Em 15 anos, a área destinada ao plantio de soja em Mato Grosso quase dobrou, passando de 5,8 milhões para 10,5 milhões de hectares entre 2008 e 2023. Desse total, 97,5% estão em áreas desmatadas antes de agosto de 2008. Segundo o Instituto Centro de Vida, o aumento prova que a Moratória da Soja, acordo firmado em 2006 para impedir a compra de grãos cultivados em áreas desmatadas na Amazônia após julho de 2008, não limitou a expansão da produção, nem prejudicou sua comercialização. Ainda assim, o pacto vem sofrendo ofensivas políticas e jurídicas em estados da Amazônia Legal, além de pressões para sua suspensão em nível federal.
Na semana passada, o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) suspendeu o acordo por suposta prática de cartel. O Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) cassou a decisão na última terça-feira (19), a pedido da Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove).
Apesar de parte do agronegócio lutar pelo fim da Moratória há anos – durante o governo Bolsonaro, o fim do instrumento chegou a ser discutido pela então ministra da Agricultura, a senado Tereza Cristina (PP-MS), estudos como o do Instituto Centro de Vida (ICV) apontam que a Moratória não impediu o aumento de produção da soja, apenas evitou que isso se desse em cima de áreas desmatadas após 2008.
De acordo com nota técnica divulgada pelo ICV, entre 2008 e 2024, a Amazônia mato-grossense perdeu 2,2 milhões de hectares de vegetação nativa, sendo que apenas 16,4% tinham autorização de desmate. Das áreas já abertas, 1,6 milhão de hectares apresentam aptidão agrícola e poderiam ser rapidamente convertidas em lavouras de soja sem a proteção da Moratória. Para a coordenadora de Conservação e Clima do ICV, Ana Paula Valdiones, acabar com o acordo seria “um estímulo ao desmatamento direto e indireto, em um momento em que a crise climática já compromete a própria produção agrícola”.
“Os ataques à Moratória da Soja tornam-se ainda mais preocupantes diante do atual cenário de crise climática, com a intensificação de eventos climáticos extremos, que já afetam inclusive a produção agrícola. Sem o acordo, a única proteção à vegetação nos imóveis rurais passa a ser o Código Florestal, ainda com baixa implementação”, explicou.
O risco não é apenas ambiental, mas também econômico. Com a União Europeia prestes a adotar regras que exigem produtos livres de desmatamento a partir de 2025, especialistas alertam que enfraquecer a Moratória pode comprometer a credibilidade do agronegócio brasileiro e abrir espaço para barreiras comerciais.
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