:
Cinema de alto risco
Para as montanhas brasileiras
A pátria das grandes caminhadas
Uma aventura nos Andes peruanos
Conservação ao alcance das nuvens
Na Espanha, o topo da Península Ibérica
Montanhista no comando – com André Ilha
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