Discordâncias entre o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e a empresa responsável pelo programa de reintrodução da ararinha-azul no sertão baiano podem colocar em risco a população da espécie no Brasil e outros psitacídeos silvestres na região, dizem especialistas.
No início desta semana, após constatar surto de circovirose em 14 aves, incluindo um filhote nascido em vida livre, o órgão ambiental recomendou o recolhimento das aves reintroduzidas na natureza “para que sejam submetidas a bateria de testes, resguardando assim a sanidade da população”.
A Blue Sky, empresa responsável pelo criadouro do programa em Curaçá, no entanto, disse ao UOL que não fará a captura porque não tem autorização e espaço para as condições exigidas pelo órgão. Em carta enviada ao ICMBio, a empresa também alega risco de morte ou ferimentos graves na captura e impactos no programa de reintrodução como um todo.
Especialistas defendem que a captura das ararinhas é viável e simples, dado que elas vivem e circulam perto do viveiro de soltura. Além disso, eles alertam para o risco de contaminação de aves silvestres pelo circovírus, uma doença sem tratamento que causa a perda de penas, anormalidades no bico, resultando em dificuldade de alimentação por parte do animal, e imunossupressão.
Mesmo animais assintomáticos transmitem o vírus, que pode permanecer em latência por meses ou anos, o que causa preocupação do ponto de vista da conservação.
“Temos um problema sanitário e de biossegurança real, comprovado e em andamento, que está acima de tudo isso [questionamentos sobre impactos no programa de reintrodução] e que tem implicações claras e diretas na conservação das demais aves da Caatinga. Isso só reforça que é imperativo capturar todas as aves, suspender o projeto, e iniciar um programa de monitoramento das aves na natureza”, disse Luís Fábio Silveira, curador da seção de aves do Museu de Zoologia da Universidade de São Paulo (USP).
Vírus letal
O alarme para a circovirose foi dado em abril, quando um filhote selvagem, nascido na natureza em dezembro de 2024, foi detectado com a doença. Em junho, outras 13 ararinhas-azuis de cativeiro, que vivem num mesmo recinto aviário em Curaçá, onde o programa é desenvolvido, testaram positivo para a doença.
Outros 72 indivíduos que vivem em recintos diferentes no criadouro baiano testaram negativo, e as 11 aves em vida livre – 9 sobreviventes das 20 que foram reintroduzidas em 2022, e dois filhotes nascidos em vida selvagem – não foram testadas.
A nova soltura prevista para ter acontecido em junho foi suspensa. O impasse entre o órgão ambiental e o gestor do projeto sobre recolhimento das aves para monitoramento não havia sido resolvido até o fechamento desta matéria.
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