Entusiasmado e performático, o carioca Carlos Minc assumiu hoje o trono do Ministério do Meio Ambiente do governo Lula e anunciou mundos e fundos para a Amazônia e outros rincões da agenda ambiental brasileira. Se colocar em prática tudo que prometeu, incluindo manter a resolução do Conselho Monetário Nacional – CMN que bloqueia créditos a proprietários irregulares de terras na floresta tropical, pode dar novo tom à política ambiental.
Desde que foi aprovada, em fevereiro, a medida do CMN vem sofrendo ataques diretos e frontais de alguns governadores amazônicos, como Blairo Maggi (MT), e até do ministro da Agricultura Reinhold Stephanes. Na visão de ambientalistas, a resolução tem boas chances de estancar a torneira de dinheiro público que financia a derrubada da floresta.
Conforme Minc, oito secretários de Meio Ambiente da Região Norte assinaram uma carta afirmando que as determinações do Conselho Monetário podem ser cumpridas. Ele estará nesta sexta-feira (30) em Belém (PA), junto com governadores da Amazônia, para debater a questão. O ministro já conversou sobre o impasse com os governadores Ana Júlia Carepa (PA), Eduardo Braga (AM), Binho Marques (AC) e Waldez Góez (AP). “Liberar créditos agora, na estiagem, é apoiar com dinheiro público a destruição da floresta. O presidente Lula me garantiu que isso não acontecerá”, disse.
Apesar do imbróglio, o novo ministro leva uma carta na manga para os debates em solo paraense. Ele anunciará R$ 120 milhões para produção, distribuição e venda de produtos do agroextrativismo. Mesmo assim, preferiu ser mais cauteloso com suas frases sobre Maggi, maior produtor brasileiro de soja. “Com Blairo Maggi manterei uma relação de diferença respeitosa, sem necessariamente concordar com posições diferentes”, afirmou.
Para apoiar quem quer seguir os trilhos da lei na Amazônia, Minc anunciou um mutirão conjunto com o Incra – Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária para validar propriedades e liberar acesso a créditos. “A solução não é derrubar o decreto (do Conselho Monetário), é facilitar a legalização daqueles que querem atuar dentro da lei”, ressaltou.
Diplomacia
Antes da viagem à Amazônia, Minc fará uma passagem em Bonn (Alemanha), na 9ª Conferência das Nações Unidas sobre Biodiversidade, na quinta-feira (29). A idéia é acalmar os ânimos internacionais com a saída de Marina Silva e reforçar que a floresta é brasileira. Por lá, Minc anunciará o fundo privado para receber depósitos nacionais e internacionais em benefício da Amazônia. Um primeiro aporte está acertado – a Noruega promete depositar US$ 100 milhões, mas só em setembro.
“Todo mundo diz que a Amazônia é importante, por isso direi em Bonn que somos soberanos, mas contribuições são bem vindas para exercermos nossa soberania ambiental e garantir uma sobrevivência digna para os 25 milhões de pessoas que vivem na região”, destacou.
Para o Dia Mundial do Meio Ambiente (5 de junho), além do decreto criando o fundo amazônico, o governo quer anunciar outra medida legislativa, dando ao Ibama poderes semelhantes aos da Receita Federal. Assim, bens apreendidos com infratores ambientais podem ser leiloados de imediato. Minc também afirmou que o País terá um plano nacional de combate a incêndios e queimadas e novos padrões para poluição atmosférica. “Encomendei ao Conama uma resolução com índices mais restritivos para poluição do ar. Nossos padrões são frouxos”, disse.
Minc citou como exemplo de sua nova maneira de agir um decreto publicado hoje no Rio de Janeiro, obrigando quem produz energia com óleo, carvão ou gás a gerar um percentual mínimo com fontes renováveis, como solar, eólica ou bagaço de cana. “Já é lei no estado e em breve será no País. Pedirei apoio ao ministro Lobão (das Minas e Energia)”, disse.
A expectativa de movimentos ambientalistas é de que a data tenha força para desengavetar várias unidades de conservação trancafiadas na Casa Civil. Entre elas, a Reserva Extrativista do Médio Xingu. Para tanto, as relações entre Minc e Dilma Rousseff parecem começar em patamares mais brandos. “Tive longas conversas com Dilma Rousseff. Nossa música será dois pra lá, dois pra cá: duas licenças, dois parques ambientais. Desenvolvimento e preservação vão andar juntos”.
A saída de Marina Silva, além do baque momentâneo na cúpula governista, libertou novos protestos contra demoras na emissão de licenças e outros “entraves ambientais” ao progresso do País. Minc foi taxativo ao afirmar que não será um “carimbador maluco” e que será possível dar licenças mais ágeis e com mais rigor. Parte dessa iniciativa depende da regulamentação pelo Congresso do Artigo 23 da Constituição. Isso repassará licenciamentos mais simples a estados e municípios. “Não serei um carimbador maluco, um carimbador da improbidade administrativa”.
“A lei será cumprida, decretos simplificarão procedimentos e encurtarão prazos para licenças. Muitas coisas podem ser simplificadas, sem afrouxar um milímetro a defesa da vida e dos ecossistemas”, salientou Minc.
Outra idéia do ministro carioca é criar imensos parques fluviais no País com dinheiro da compensação ambiental de obras hidrelétricas. Segundo ele, isso ajudaria na recomposição de margens de rios e outros mananciais. Aliás, Minc defendeu hidrelétrica, etanol e biodiesel como meios para se reduzir as emissões e manter limpa a matriz energética nacional. “Mas isso precisa de zoneamento, evitando a entrada em matas nativas e áreas de produção de alimentos. O Brasil é muito grande e tem muita terra ociosa e degradada”, disse.
Bate e assopra
Sobre o adiamento do anúncio dos novos números do desmate na Amazônia, o ministro poupou muitos comentários, mas defendeu os dados do Inpe – Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais. “Eu não brigo com dados e não quebro termômetro”, disse. Segundo ele, seja qual for o número, positivo ou negativo, é preciso preservar o INPE, instituição internacionalmente reconhecida. “Quando o dado é ruim, temos que tomar mais medidas para atuar nas causas, com mais fiscalização, mais fiscalização para atividades sustentáveis, não contestar estatísticas”, comentou.
A festa era de Carlos Minc, mas Lula tomou quase todo seu discurso elogiando Marina Silva, aquela mesma que ele maltratou politicamente por mais de cinco anos. Lula não poupou afagos à sua ex-ministra, garantindo que o tempo reconhecerá o valor de suas ações e garantindo que está tudo mais do que bem entre eles. “Nossa amizade é inabalável. Olhar para Marina é olhar para a cara do Meio Ambiente nesse País”, comentou o presidente.
Lula não perdeu a oportunidade de criticar a imprensa presente à posse de Carlos Minc. Para ele, a mídia foi injusta em não noticiar praticamente nada do requentado PAS – Plano Amazônia Sustentável, lançado no início de maio. O presidente esquece que absolutamente nada foi informado na ocasião. Sobraram discursos, faltou informação.
Jurando fidelidade às ações que Marina Silva vinha tocando no MMA, o novo ministro lembrou de retomar pontos que foram quase abandonadas nos cinco anos de gestão da Senadora. “Vamos incluir questões que o MMA perdeu, como saneamento, política científica e tecnológica. Vamos praticar mais o que Marina chamava de transversalidade”, garantiu.
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